O pós-União Europeia

Se se der rédea livre ao "Dr. Strangelove" dos nossos tempos, não sobrará pedra sobre pedra

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Há anos que o augúrio do fim da União Europeia pulsava por baixo das loucuras dos medíocres dirigentes manga de alpaca como Durão Barroso, Jean Claude Juncker, Jean Claude Trichet, Herman van Rompuy, assim como das estiradas violentas dos tecnocratas como Wolfgang Schauble ou Jeroen Dijsselbloem. Hoje já vemos os contornos do pós-UE.

Enquanto ainda se discute sobre os escombros do Brexit, sobre se terá sido por os ingleses pobres serem racistas, por serem altivos, independentistas, por não quererem mais austeridades, por serem idiotas ou simplesmente por não tolerarem a personificação do poder longínquo da Europa, o pós-União Europeia avança. O ministro das Finanças alemão Schauble, o "Dr. Strangelove" de Stanley Kubrick tornado real, só quer fazer rebentar bombas. O primeiro alvo é Portugal. Não se engana Maria Luís Albuquerque quando diz que fora ela a ministra das Finanças em Portugal e não haveria ameaças de sanções: pois se assim fosse não haveria a reversão das políticas de austeridade que estão, embora de forma comedida, a ser feitas por este governo.

Num momento em que a saída do Reino Unido da União Europeia está certa, embora temporalmente indeterminada, o ministro alemão das Finanças acelera como um panzer sobre os escombros da Europa a colapsar. Schauble decidiu há muito que a Europa a duas velocidades era o seu objectivo, com o centro na Alemanha e as periferias sem euro a safarem-se por entre políticas de austeridade e êxodo em massa. Aliás, Schaublejá tinha decidido pelo Grexit há um ano atrás e só a submissão total de Tsipras evitou que a Grécia fosse expulsa da União Europeia.

Agora, perante o facto de o Deutsche Bank se ter tornado o banco mais perigoso do mundo, ameaçando colapsar e colapsar a economia alemã consigo, e quando a Comissão Europeia autorizou a Itália a financiar a sua banca privada com mais 40 mil milhões de euros (um novo resgate à espanhola), Schauble deixa cair uma bomba sobre Portugal precisar de um novo resgate. Mentira, claro está, mas com impacto na mesma. Aparece no momento em que a Comissão Europeia ameaça Portugal e Espanha por “défice excessivo”, quando o mesmo foi determinado pelas políticas da troika. Sim, a troika que tinha a Comissão Europeia como um dos seus elementos. Sob a batuta de Schauble, Jean Claude Juncker não sancionará a França, “porque é a França”. E agora Portugal receberá três semanas para encontrar soluções “eficazes” para corrigir as suas metas orçamentais. Ora, estando nós a falar de contas fechadas de 2015 e do governo anterior, pareceria lógico assumirmos que a Comissão Europeia estava a pedir a Portugal que falsificasse as contas anteriores, mas é ainda mais retorcido do que isso: quer que Portugal aprove medidas de austeridade em três semanas, contra o acordo de governo, que não terão qualquer impacto nas contas do ano passado, para não punir Portugal com sanções. Isto é, propõe que Portugal se sancione a si mesmo!

Do outro lado, coordenado ou não com Schauble, está Martin Schultz, também alemão (mas de outro partido – SPD, em coligação com Merkel no governo). Enquanto Schauble propõe abertamente que haja alguns governos que imponham a sua vontade aos outros, Schultz propõe um super-Governo europeu para os novos Estados Unidos da Europa: extingue-se a Comissão Europeia, criam-se duas câmaras, uma igual ao actual Parlamento Europeu, a outra composta pelos governos nacionais, e um governo europeu para mandar na gente todos. Só falta agora apresentarem em pleno Agosto a criação de um exército europeu e serem aprovados os tratados de livre comércio – CETA e TTIP –sem passar pelos governos nacionais, como propõe Juncker. Nada como empurrar uma mesa em chamas com a barriga.

Os actuais e abundantes devaneios já nos apresentam o pós-União Europeia: da "solidariedade entre os povos" sobrará o ordoliberalismo e a visão moralista e punitiva da economia pós-crash financeiro liderada pela Alemanha. Para os alemães o fim da UE já são favas contadas. Resta saber quanto do resto do Europa quererão destruir neste processo. Se se der rédea livre ao "Dr. Strangelove" dos nossos tempos, não sobrará pedra sobre pedra.

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