A vitória da ignorância

Hoje, quando o Sol nascer às 4h44 da manhã, nascerá carregado de chaves, cadeados, correntes e grilhões para todas as portas e portões, para todas as pessoas e todos os corações de quem um dia acreditou viver numa Europa de entreajuda, tolerância e cooperação

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Reinhard Krause/Reuters

Hoje, quando o Sol nascer às 4h44 da manhã, nascerá com o único propósito de fechar as fronteiras, os aeroportos, as estradas e os portos do Reino Unido para quem quiser entrar ou sair.

Hoje, quando o Sol nascer às 4h44 da manhã, nascerá carregado de chaves, cadeados, correntes e grilhões para todas as portas e portões, para todas as pessoas e todos os corações de quem um dia acreditou viver numa Europa de entreajuda, tolerância e cooperação.

Hoje, quando o Sol nascer às 4h44 da manhã, ainda vermelho de sangue e de choro saído do ventre da noite, nascerá não para todos, mas apenas para quem se diz inglês e em detrimento de todos quantos almejam uma vida não possível nos seus países de origem, tantas vezes por culpa dos ingleses e de tudo quanto os mesmos fazem, por força das armas, por esse mundo fora.

Hoje, quando o Sol nascer às 4h44 da manhã, nascerá para expulsar no fogo e nas chamas todas as mães e todos os pais, todas as irmãs e irmãos cujo pecado original foi o de não terem nascido num Reino que de Unido terá hoje em diante muito pouco.

Hoje, quando o Sol nascer às 4h44 da manhã, nascerá para preterir de todas as entrevistas de emprego quem não tenha o inglês como língua nativa, e quanto aos sotaques não tenho bem a certeza.

Hoje, quando o Sol nascer às 4h44 da manhã, quem é português e trabalha no Reino Unido sabe bem como a empresa para a qual trabalha não só estará em risco de fechar como já deixou de receber encomendas há duas semanas.

Hoje, quando o Sol nascer às 4h44 da manhã, não nascerá mas ficará para sempre guardado a sete chaves para lá do horizonte das mentes tão pequenas como xenófobas, onde Nigel Farage é o maior exemplo.

Hoje o Sol não vai nascer às 4h44 da manhã, dando o seu lugar a este céu que às 4h44 da manhã se prepara para nos cair em cima da cabeça num pesadelo gaulês do qual não nos será permitido acordar.

Hoje, quando o Sol nascer, nascerá para nos dizer, cara a cara, como Jo Cox morreu em vão.

Hoje, quando o Sol nascer às 4h44 da manhã, nascerá para pedir a Deus que nos acuda.

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