Abanão democrático

O abanão que o resultado do referendo provoca pode afundar-nos em nacionalismos xenófobos, mas também pode contribuir para que, como uma fénix renascida, a Europa se reencontre.

Há aquela história do homem que quis fazer um fato no melhor alfaiate da cidade. Depois das provas, quando, finalmente, o recebeu, vestiu-o e verificou que uma das mangas estava curta, a outra comprida demais, apertado na barriga, largo na cintura, demasiado curto na perna esquerda e excessivamente longo na direita. Confrontado o alfaiate, este explicou-lhe que o fato estava impecável, mas que ele tinha que aprender a vesti-lo, bastando esticar-se, dobrar-se, estender-se, encolher-se ou inchar-se, consoante a situação. O homem assim procedeu. À saída, ouviu os comentários de dois transeuntes. Um dizia “coitado, que homem tão aleijado”, o outro retorquia “mas tem um alfaiate brilhante”.

À União Europeia aconteceu o mesmo. O fato com que a querem vestir é uma peça desigual, disforme, feia e desarticulada. No referendo britânico há muitas motivações, umas lamentáveis ou até sinistras, outras de quem não desistiu de um projecto europeu mais democrático, solidário e justo. O abanão que provoca pode afundar-nos em nacionalismos xenófobos, mas também pode contribuir para que, como uma fénix renascida, a Europa se reencontre. Advogado

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