Por um punhado de referências bibliográficas

No final do dia, o mestrado parece (é!) o tempo e espaço onde o licenciado continua a pedir licença "ad aeternum". No lugar de massa crítica, andamos a produzir redactores de teses e citadores que citam o citado e citável até não haver mais nada para citar

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Aleksi Tappura/Unsplash

O erro é um dos melhores amigos da aprendizagem e, fazendo vista grossa à sorte douta dos principiantes, é óbvio que a prática faz a perfeição e o hábito faz o monge. Nas universidades, a liberdade para o erro devia ser mandamento tácito, não só para uma aprendizagem profícua, mas também para a criação de um pensamento mais crítico e evolutivo. Mas, embora muitos docentes apregoem que “a escola é o local para errar antes do mundo de trabalho”, a verdade é que essa margem não existe e isto não acontece.

Este problema ganha traços de uma incongruência maior nos mestrados, já que, ao invés de uma aproximação ao mundo profissional com uma vertente mais prática, os mestrandos são submetidos quase a tempo inteiro a um tutorial de “como fazer uma tese”. Não interessam as ideias que têm ou os conhecimentos que apreendem, desde que se preparem para a fatídica dissertação de mestrado. Assim, o que para muitos seria o aprofundar de conhecimentos e a aquisição de mais-valias práticas, torna-se numa cega obtenção de um grau (o de mestre) e na elaboração de um documento escrito que não prova nada sobre capacidade ou falta dela.

Em pleno segundo ciclo de estudos, o grosso dos docentes parece manter intacta a sede de moldar e uniformizar os alunos. Com efeito, é sem rodeios que dão conta das suas intenções: “formatar a vossa forma de pensar” e “castrar a vossa criatividade”. Outros incluem no programa de semestre revisões bibliográficas a que chamam “textos opinativos”, “análises” ou “ensaios”, que devem ser completamente sustentados por outros autores e que não são mais que mantas de retalhos com informação que alguém muito preguiçoso pretende ver recolhida num único documento.

No final do dia, o mestrado parece (é!) o tempo e espaço onde o licenciado continua a pedir licença "ad aeternum". No lugar de massa crítica, andamos a produzir redactores de teses e citadores que citam o citado e citável até não haver mais nada para citar. Valida-se alguém que já validou outros e, de citação em citação, vamos acrescentando bocados de nada a coisíssima nenhuma. Obtido o grau, o mestre sabe o mesmo, mas é um exímio aglutinador de menções e intentos.

Claro que temos muito a aprender com a história e o conhecimento já alcançado, mas deve existir igualmente espaço para o rasgo, o génio e a opinião própria. Não existe e os alunos são sufocados numa formatação de mau gosto, que coabita com frequências e exames que testam a memória, mas não fazem destrinça entre alunos. Por conseguinte, este método é uma farsa e o sistema de notas acaba por ser a solução final de formatação. A parte perversa é que o método está feito para que não se questione o sistema. A nota é néctar e ambrósia do estudante, quando deveriam ser a experiência e a aprendizagem.

Acaba por existir um benefício dos limitados. Os esforçados são os reis das pautas, mas os heróis do conhecimento pautavam-se por outros atributos e não se limitavam a ser uma máquina matraqueadora de coisas ditas. Hoje, o sector económico controla todos os outros sectores da nossa vida e não faltam provas por essa economia fora de que o mundo é dos criativos. Contudo, nas escolas em geral e nos mestrados em particular, incentiva-se o citador e pune-se o criador. Entrámos no domínio do “não penso, logo cito”.

“Don’t let the Man get you down” – School of Rock.

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