A engenheira matrimonial

Tudo certinho, mais do que tudo certo, a duas semanas já perguntaremos “Maggie tem o quê?, que filme era esse?”.

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Daqui a semanas perguntaremos: “Maggie tem o quê?, que filme era esse?”

A entrada, com a banda musical “jazzy” e a passagem muito rápida às personagens e à paisagem novaiorquina, faz lembrar Woody Allen e essa lembrança nunca desaparece completamente. Pelo ambiente - a Greenwich Village – e pelos círculos intelectuais das personagens – antropólogos, romancistas, universitários – a vénia a Woody Allen estava de certeza na cabeça de Rebecca Miller, que até mima ao autor de Manhattan um dos seus procedimentos formais ultimamente mais utilizados: aquela montagem despachada, com transições muito curtas entre cenas, praticamente dispensando planos de intervalo ou de ligação.

Em rigor, também é esse o problema de Maggie tem um Plano: a sensação de que o que tem de melhor já foi visto e revisto, feito e refeito, de forma bem mais satisfatória. Tem-se-lhe chamado uma revisão da “screwball comedy”, e se efectivamente encontramos no seu centro uma questão crucial na essência do género (o “re-casamento”) o que está à volta é o oposto: nos anos 30, fosse porque a sociedade era assim ou mais ainda porque ao cinema se impunha determinada representação da sociedade, o que ressaltava era o desejo de “desordem” inoculado na “ordem” (matrimonial e não só); agora é ao contrário, e perante a “desordem” do mundo é pela entrada num pouco de “ordem” que as personagens anseiam. Sobretudo Maggie, a espevitada Greta Gerwig, incapaz de conceber a sua vida sentimental sem “planos” de longo prazo, que passam por uma espécie de “engenharia matrimonial”: como fazer o namorado e pai da sua filha (Ethan Hawke), por quem se “desapaixonou”, voltar para a ex-mulher (Julianne Moore), de modo a que tudo fique, outra vez, certo e “ordenado”. É o centro narrativo desta comédia ligeira e amável, que tira a sua energia fundamental dos actores mesmo quando lhes destina papeis caricaturais (a severa e “nórdica” intelectual universitária de Moore, o “hipster” fabricante de pickles “do bairro” de Travis Fimmel), mas que cedo se compraz no seu próprio ramerrame, indeciso entre mais cinismo ou mais sentimentalismo, dilema finalmente resolvido em abono da segunda hipótese, com a ajuda do Dancing in the Dark de Bruce Springsteen. Tudo certinho, mais do que tudo certo, vê-se sem maçada, daqui a duas semanas já perguntaremos “Maggie tem o quê?, que filme era esse?”.

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