A Orquestra Jazz de Matosinhos coseu um fato para Sérgio Godinho

Ajustado, bem cosido, mas talvez com um jeito amarrotado bem ao estilo do jazz. Promete ser “feito à medida” o concerto desta noite na Casa da Música.

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FERNANDO VELUDO/NFACTOS
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Sérgio Godinho não esconde que sempre teve um "brilhozinho nos olhos" pelo jazz e a admiração pela Orquestra Jazz de Matosinhos vem lá de longe, nota-se. É o primeiro a admitir que esta é, para si, a melhor formação do género do país e por isso não houve espaço para hesitações quando o convite chegou: “Só tive assim meio segundo para me fazer de caro. Hmmmm... sim”. O convite trouxe-o à Casa, a da Música, e a casa, a cidade do Porto. Parece como peixe na água, ao lado de uma orquestra e em cima de um palco que lhe dizem tanto. Ele que esteve "morto no deserto e o Porto aqui tão perto".

O reportório do concerto que, juntos, Sérgio Godinho e a Orquestra Jazz Matosinhos dão este domingo às 21h na Sala Suggia da Casa da Música percorre muito do que fez dele um dos músicos mais estimados da crítica e do público português: há O primeiro dia, Brilhozinho nos olhos, Etelvina e O acesso bloqueado. Não há nada de revolucionário, nem tem de haver. “Tem é de dar prazer a mim, a eles e ao público”, é a vontade do músico. Apesar das novas roupagens dadas pelos directores musicais da orquestra, Pedro Guedes e Carlos Azevedo, não se trata de uma operação de desconstrução. As melodias de Sérgio Godinho continuam lá e “o âmago da canção foi respeitado”, reconhece o músico. Pedro Guedes concorda: para ele, Sérgio Godinho é aliás um “compositor genial”, não há grandes vírgulas a acrescentar ao que escreveu.

E daí vem uma admiração mútua. Sérgio Godinho foi uma “escolha óbvia” para uma formação que se distingue pelas colaborações com grandes nomes da música que se faz cá dentro e lá fora: Maria João, Mayra Andrade, Kurt Rosenwinkel, Maria Rita e Manuela Azevedo já passaram pelo palco da Casa da Música a convite da Orquestra Jazz de Matosinhos. Para além da música, aqui também funciona a memória. “Estas músicas são as que me lembro de ouvir quando era mais novo”, conta Pedro Guedes.

O processo de composição de novos arranjos, a cargo de Pedro Guedes, Carlos Azevedo e Telmo Marques, fez-se como numa alfaiataria. “Cada canção é um fato diferente. Tentamos fazer um bom fato, com um bom corte e que caia bem”, diz o primeiro. Durante os ensaios, as canções vão sendo “cosidas” à medida de Sérgio Godinho. Aqui entram as sugestões de todos, incluindo do cantor que tanto gosta “de ver as canções tratadas por esta orquestra”. Dificuldades? Nenhumas. Na sala de ensaios é como estar entre amigos.

De resto, os ensaios não duraram meses e não há o mínimo nervosismo: a “culpa” é dos anos de experiência destes músicos e do facto de "estes gajos saberem tudo”. “Eles nem precisam de ensaios, chegam aqui e sabem tocar”, comenta Sérgio Godinho. A verdade é que a orquestra ensaiou antes de o cantor – que neste concerto se fica pela voz – lá chegar, na antevéspera do espectáculo. Com 17 músicos ao seu lado, estará “solto no palco”, como gosta de estar: “Sou assim eu e o Mick Jagger.”

O encontro desta noite é apenas mais um desafio. Entre tantas formações e parcerias, para Sérgio Godinho já nada é inesperado. O músico escolheu o alinhamento, combinando certas canções que eram “óbvias” com outras que “casavam bem” com a orquestra. “As minhas músicas são muito plásticas e adaptam-se a diferentes cores sonoras.” O que o músico quer deste concerto é precisamente uma cor particular, aquela que vem do jazz, cruzada com a das memórias que as músicas que vão chegar ao palco da sala Suggia carregam.

Disco e livro a caminho

Sérgio Godinho é mesmo como se diz na música: um homem de sete instrumentos, que não se esgota em palco. O músico terminou agora o seu segundo romance e, mesmo antes de este chegar às livrarias, já começou a escrever o próximo. Sucedendo a Vidadupla, uma série de nove contos editada em 2014, a nova publicação deve ser lançada em Fevereiro.

A caminho pode vir também um novo álbum. “Vou começar a compor para um novo disco. Preciso estar em actividade e preciso de estar a criar.” Estar parado diz-lhe pouco, até lhe causa uma certa “urticária”, admite entre risos. De fora não fica a hipótese de repetir o concerto desta noite.

O músico, que reconhece ter gosto por esta coisa das orquestras, parte agora para uma parceria semelhante, embora o reportório seja diferente, com a Orquestra Filarmónica de Águeda. Antes disso ainda volta à estrada com Jorge Palma, levando o projecto Juntos a Cinfães do Douro, a 24 de Junho, e a Cascais, um dia depois. Dá-lhe gozo ser assim: nunca parar e “poder ir mudando de roupa” (e de música).

Texto editado por Inês Nadais

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