“A Estagnação Secular"

Eurostat apresentou, no seu relatório trimestral, indicadores económicos que demonstram, finalmente, um insignificante crescimento económico na União. Assim, a UE terá crescido 0,6% (equivalente anual de 2,2%) no último trimestre de 2015. Ligeiramente acima do pico de 2008, antes da crise. Acresce que a zona euro gerou um PIB de 2,48 triliões de euros nos primeiros quatro meses deste ano. Desta forma, caso este ritmo de crescimento se mantenha, ultrapassará os dez triliões de euros gerados em 2008, consolidando a saída da crise após oito anos de recessão. No entanto, coloca-se a questão: Será que a crise acabou?

Embora em termos absolutos os indicadores sejam positivos, é, todavia, necessário referir que aquele crescimento é quase irrelevante numa economia que apresenta um PIB de 15,85 triliões de euros. Por outro lado, não se verificou qualquer redução assinalável nos 25 milhões de pessoas à procura de emprego. "Foi uma década perdida e representa um testemunho marcante do falhanço da zona euro", afirma conclusivamente Joseph Stiglitz, laureado Nobel da Economia.

A este propósito, Carmen Reinhart e Kenneth Rogoff, professores na Universidade de Harvard, num brilhante estudo efectuaram um follow-up a cerca de cem países. Neste estudo, documentaram o comportamento do PIB destes países e a sua intercorrelação com as cem maiores crises financeiras mundiais desde 1860. Os resultados são conclusivos, pois demonstram que o quase colapso nos países desenvolvidos não só demora cerca de sete anos para recuperar os mesmos níveis do PIB de antes da crise como também a queda do rendimento per capita foi de cerca de 9,6% no período que medeia entre o pico, antes da crise, e o período subsequente, durante a crise, altura em que atingiu o nível mais baixo. Para os países subdesenvolvidos, a recuperação é bastante mais grave e mais morosa. Como não bastasse, o último World Economic Outlook do FMI aponta para um cenário ainda mais pessimista. Assim, nos países desenvolvidos, o crescimento do PIB per capita demorará em média cerca de dez anos a recuperar, o que atirará para cerca de 2030 a recuperação do emprego para valores próximos dos de antes da crise de 2008, dado que para haver criação de emprego a economia terá de crescer acima dos 3% ao ano. Algo absolutamente extraordinário, senão mesmo impossível no actual panorama económico internacional.

Assim, apesar do optimismo de Bruxelas, nuvens muito negras no horizonte ameaçam com uma forte tormenta a muito curto prazo, em específico o "Brexit"; a queda de 0,2% dos preços ao consumidor apenas em Abril, indicando, assim, a estagnação económica e deflação na UE que têm resistido às políticas agressivas do BCE; o influxo de mais dois a seis milhões de refugiados, só neste Verão, de acordo com relatório da Comissão Europeia, o que levará ao agravamento do défice da zona euro em cerca de cem mil milhões de euros; forte probabilidade de novos ataques terroristas; a probabilidade do "Grexit", dada a impossibilidade de a Grécia realizar a cascata de pagamentos devidos a partir de Junho; a relutância dos maiores bancos europeus em emprestar dinheiro à economia, esmagando qualquer possibilidade de crescimento e o abrandamento da China, a qual tem sido o principal destino das exportações europeias e constitui o principal motor da recuperação da UE.

Tal como num filme, todavia sem happy end garantido, a possibilidade do "Brexit" e do "Grexit" são muito reais e manterão a UE e o mundo em suspense. Sendo certo que o Reino Unido e a Grécia necessitam mais da Europa do que a UE do Reino Unido ou da Grécia, também é certo que serão muito más notícias para a União no que se refere quer  à sua recuperação económica, quer à coesão política, quer no que diz respeito à sua afirmação internacional. A saída do Reino Unido da UE encorajará os movimentos separatistas antieuropeus e revigorará forças centrípetas que alastrarão aos 27 Estados- membros e conduzirão não só à saída de outros países da União, designadamente a França ("Frexit"), a Grécia ("Grexit"), a Hungria e a Holanda, como também à sua fragmentação com a independência da Escócia e da Catalunha. Porém, quem parece estar muito satisfeito com tudo isto é Vladimir Putin, que activamente tem apoiado os partidos de extrema-direita antieuropeus, como se pode observar, de acordo com o New York Times, pelo financiamento de dez milhões de dólares à Frente Nacional de Marine Le Pen, entre outros. "Quanto mais dividida está a UE, mais fácil é para Putin promover e impor a sua visão alternativa para a Euro-Ásia dominada por Moscovo", conclui Barry Eichengreen, professor de Economia na Universidade de Berkeley.

Sem soluções à vista, a Grécia e os seus credores terão de acordar a reestruturação da dívida e implementar um programa sério e exequível de reformas para revigorar a economia, em linha com as capacidades gregas, e não arrastar-se em negociações infrutíferas e crises recorrentes à espera de que algum milagre aconteça. Por outro lado, os cidadãos britânicos terão de compreender que o verdadeiro problema no Reino Unido não foi a UE, mas o falhanço colossal das políticas de David Cameron, dado que este nem sequer providenciou políticas de apoio aos empobrecidos e revoltados cidadãos britânicos que se sentiram excluídos e negligenciados. Embora, para os eleitores zangados, um "sim" ao "Brexit" represente um "não" ao mainstream político britânico, eles terão, todavia, de compreender que não é disto que se trata.

"A Europa está a entrar num período de estagnação secular", afirma Larry Summers, presidente da Universidade de Harvard; por conseguinte, nem nas perspectivas mais optimistas a evidência empírica demonstra que o emprego aumente nos próximos dez anos. E, acrescenta, que só o retorno em massa ao investimento público, que os tratados não permitem e o dogmatismo fossilizado alemão impede, poderá aliviar o sofrimento de milhões de desempregados. (Voltarei a este tema.) 

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