Feitas as contas, ganharam as canções dos Queen

Mika cantou o fado e de Fergie não rezará a história do Rock In Rio 2016. Da passagem dos Queen, mais que um concerto memorável, fica a recordação das tantas canções que a banda deixou como legado.

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Concerto dos Queen Enric Vives-Rubio
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Concerto de Mika Enric Vives-Rubio
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Concerto de Mika Enric Vives-Rubio
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Concerto de Mika Enric Vives-Rubio
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Público durante o concerto de Mika Enric Vives-Rubio
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Público durante o concerto de Mika Enric Vives-Rubio
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Concerto de Mika Enric Vives-Rubio
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Concerto de Mika Enric Vives-Rubio

O rumor que se erguia da multidão fazia lembrar os concertos de estádio dos anos 1980 e 1990. Nunca se sabia exactamente a que horas seria o início e, portanto, qualquer movimentação que indiciasse que algo estava prestes a acontecer provocava uma reacção em cadeia de palmas e gritos de entusiasmo – e o roadie que subira a palco para uma última afinação sorria, acenava para a multidão e recebia pela simpatia mais palmas e gritos de entusiasmo.

No segundo dia de Rock In Rio Lisboa, sexta-feira, o concerto mais aguardado, o grande responsável pela entrada no Parque da Bela Vista, segundo a organização, de 74 mil espectadores, mais sete mil, portanto, que os que viram na quinta-feira Bruce Springsteen, estava marcado para as 23h45. Mas às 23h45 não estavam no palco os esperados dois Queen, Brian May e Roger Taylor, mais banda acompanhante e o vocalista que veste por estes dias a pele de Freddie Mercury, Adam Lambert. Também não estavam 10 minutos depois – palmas e gritos quando desce um pano gigante com o logótipo da banda sobre o palco – ou vinte – palmas e gritos quando surge nos ecrãs a informação que todos conheciam: Queen + Adam Lambert.

Às 0h15, as palmas e os gritos acertam por fim no alvo. Ouve-se um curto excerto de Flash e ei-los que chegam. Nas duas horas seguintes, não estaremos nos anos 1980 ou 1990, mas também não estaremos exactamente em 2016. Entraremos no mundo de canções dos Queen, uma história recheada de hinos que todos, mas mesmo todos, conhecem. O concerto no Rock In Rio, o primeiro da nova digressão da banda, serviu para que se desse esse reencontro entre público e canções, com a caução determinante que é a presença de 50 por cento da formação original.

Adam Lambert, o ex-concorrente do concurso Ídolos norte-americano tornado estrela pop, não é, nem pode ser, Freddie Mercury. Quanto a isso, é sincero. Não está ali para enganar ninguém. “Obrigado por me deixarem tocar com os Queen”, dirá ao público. “Só há um Freddie Mercury”, acrescentará. “Vamos celebrá-lo em conjunto”. 

Iniciado em modo medley, com as primeiras canções a sucederem-se em ritmo vertiginoso – The hero, Hammer to fall, Seven seas of Rhye, Stone cold crazy -, o concerto trouxe as canções que todos queriam ouvir, de Killer queen a I want to break free, de Somebody to love a love of my life, cantada em grande parte por Brian May, de Under pressure e Another one bites the dust a Crazy little thing called love ou à obrigatória Bohemian rapsody, a mais celebrada da noite, mais ainda pelo facto de ter sido parcialmente cantada pelo próprio Freddie Mercury, presente em som e imagem nas colunas e nos ecrãs.

No Parque da Bela Vista Brian May filmou o público, que incitara a fazer a onda habitual nos estádios de futebol – “estão porreiros?”, perguntou no português que arranhou com desembaraço -, rodando um pau de selfie na passadeira montada desde o palco. Roger Taylor protagonizou essa relíquia dos concertos rock de outros tempos que é o solo de bateria – ou melhor, uma batalha de baterias: Roger na passadeira, com a barba grisalha que o torna cavalheiristicamente próximo de Sean Connery e Anthony Hopkins, e o filho Rufus Taylor, baterista dos Darkness, atrás de si no fundo do palco. E viu-se Adam Lambert cantar a citada Killer queen, fazendo jus ao título, num cadeirão de dimensões nobres. Viu-se tudo isso enquanto não desaparecia a sensação de que, apesar de Brian May e Roger Taylor, não assistíamos a uma celebração viva. Show must go on? Pois, talvez.

Adam Lambert é obviamente um bom cantor e alguém que se entrega com prazer e devoção à função que ocupa hoje nestes Queen, mas falta-lhe em nervo o que sobra nos adornos vocais que, aqui e ali, força desnecessariamente, algo de resto comum nos concursos de talentos televisivos onde o virtuosismo padronizado, logo indistinto, é a regra.

No palco do Rock In Rio, as canções dos Queen, quer as glam dos primeiros tempos, quer as da pop orelhuda criada na década de 1980, quer flirtem com o funk, como em Another one bites the dust, ou tenham a solenidade de Who wants to live forever, parecem existir mais para serem reconhecidas que verdadeiramente fruídas. Sucedem-se uma após outra até Radio gaga, We will rock you e We are the champions, as do encore. Praticamente todas, no encore e antes dele, são cantadas a plenos pulmões pelo público – na verdade, todos sabemos de cor as canções dos Queen. Assim sendo, basta-lhes existirem naquele palco. Em caricatura, diríamos estar perante um grandioso concerto de covers em que calha participarem dois dos autores originais, os digníssimos Brian May e Roger Taylor.

Mika e o fado

Ainda assim, no que ao palco principal diz respeito, será apenas dos Queen que guardaremos memória. Ou melhor, não só deles. Reformulemos. Também de Mika guardaremos memória, mas por motivos laterais à sua obra. Pela surpresa de ver Over my shoulder tocada por uma guitarra portuguesa e uma viola, esta nas mãos de Jorge Fernando, que o cantor convidou a participar no concerto depois de uma passagem na noite de quinta-feira por uma casa de fados; e pela aparição, mesmo no final, de Mariza às costas do cantor de Grace Kelly - a fadista não cantou, mas ajudou a organizar uma coreografia com o público.

Mika saltou para o estrelato com Life in Cartoon Motion, álbum de 2007, e canções como Big girls, Relax ou, principalmente, a citada Grace Kelly”. Daí para cá, foi desaparecendo do radar. Não sendo um “one hit wonder”, será um “one album wonder” - não por acaso, as canções que provocaram verdadeira reacção na plateia pertenciam à estreia em longa-duração. Que sabe como agarrar uma multidão no campeonato dos concertos de massas, é inegável. Que a sua música é uma amálgama de synth-pop e glam de colorido infantil que não distinguiríamos numa edição recente do pobre festival da Eurovisão, é-o igualmente. Muito falsete, muita afectação vocal, muita interacção com o público. Canções é que nem por isso.

Horas antes do cantor britânico de origem libanesa, vimos um óptimo concerto dos Sensible Soccers, autores do recente e celebrado “Villa Soledade” e banda que inventou um lugar para si no panorama musical (português e não só) com um híbrido orgânico digital onde confluem tempos, estéticas e geografias – dançamos e divagamos, viajamos. Vimos, depois deles, os brasileiros Boogarins expandirem ainda mais o psicadelismo em forma de canção dos seus dois álbuns com uma sede exploratória contagiante. Aconteceu durante a tarde, no palco Vodafone, o secundário.

Quando os Boogarins ainda planavam num extremo do Parque da Bela Vista, Fergie, a cantora dos Black Eyed Peas, subiu ao Palco Mundo e quis ser tudo ao mesmo tempo. Fez versões de Led Zeppelin (Black dog) e Rolling Stones (Start me up), homenageou Prince com uma citação de Purple rain e pôs cara de roqueira enquanto, costas com costas com o guitarrista, apreciava um solo estrepitoso. Juntou-se às coreografias dos bailarinos, transformou o Rock In Rio numa discoteca a céu aberto e disse-nos para Rock that body e que Party all the time pode ser a salvação para todos os problemas. Muito aparato visual, muita correria e uma salada russa musical. Tudo espremido, fica o aparato. Não, “party all the time” não salvará coisa alguma. Mas, neste festival de bulício constante do marketing feito entretenimento – tanto que parece confundir-se com a própria “experiência” do festival -, é mantra adequado ao correr dos dias.

O Rock In Rio recomeça na próxima semana, dia 27, e termina a 29. Hollywood Vampires, Korn, Maroon 5, Avicii e Ariana Grande são os destaques em cartaz.

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