África está por todo lado no Prémio Novo Banco Photo 2016

A exposição a partir da qual se decidirá o Prémio Novo Banco Photo, o maior da arte contemporânea portuguesa, é inaugurada esta quarta-feira no Museu Coleccão Berardo, em Lisboa.

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Pauliana Valente Pimentel, Quel Pedra, 2016 Pauliana Valente Pimentel
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Pauliana Valente Pimentel, Quel Pedra, 2016 Pauliana Valente Pimentel
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Pauliana Valente Pimentel, Quel Pedra, 2016 Pauliana Valente Pimentel
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Idas e Voltasde Félix Mula Félix Mula
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Idas e Voltasde Félix Mula
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Idas e Voltasde Félix Mula
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Uma das salas da exposição de Mónica de Miranda DR
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Uma das salas da exposição de Mónica de Miranda

Foi por pouco. Questão de dois dias que Pauliana Valente Pimentel e Mónica de Miranda não se cruzaram no Mindelo. As duas artistas estiveram na Ilha de São Vicente (Cabo Verde) recentemente para concluir trabalhos que tinham começado antes do anúncio, em Fevereiro, de que faziam parte da lista de finalistas da 12.ª edição do prémio Novo Banco Photo. Uma coincidência de campo de trabalho extraordinária, que forma um círculo perfeito à volta do continente africano e para o qual também contribui um trabalho centrado em Moçambique que Félix Mula, o terceiro finalista, mostra a partir desta quarta-feira no Museu Colecção Berardo, em Lisboa.

Na apresentação da exposição, Pedro Lapa, o director do museu e presidente do júri do prémio preferiu falar de “continuidade” em vez de “unidade” entre as propostas dos três finalistas. Porque, apesar desta coincidência do universo geográfico e de África ser “o tema”, as três exposições abordam a questão da identidade através de formas e propostas conceptuais muito distintas, seja no plano da relação do pessoal com o colectivo (Mónica de Miranda), seja no plano da sexualidade (Pauliana Valente Pimentel), seja no plano do atrito entre ficção e realidade (Félix Mula).

Nesta “confluência” rumo a África, há filões temáticos que têm vindo a ser explorados de maneira recorrente, como são os casos da memória e legado coloniais, o da identidade, o do arquivo ou o da diáspora. Em Field Works, Mónica de Miranda (Angola/Portugal) aborda cada um deles através de um complexo aparato expositivo que tem a ambição de abrandar o ritmo de quem vê, convidando à fruição e à reflexão. Nele a artista questiona a frieza com que nos relacionamos com as imagens de arquivo atribuindo-lhes novas narrativas e reencenando paisagens. É uma estratégia que pretende alertar para o perigo de se olhar para um legado imagético sem a pergunta: “Será que um arquivo que temos como objectivo não é ficcionado?” De maneira provocatória, e com a intenção de “profanar a noção de arquivo”, uma bailarina negra surge em várias paisagens apresentadas de maneira fragmentada (várias imagens que formam uma). É o ideal de beleza clássica a misturar-se com a aridez da paisagem castanha e a arquitectura vernacular.

Apesar de a fotografia ser a arte que fixa, Field Works (sobretudo centrado em Cabo Verde, mas com a ambição de se estender a outros países africanos) tenta mostrar exactamente o contrário – que nada está quieto. E que é preciso destituir a “noção fixa de identidade” para revelar muito mais “as identidades como identificações em curso”.

No trabalho de Félix Mula (Moçambique), a experiência pessoal nas suas mais simples e singulares manifestações (como gostar da semente avermelhada olho de boi) provoca (e convoca) a experiência colectiva e a sua relação com os espaços herdados do colonialismo, como as “cantinas” (lojas rurais), um lugar onde se vendia um pouco de tudo. Em Idas e Voltas, e na condição de regressado ao seu país vindo da Ilha da Reunião, Mula mostra o estado de abandono e de semi-adormecimento a que muitos das construções coloniais foram votadas. Para tentar compreender o seu papel (tanto no passado como no presente) procurou testemunhos orais de quem viveu junto deles, trabalho cujo resultado pode ser apenas uma frase com informações imprecisas ou incompletas. Nada que preocupe Félix Mula que gosta da ficção e da incerteza e das “diferentes versões da mesma história”.

Naquele que é o trabalho mais próximo do ensaio documental, Quel Pedra, Pauliana Valente Pimentel (Portugal) revela a pequena mas descomplexada comunidade transgénero no Mindelo (Ilha de São Vicente). Fotografias de grande formato aproximam-nos do quotidiano e mostram-nos a forma “pacífica e orgulhosa” com que é vivida uma escolha diferente. Desde que conheceu Steffy no bairro de Font Flip, no final de 2014, Pauliana procurou conhecer o grau de abertura da comunidade perante esta realidade. Nos dois períodos distintos em que viveu “de manhã à noite” no seio comunidade encontrou um “microclima favorável”, uma situação que pode ser considerada ela própria uma ilha se se tiver em conta o clima de intolerância para com comunidades de diferentes orientações de género ou sexuais em muitos países africanos. O objectivo passa também por “confrontar o espectador com os seus preconceitos”, desafiando “as convenções e normas sobre a identidade do ser humano”.

No dia 23 de Junho, um júri internacional decidirá o vencedor. As exposições dos três finalistas podem ser visitadas até ao dia 2 de Outubro.

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