Takargo quer alugar locomotivas que a CP condenou ao abate

Empresa privada quer usar duas máquinas da CP, que já estão desafectadas, para rebocar comboio de jet fuel de Sines para Loulé.

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Neste momento, a empresa tem à venda um lote de 91 veículos para transformar em sucata PÚBLICO/Arquivo

A Takargo, empresa ferroviária de transporte de mercadorias do grupo Mota Engil, quer alugar à CP duas locomotivas eléctricas que já estão desafectadas do serviço comercial. Trata-se de duas máquinas da série 2600 que a transportadora pública deixou de usar porque não ultrapassam os 160 quilómetros por hora (os Intercidades atingem todos 200 quilómetros por hora, com excepção do da Beira Baixa) e porque a empresa, com a privatização da CP Carga, já não faz comboios de mercadorias.

A empresa tem assim encostadas cerca de 20 locomotivas, algumas das quais consideradas reserva e outras a caminho do abate. Mas mesmo as que são reserva, como estão paradas e não costumam circular em operações de manutenção, acabam por se deteriorar ao nível mecânico e eléctrico. E perdem também os certificados de homologação, tornando-se depois dispendioso voltar a certificá-las. O resultado, de acordo com a prática recente da empresa, é o abate para sucata.

Estas locomotivas datam dos anos 70 e 80 e estão aptas a rebocar comboios durante mais duas décadas. Em França circulam ainda cerca de 40 em comboios de passageiros e de mercadorias.

A Takargo, cuja frota é composta unicamente por locomotivas a diesel, quer agora alugar à CP duas máquinas 2600 que pretende afectar ao comboio que transporta o jet fuel para o aeroporto de Faro desde a refinaria de Sines. O percurso até ao Algarve é todo feito em via electrificada.

A utilização destas locomotivas será, contudo, uma gota de água no aproveitamento de material ferroviário em estado de circulação que a CP tem mandado abater. Neste momento, a empresa tem à venda um lote de 91 veículos para transformar em sucata que incluem carruagens e automotoras em estado de marcha, mas que a empresa não necessita para o seu serviço.

Os sucessivos abates de comboios têm, aliás, levantado protestos de alguns entusiastas da ferrovia que, através de petições e em blogues, criticam esta destruição pois consideram alguns veículos património histórico que poderia ser usado em museus ou em comboios turísticos, e porque outros estão em estado de circulação e poderiam ser utilizados após pequenas reparações. A CP, porém, tem 20 automotoras alugadas a Espanha pelas quais paga mais de cinco milhões de euros por ano.

A transportadora pública tem sido pouco transparente nos processos de abate. Em Fevereiro do ano passado, adjudicou à Reciclagem Sucatas Abrantina o abate de 15 automotoras UTD num total de 45 veículos, que foram transformadas em sucata nas oficinas de Guifões (Porto).

Perante a recusa da CP em divulgar o valor dessa venda, o PÚBLICO requereu o acesso ao contrato, tendo a empresa recusado a sua divulgação. Após uma queixa à CADA (Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos), que deu razão ao PÚBLICO por considerar que se tratava de um documento administrativo, a transportadora pública foi adiando a sua entrega o que inviabilizou o recurso ao tribunal em tempo útil.

O PÚBLICO apurou entretanto que cada tonelada de material ferroviário vendida para sucata está estimada em 226 euros, pelo que as 15 automotoras (que pesam 150,7 toneladas cada) abatidas no Porto terão gerado receitas para a CP no valor meio milhão de euros.

 

 

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