Aquilo que não nos dizem sobre sair da zona de conforto

Eu estive seis meses fora da minha zona de conforto e foram os melhores seis meses da minha vida

Foto
DR

Tu és jovem. Estudaste, cresceste e estás preparada para saltar lá para fora. Ao longo do tempo foste ouvindo aquelas vozes que insistem que tudo se passa fora da tua zona de conforto. Sair da tua zona de conforto é, aliás, a resposta que te dão à maior parte dos dilemas que possas ter. E tu sais, na expectativa de um admirável mundo novo, que te trará oportunidades e experiências que nunca terias se te tivesses mantido dentro da caixa. Sais para te encontrar, para descobrir quem realmente és e o que queres fazer com a tua vida. E sim, as expectativas são, por norma, todas concretizadas.

Mas ninguém te diz quais são as consequências: passados uns meses, aquela passa a ser a tua nova zona de conforto — mas daquela não vais querer sair. Eu estive seis meses fora da minha zona de conforto e foram os melhores seis meses da minha vida. Fui voluntária na Roménia, trabalhei naquilo que me faz sentir realizada, conheci pessoas tão diferentes, mas tão iguais a mim na paixão por aquilo que fazem. Durante aqueles meses a vida não tinha limites: sentes-te livre, realizada e orgulhosa. Eles tinham razão, sair da zona de conforto foi a melhor decisão que alguma vez tomaste e davas tudo para te manter por lá. Mas há um problema.

Em seis meses aquela passou a ser a tua zona de conforto, com uma ligeira diferença da anterior. Ali não te sentes pequenina, não sentes que tens de competir com centenas de currículos iguais ao teu, não tens de te preocupar com a falta de oportunidades nem com ter de ser melhor que toda a gente. Só tens de ser o melhor de ti e elogiam-te por isso. Mas o tempo passa a correr, e ao fim de seis meses voltas a casa, àquela que era antigamente a tua zona de conforto, mas que agora mais te parece uma zona de batalha.

O coração e o currículo

Todos continuam iguais, mas tu estás diferente e não, não são eles que vão ter de se adaptar a ti. No máximo vão querer ver as fotos que tiraste e ouvir uma ou outra experiência (que tu vais sentir relutância em partilhar de tão especial e tão tua que foi). Aquela é a tua história, não a deles, e o tempo vai passando. Passa a primeira semana, a segunda… e ainda é novidade, ainda podes dizer que chegaste recentemente, ainda tens algo que te torna interessante.

De repente passaram dois meses e aquela história é apenas mais uma história, mesmo que para ti continue a ser “a” história, que te lembres dela a toda a hora e que define aquilo que és agora. E, mesmo que não pareça, agora é que estás fora da tua zona de conforto, sempre estiveste. Até teres descoberto aquela em que te sentias confortável. Agora voltas a lutar pela procura de um “emprego sério” (ou seja, daqueles que te garantem que pagas as contas no fim do mês e que não tens de morar em casa dos pais). Envias currículos para os quais não obténs resposta, colocas a hipótese de trabalhar noutra área, consultas pessoas especializadas em orientar carreiras que te dizem, outra vez, que tens de sair da zona de conforto. Mas eles não percebem que o que tu queres é voltar a encontrá-la desesperadamente.

Então falas com os únicos que te podem compreender, quem passou pela mesma experiência que tu, e ouves outras pessoas a expressar os teus pensamentos — “parece que, desde que voltei, não encontro o meu lugar”, “não há um único dia em que não me lembre da minha vida lá”. Saíste para te encontrar e encontraste. Descobriste aquilo em que és bom, aquilo que dá significado à tua vida, aquilo que não te importarias de fazer para sempre e que, ainda por cima, te permite ajudar os outros. Voltas com o coração e um currículo mais cheio.

Mas ninguém te disse que, quando voltas com essa informação que te daria um mar de oportunidades, há apenas uma poça de água à tua espera e que continuam a existir centenas iguais a ti e outros tantos melhores do que tu porque, afinal, todos os que saem da zona de conforto têm algo em comum — uma história que os torna especiais.

Sugerir correcção
Comentar