O 25 de Abril terá alegria e pressão amiga

Há reivindicações mas, com um Executivo com o apoio do PCP e do Bloco de Esquerda, as comemorações deste ano têm outro tom.

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Nuno Ferreira Santos

Só nesta segunda-feira, 25 de Abril, se tirarão as dúvidas ou confirmarão as expectativas. Mas, para já, as forças que costumam gritar palavras de ordem contra o Governo na tradicional descida da Avenida da Liberdade, em Lisboa, parecem estar mais brandas na contestação. “Vai ser uma manifestação onde se vai expressar a alegria pela mudança de Governo e se vai valorizar algumas medidas que foram revertidas, como os cortes dos salários, pensões e feriados”, diz o secretário-geral da CGTP, Arménio Carlos ao PÚBLICO. Haverá exigências, mas a pressão não será contra, mas porque querem mais.

As palavras de Arménio Carlos não são as únicas que expressam satisfação com a mudança do contexto político no país. O presidente da Associação 25 de Abril, Vasco Lourenço, também se mostra menos crítico do que em anos anteriores: “Vamos para a rua defender Abril na mesma, mas mais aliviados e com mais esperança”, conta.

Vasco Lourenço explica a forma como a Associação 25 de Abril vai celebrar este ano a data nas ruas. “Nós defendemos valores e princípios. Consideramos que, este ano, estamos um pouco mais aliviados, mas evidentemente há que continuar a lutar pelos valores de Abril”, diz.

A questão, continua Vasco Lourenço, é que “quem está no poder” agora “não tem a postura anti-25 de Abril” que a associação considerava que quem governava antes tinha. “Era uma postura anti-25 de Abril, de destruir tudo o que cheirasse a Abril”, aponta. E acrescenta: “Independentemente de sermos críticos em relação a um ou outro ponto, achamos que estamos mais aliviados e acreditamos que a solução que está agora no terreno possa frutificar e venha a ter bons resultados.” Quem irá este ano discursar no Rossio, em Lisboa, em nome da Associação 25 de Abril, será o coronel Nuno Santa Clara Gomes.

Em Fevereiro, Vasco Lourenço já tinha anunciado que os militares voltariam a participar nas comemorações na Assembleia da República (AR). O coronel contou à agência Lusa que foi convidado “pelo velho amigo” Ferro Rodrigues, presidente da AR, e que aceitou: “Em relação às comemorações do 42º aniversário do 25 de Abril, informou-me que nos vai fazer o convite e eu informei-o que cá estaremos”, disse, acrescentando que “deixaram de existir” os motivos que levaram a associação a faltar, durante a legislatura anterior, à sessão solene.

“Havia uma prática política, do Presidente da República, do Governo [PSD/CDS-PP] e da maioria da AR, contra os valores de Abril em que se estava a tentar destruir tudo aquilo que cheirava a Abril. Consideramos que era uma hipocrisia evocar o 25 de Abril juntamente com as pessoas que estavam a proceder dessa maneira", explicou então à Lusa. Com a mudança de Governo - executivo PS apoiado pelos partidos à esquerda, PCP e Bloco de Esquerda –, a Associação 25 de Abril dá “o benefício da dúvida” e está “esperançada de que a situação melhore”.

Reivindicar sempre

Apesar da “alegria” pela mudança de Executivo, Arménio Carlos ressalva, no entanto, que haverá sempre reivindicações a fazer: “Vai ser um momento no qual a população não deixará de manifestar a sua exigência na continuação de uma política que afirme a mudança compaginável com os valores de Abril”, justifica.

Para o secretário-geral da CGTP, “não basta” ficar parado “a celebrar o que se passou”. E preciso, insiste, “exigir a continuação das políticas”, “dar continuação e sequência, para que as expectativas sejam cumpridas”.

Admite, porém, que, este ano, vai ser diferente. “É um momento novo, sem dúvida nenhuma. Importa potenciar e rentabilizar. É preciso dar um passo em frente”, prossegue, admitindo ser necessário “valorizar as políticas que já foram efectivadas” e que, apesar das reivindicações que se mantêm, “vai entrar a alegria” na manifestação.

As reivindicações da CGTP passarão, como em anos anteriores, pela defesa de melhores condições de trabalho, do emprego, da contratação colectiva.

O coordenador da União dos Sindicatos do Porto CGTP-IN e um dos responsáveis da manifestação na Invicta, Tiago Oliveira, mostra-se um pouco menos entusiasmado. Embora também faça questão de sublinhar o apoio à “inversão de rumo que este Governo fez na valorização do salário mínimo, das pensões e das reformas”, defende que se deve continuar a exigir do executivo “uma política diferente no que diz respeito à contratação colectiva e à reivindicação de melhores condições de trabalho”.

Por isso, garante: “O contexto político é diferente, mas as reivindicações mantêm-se. Vamos continuar a exigir o cumprimento da Constituição e dos direitos dos trabalhadores, vamos dar seguimento à luta dos últimos anos pela exigência de melhores condições de vida para os trabalhadores. Não há nenhuma alteração por causa da mudança do Governo.”

Segundo Tiago Oliveira, as palavras de ordem, tanto no Porto, como a nível nacional, passam pela “exigência do cumprimento da Constituição”, pela “valorização” da contratação colectiva, pelas “35 horas para todos”, pela “valorização” do trabalho, dos direitos na saúde, na educação, e na Segurança Social. No fundo, resume: “os alicerces da Constituição.”

Este será o primeiro ano, desde o 25 de Abril em que há um Governo com apoio do PCP e do Bloco de Esquerda. Se, nos últimos anos, sobretudo nos quatro de programa de ajustamento, a actividade sindical foi intensa e as manifestações sucediam-se (ultrapassando as barreiras sindicais e chegando à sociedade civil), nos últimos tempos, tanto a CGTP como a UGT refrearam a presença nas ruas com reivindicações e a marcação de greves.

Desde a entrada em funções do Governo de António Costa, a Função Pública chegou a ameaçar com uma greve, pela retoma das 35 horas de trabalho, mas acabou por ser apenas uma paralisação sectorial de alguns sindicatos da CGTP. Além desta mostra de descontentamento, houve greves dos estivadores, mas nenhuma manifestação de grande impacto.

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