Quercus processa autarca de Gaia por difamação

Associação considera que a sua reputação e bom nome foram postos em causa por Eduardo Vítor Rodrigues.

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O festival acontece no novo parque urbano de São Paio Paulo Pimenta

A Quercus apresentou em tribunal uma queixa contra o Presidente da Câmara de Gaia, Eduardo Vítor Rodrigues, por considerar que o autarca tem feito declarações “falsas, graves e profundamente atentatórias da reputação” da organização ambientalista. Com o escalar da polémica em torno do Festival Marés Vivas, cuja nova localização tem sido contestada, o autarca acusou a Quercus de ter estado em silêncio, durante anos, apesar de o evento se ter realizado numa área também muito próxima da Reserva Natural do Estuário do Douro, porque o município lhe pagaria um “ungido”.

O autarca considera incoerente a atitude dos ambientalistas. Para o socialista, realizar um festival a 900 metros da Reserva causaria o mesmo tipo de impacte que a futura localização, no novo parque urbano de São Paio, junto ao limite sul/poente desta área protegida desde 2010 por iniciativa do município. Mas em reacção aos alertas que foram surgindo, Eduardo Vítor Rodrigues pediu a intervenção do Ministério do Ambiente e aceitou um conjunto de medidas de minimização de possíveis impactes, esperando, desta forma que a polémica amainasse. O que não aconteceu.

O autarca nunca aceitou de bom grado a intervenção da Quercus, acusando os ambientalistas de se estarem a vingar do município por não ter prolongado um protocolo com a organização, que implicava um apoio de 15 mil euros. E mais recentemente afirmou que o subsídio serviria como ungido para calar a associação, que não levantou a voz à anterior localização do evento.

A reacção chegou esta quinta-feira à tarde. “Por tais declarações serem falsas, graves e profundamente atentatórias da reputação da Quercus foi apresentada contra o autarca em questão queixa pelo crime de ofensa ao bom nome de pessoa colectiva, agravada pelo meio e pelas especiais responsabilidades do Sr. Presidente da Câmara”, anunciou em comunicado a organização fundada em 1985 e actualmente liderada por João Branco.

Esta ONG garante ser “absolutamente falso que alguma vez tenha existido qualquer “financiamento secreto” ou “unguento de 15 000 euros” de que a Quercus tenha sido beneficiária. Assume que em 2010 celebrou com Gaia um contrato, denominado “Protocolo Ecosaldo” destinado a vigorar por dois anos e acrescenta que este estabelecia “os termos de cooperação no âmbito da apresentação de uma candidatura ao QREN, visando a implementação do projecto Ecosaldo, a elaborar por técnicos da Quercus, em benefício da Câmara de Gaia, dos seus munícipes e de todos nós”. As iniciativas desse projecto, insiste, foram realizadas até 2013 e para isso foram pagas pelo município duas tranches de 7500 euros. “Para além destes dois pagamentos efectuados em 2011 e 2013, não houve mais nenhum, nem qualquer pagamento era devido!”

A Câmara de Gaia reagiu laconicamente, registando “com satisfação que a Quercus reconhece a existência de um protocolo de 15 mil euros com o município, datado de Outubro de 2010 bem como uma anormal e inexplicável cláusula de confidencialidade”. A autarquia assinala que “a Quercus passou a insistir neste assunto 'Marés Vivas', mesmo depois do parecer favorável do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas e da Agência Portuguesa do Ambiente, manifestando uma genica que nunca teve quando o festival se realizava a 900 metros da reserva”. “Tudo o resto será dirimido em tribunal”, lê-se numa resposta enviada por e-mail.

A organização clarifica que a cláusula de confidencialidade a que Eduardo Vítor Rodrigues alude “tem por finalidade proteger informações trocadas pelas partes, e não o conteúdo do acordo que não é secreto”.  “A Quercus não tem interesses ocultos nem outra motivação que não seja a defesa intransigente do património natural. Não existe para servir manobras políticas ou interesses privados. Admitimos que em certos círculos seja difícil de conceber que ainda exista quem lute por ideais e sem ter o seu bolso ou a sua promoção pessoal como fim último, mas esses não são os círculos em que os associados da Quercus se movem. São, isso sim, aqueles contra os quais lutamos”, frisa a direcção nacional desta ONG.

Insistindo que nada tem contra Gaia – concelho com um histórico de boas práticas ambientais, nota – nem contra a organização do festival no concelho – para o qual entendem haver outras localizações que não afectem a biodiversidade da reserva – a Quercus considera “insidiosa a insinuação” de que foi por causa deste protocolo que nunca viu problemas na anterior localização. Os “apenas” 900 metros de distância entre o local anterior e o actual fazem a mesma diferença que faria a qualquer um de nós ter um festival durante três dias a 900 metros na nossa casa, ou encostado à porta. Enquanto anteriormente a zona de nidificação começava a 930 metros do festival, agora começa a 30 metros. A diferença de impacte é óbvia mesmo para os mais desavisados. Escamotear este facto é absoluta má-fé”, acusam os ambientalistas que há uma semana tinham já interposto uma acção contra o município por considerarem que este estará a violar a lei ao fazer o festival num terreno de Reserva Ecológica.

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