Blanco de Morais afasta-se do Tribunal Constitucional

Constitucionalista defende autonomia do TC e espera que substituições de juízes-conselheiros não prejudiquem a fiscalização da constitucionalidade. Quanto a si, diz que está de fora.

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Carlos Blanco de Morais é professor catedrático da Faculdade de Direito de Lisboa DR

Carlos Blanco de Morais declarou ao PÚBLICO que não admite a hipótese de vir a integrar o quadro de juízes-conselheiros do Tribunal Constitucional. Depois de o seu nome ter sido noticiado como o eventual candidato a juiz-conselheiro com currículo como jurista, mas sem ser magistrado, Blanco de Morais é categórico a dizer que não quer.

“Não vou contribuir para o ‘vaudeville’ das danças de nomes para o Tribunal Constitucional”, afirmou categórico, Blanco de Morais. O jurista que foi assessor do ex-Presidente Cavaco Silva e é professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa frisa que o TC é autónomo e “o presidente é escolhido pelos pares e não pelos directórios partidários”.

Blanco de Morais sublinha que, “nas vésperas de algumas negociações para a designação de juízes entre os partidos, começa o usual processo de incineração de nomes pelos agentes políticos e pela própria imprensa”, além de “interferências de grupos de interesses e de instituições desprovidas de competência para intervir nesse processo”.

Criticando a notícia do PÚBLICO em que o seu nome era indicado como o de um não magistrado a propor pelo PSD, ao lado do do também professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa Jorge Reis Novais, Blanco de Morais garante: “Essa corrida não é, seguramente, a minha. Estou longe disso tudo.”

Sobre as alterações de composição do TC, que este ano sofrerá a substituição de cinco juízes-conselheiros - Maria Lúcia Amaral, Ana Maria Guerra Martins, Carlos Cadilhe, João Cura Mariano e Sousa Ribeiro, que é presidente -, Blanco de Morais reconhece que as suas “expectativas não são altas”, em relação ao que se vai passar no TC, quando “há uma alteração tão pronunciada no número de juízes”, num momento de “tensão e desconfiança entre os dois principais partidos”.

O antigo assessor constitucional do ex-Presidente Cavaco Silva defende que, no momento político actual, “existem riscos de vetos recíprocos a personalidades, escrutínio político dos candidatos pela imprensa e até quebra de convenções como a que faz alternar o presidente do órgão entre a esquerda e direita”. E temendo que seja difícil encontrar consensos políticos, desabafa: “Tomara que o processo não se arraste e não seja partidarizado. E, já agora, que haja, ao menos, um ou dois constitucionalistas no Tribunal Constitucional. Trata-se de algo que não tem abundado.”

Este constitucionalista afirma ainda que o TC tem um “papel central no sistema político”. De tal modo que “actuou durante a crise financeira como um verdadeiro poder moderador, disputando ou co-gerindo esse poder com o Presidente da República”.

Assim, exemplifica, o TC “garantiu a soberania do Estado em face de credores, garantiu direitos sociais contra algumas medidas sacrificiais nem sempre necessárias” e também “actuou com base em princípios normativos, sem recorrer a um activismo inaceitável como o que subjaz à tese de equiparação entre direitos sociais e direitos de liberdade que defraudaria a Constituição”. E manifesta expectativa em relação ao futuro: “Espero que a nova composição do TC continue a evitar esse tipo de fantasias”.

O catedrático da Universidade de Lisboa admite, contudo, que "o TC tem um desafio político pela frente” que “é dilemático”. Isto, porque, “se a actual maioria conservar por mais tempo medidas austeritárias impostas pela União Europeia e o TC, ao arrepio da sua jurisprudência draconiana de 2014, passar a ser mais brando, será um alvo fácil de acusações, segundo as quais só é rigoroso com governos de centro direita”.Ora, se, pelo contrário, “mantiver a sua jurisprudência relativa à natureza transitória dos sacrifícios, será acusado de insensibilidade às necessidades financeiras do Estado e amblíope em face das exigências do tratado orçamental”. Por isso, Blanco de Morais conclui que “terá de haver uma presidência forte e hábil no TC para lidar com este dilema”.

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