Banif: como funcionava um “banco péssimo”?

Relatório da auditoria forense de 2014 conta como os créditos eram aprovados, sem garantias, se perdoavam juros a alguns clientes e se alteravam contratos ao arrepio das regras.

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Banco foi intervencionado no final de 2012

Há o caso de um cliente que recebeu um novo crédito, mesmo depois de ter passado por uma “reestruturação financeira”, e ficando a dever 500 mil euros ao Banif, só em juros de mora. Foi-lhe concedido um “perdão de juros”. E um novo crédito.

Outro queria aumentar a sua linha de crédito, que era de 20 milhões de euros. A proposta foi avaliada e aprovada. Poderia agora aceder, através de uma “conta caucionada”, a 40 milhões, desde que reforçasse o valor dos “colaterais”, garantias que o banco pode usar em caso de incumprimento. O Banif, porém, decidiu dar-lhe 50 milhões. E prescindiu de garantias.

A Deloitte, que o Banco de Portugal contratou para fazer uma auditoria forense à gestão do Banif, sublinha estes e outros casos, no seu relatório de Março de 2014 – há mais de dois anos. O Banco de Portugal abriu “processos de contra-ordenação” e expressou aos administradores do Banif a sua preocupação pela “gravidade das situações descritas”.

O relatório, a que o PÚBLICO teve acesso, descreve créditos aprovados e contratados “sem que existisse uma análise de risco”, o que é um evidente “incumprimento formal” das regras bancárias. Mais: “Aprovação de operações de crédito por parte do órgão de gestão, apesar do parecer condicionado, desfavorável ou até mesmo dispensa de emissão de parecer pelo analista de crédito.”

“Foram identificadas operações cuja data de contratação é anterior à aprovação da proposta”, continua o relatório. Em casos limite, o banco chegava a aprovar operações de crédito a clientes para pagarem dívidas ao próprio banco. E a lista continua, com acusações de haver nos registos contabilísticos “provisões mal calculadas” e um deficiente registo de imparidades.

António Varela, o ex-administrador que o Estado nomeou, em 2013, classificou o Banif, numa animada audição da comissão de inquérito, como “banco péssimo”. E foi esta a situação que encontrou quando assumiu funções. Um banco sem registos sérios, nem sistema informático funcional.

Alguma coisa mudou, com a gestão de Jorge Tomé que Varela viria a integrar. O relatório refere essa mudança. Mas a dúvida permanece: como foi possível que um banco assim funcionasse, no período de mais apertada supervisão “intrusiva” da história da banca portuguesa? Até 2011 o Banif tinha estas insuficiências; no final de 2012 foi-lhe injectada uma ajuda pública de 1,1 mil milhões de euros, no pressuposto de ser um banco “viável”; e em Dezembro de 2015 foi resolvido com um prejuízo público de três mil milhões.

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