Alzheimer, os caminhos de uma doença silenciosa

Ainda não há tratamentos desta doença que afecta 44 milhões de pessoas no mundo. Uma hipótese é atacá-la antes de os sintomas surgirem.

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O maior factor de risco para a Alzheimer é a idade Rui Gaudêncio

Quando os sintomas da doença de Alzheimer surgem, é provável que o mal já esteja feito. Os estudos científicos indicam que as mudanças no cérebro relacionadas com a Alzheimer se iniciam até duas décadas antes dos primeiros esquecimentos – um dos sinais de alerta deste problema neurodegenerativo. Por esta altura, “os cérebros das pessoas já perderam neurónios”, escrevia-se num artigo de 2010 da revista Scientific American, “nenhum tratamento pode fazer reviver células mortas, e pouco pode ser feito para se criar novas células”.

A frase explicava o falhanço dos vários ensaios clínicos já feitos, onde se testaram potenciais fármacos contra a Alzheimer em doentes que já manifestavam os sintomas. Por isso, o artigo punha a tónica (e a esperança) num futuro diagnóstico precoce da doença, que permitiria ganhar tempo para combater as alterações do cérebro enquanto ainda é possível manter as funções cognitivas dos doentes.

Entretanto, o número de doentes de Alzheimer continua a subir. Em 2015, havia no mundo 44 milhões de pessoas com Alzheimer num universo de 46,8 milhões com demências. De acordo com um relatório da organização Alzheimer’s Disease International, as projecções para 2050 não são animadoras: o número de pessoas com demências quase triplicará para os 131,5 milhões, a maioria das quais terá Alzheimer.

Uma das razões para estes valores é o aumento da esperança média de vida. O maior factor de risco para a Alzheimer é a idade. A doença surge na maior parte dos casos depois dos 65 anos e pode levar a mais de uma década de dependência completa. Após os primeiros lapsos de memória, os doentes vão perdendo as recordações, principalmente as mais recentes. Com o passar do tempo, esquecem-se das pessoas e dos lugares, demoram a fazer actividades de rotina, perdem as competências sociais e têm comportamentos imprevisíveis. Por fim, tornam-se completamente dependentes dos outros. Em média, morrem passados sete a dez anos do início dos sintomas.

Muito anos antes dos primeiros sinais, inicia-se a acumulação da proteína beta-amilóide no cérebro, mas fora das células. Esta acumulação produz placas identificadas pela primeira vez em 1906 pelo médico alemão Aloysius Alzheimer (que deu nome à doença), quando fez uma autópsia a um doente com Alzheimer. Depois, dentro dos neurónios, a proteína tau deixa de funcionar normalmente. Esta proteína ajuda a formar os microtúbulos – um dos componentes do esqueleto das células. Mas na Alzheimer, a proteína tau separa-se dos microtúbulos e forma fibrilhas desorganizadas.

Não se sabe exactamente o que causa aqueles dois processos. Pensa-se, no entanto, que as placas de beta-amilóide e as fibrilhas de tau levam à morte dos neurónios. Nos exames de ressonância magnética de pessoas com estas alterações que ainda não começaram a sofrer dos sintomas de Alzheimer já é notória a diminuição do córtex do cérebro e do hipotálamo, evidências da morte celular.

Um estudo em curso na Colômbia está a testar se é possível atrasar a doença. Os ensaios clínicos estão a ser feitos em pessoas que têm uma mutação que causa Alzheimer precoce, normalmente a meio da quarta década de vida. Na investigação, iniciada em 2013, pessoas com a mutação mas ainda sem sintomas estão a fazer um tratamento com o fármaco Crenezumab, da empresa farmacêutica Genentech, que é um anticorpo contra a beta-amilóide. O composto já foi testado em pessoas com início de Alzheimer, mas não teve grandes efeitos. Agora, os cientistas querem saber se, ao começar-se mais cedo o tratamento, é possível travar a doença a tempo de evitar a morte dos neurónios e a neurodegeneração. Os primeiros resultados serão divulgados em 2018.

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