Restam apenas 3800 indivíduos dos maiores gorilas

Na República Democrática do Congo, o futuro do gorila-de-grauer está em risco. Os conflitos, a actividade mineira e a caça reduziram a população em 80% nos últimos 20 anos, segundo uma nova estimativa.

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Instituto Congolês para a Conservação da Natureza

O maior primata do mundo habita uma área menor do que o Alentejo, no coração de África. Os machos da subespécie gorila-de-grauer (Gorilla beringei graueri) podem atingir os 200 quilos e uma altura de quase 1,7 metros. O corpo compacto, as grandes mãos e um focinho curto são algumas das características distintivas deste primata que vive no Leste da República Democrática do Congo (RDC) e é cada vez mais difícil de se encontrar. Uma nova estimativa da população mostra que em menos de duas décadas o número de indivíduos desta subespécie passou de 17.000 para 3800.

Pela situação ser tão grave, o estudo publicado esta semana da Sociedade de Conservação da Vida Selvagem (WCS, sigla em inglês), dos Estados Unidos, da organização Fauna e Flora Internacional, do Reino Unido, e do Instituto Congolês para a Conservação da Natureza, defende que esta subespécie de gorilas deverá subir para o patamar mais grave da escala que avalia o risco de extinção das espécies.

“A informação apresentada justifica colocar o gorila-de-grauer na categoria de ‘perigo crítico’ da Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN)”, lê-se nas conclusões do documento. A espécie Gorilla beringei tem outra subespécie nas regiões mais montanhosas do Leste da RDC, os gorilas-da-montanha (Gorilla beringei beringei), que conta com menos de um milhar de indivíduos e está em perigo crítico de extinção.

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“A queda na população de gorilas é uma consequência da tragédia humana que aconteceu no Leste da RDC”, diz Jefferson Hall, um dos autores do estudo, do Instituto Smithsonian de Investigação Tropical, no Panamá, que pertence aos Estados Unidos. “As facções armadas aterrorizam as pessoas inocentes e dividem os despojos da guerra sem se preocuparem em absoluto com as vítimas e o ambiente”, desabafa, num comunicado do instituto.

O comunicado explica mais detalhadamente a sequência de acontecimentos que tiveram um impacto na região. O genocídio dos tutsis levado a cabo pelos hutus, no Ruanda, em 1994, causou uma migração de centenas de milhares de pessoas para a RDC. Este movimento acabou por provocar ali uma guerra civil, que matou cinco milhões de pessoas entre 1996 e 2003, quando terminou.

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Um gorila-de-grauer Jefferson Hall/Instituto Smithsonian de Investigação Tropical

Mas o conflito abalou a sociedade civil, o que levou à expansão da mineração ilegal controlada por milícias. A RDC é rica em tântalo – um minério importante para a produção de componentes electrónicos. E muitos trabalhadores foram para o interior das florestas procurar este e outros minérios. Sem recursos alimentares, os trabalhadores recorrem aos animais selvagens para se alimentarem. Mesmo sendo ilegal caçar os gorilas, pelo seu porte e por serem facilmente encontrados eles tornaram-se um dos alvos.

O gorila-de-grauer, também conhecido como gorilas-das-planícies-orientais, já estava na categoria em “perigo” de extinção. A última grande contagem da população, publicada em 1998, estimativa existirem apenas 17.000 indivíduos a viver em quatro regiões, divididos em 14 populações. Agora, com uma estimativa de apenas 3800 indivíduos, que equivale a uma redução de 80%, esta subespécie habita uma área de 19.000 quilómetros quadrados (equivalente aos distritos de Évora, Beja e metade do de Setúbal).

Entre 2011 e 2015, a equipa fez contagens de gorilas naquela região, e foi recolhida informação dada pelos guardas florestais. O novo documento conclui que todas as populações sofreram uma redução no número de indivíduos e pelo menos duas já se extinguiram. Como não existe nenhuma população não selvagem desta subespécie, a única hipótese de se evitar o seu desaparecimento é a sua conservação na natureza. Além da actividade mineira, a perda de território para a agricultura e a construção de estradas, que cortam o território do gorila, são outros desafios para a conservação.

“A actividade de milícias armadas que controlam os campos de mineração no coração da terra dos gorilas-de-grauer é capaz de levar à sua eliminação completa. Os conservacionistas estão a pressionar para que se construa a Reserva de Gorilas de Punia e a Reserva de Itombwe, que têm um grande apoio da comunidade”, explica no mesmo comunicado Andrew Plumptre, líder do estudo, que pertence à WCS. Outras mudanças que os autores pedem é a regulação dos locais de mineração, o desarmamento das milícias que controlam a actividade das minas e o apoio alimentar dos mineiros.

Jefferson Hall, numa nota mais positiva, defende que os conservacionistas locais terão um papel fundamental no futuro da subespécie. “Vimos, uma e outra vez, congoleses conservacionistas dedicados a arriscarem as suas vidas para fazerem a diferença”, diz. “Graças a estes indivíduos, ainda há esperança e oportunidade para salvar estes animais e os ecossistemas que representam.”

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