Portugal não atrai os refugiados

Quem pede asilo pode dar-se ao luxo de recusar um destino seguro. E Portugal não é atrativo mesmo para quem está desesperado.

Após várias contrariedades, avanços e recuos, parece que a recolocação de refugiados em Portugal está finalmente a avançar.

Portugal tem capacidade instalada superior ao número definido de recolocações. Tem vontade e pretende contribuir para o esforço coletivo definido no seio da União Europeia. E, talvez mais ainda, está necessitado de uma nova geração de imigrantes que compense o envelhecimento da sua população residente e a emigração em massa que a recente crise provocou. Muitas regiões do interior estão, como se sabe, vazias de gente.

Sendo este o enquadramento, sabemos porém que muitos refugiados fogem na véspera de serem recolocados em Portugal ou, o que é mais frequente, põe-se a andar para o centro da Europa poucos dias depois de serem instalados no nosso país. Falando claro: muitos refugiados não querem vir para Portugal ou não querem cá ficar.

É curioso – e merece que meditemos sobre isto. Há pessoas que, empurradas pela guerra e pela pobreza, se arriscam a tudo, colocando em perigo a sua vida e a vida dos filhos para alcançar a Europa. Morrem aos milhares no Mediterrâneo para chegar a solo europeu. Só que, quando esse solo é português – e mesmo que lhes ofereçam casa, roupas e alimentação – essas pessoas não o desejam pisar. Preferem ir embora só com a roupa do corpo.

É daquelas situações que, ironias à parte..., não estaria no espírito da elaboração e ratificação da Convenção das Nações Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados, a qual definiu o conceito e os direitos de um refugiado, bem como as responsabilidades das nações concedentes. Estes refugiados que se recusam a ficar em Portugal provocam, pela sua originalidade, reações distintas nos portugueses, que vão desde um misto de satisfação, para aqueles que acham que o país não deve receber refugiados, passando pela frustração daqueles que se esforçaram para que fosse possível recebê-los.

A primeira coisa a reter é que ninguém pode ser obrigado a vir para Portugal. A maioria dos requerentes de asilo pretende seguir para países do norte da Europa, países ricos como a Alemanha ou a Suécia, atraídos por familiares e amigos residentes mas, sobretudo, pela expectativa de terem trabalho e um elevado nível de vida. Ora, isso são condições que Portugal (como os portugueses bem sabem) não pode oferecer à maioria.

É esta a situação atual. Quem pede asilo pode dar-se ao luxo de recusar um destino seguro. E Portugal não é atrativo mesmo para quem está desesperado.

É um diagnóstico duro, com o qual vamos ter de aprender a viver. Temos de fazer mais, muito mais, para que outros povos desejem viver e trabalhar no nosso país. E para que os portugueses que foram obrigados a partir possam, um dia, pensar em voltar.

Presidente do Sindicato da Carreira de Investigação e Fiscalização do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras – SCIF/SEF

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