Regulador autoriza TAP a fretar aviões comprados à Azul para garantir ponte aérea

Decisão, tomada na sexta-feira, assegura novas ligações entre Lisboa e Porto. Companhia equacionou dar o programa de fidelização como garantia do financiamento de 120 milhões, mas o supervisor não aceitou.

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Nova ponte aérea entre Lisboa e Porto arranca já no domingo, com voos operados em parte pelos aviões fretados à White MIGUEL MANSO

A Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC) deu na semana passada luz verde à TAP para avançar com o fretamento de aviões da White, que vão operar parte dos voos da ponte aérea entre Lisboa e Porto, que arranca já no domingo. Ao que o PÚBLICO apurou, o regulador, que tem vindo a avaliar caso a caso as decisões da transportadora aérea desde que impôs bloqueios à gestão, considerou que o negócio, que envolve uma companhia brasileira fundada por um dos sócios da TAP, tem um valor competitivo face ao mercado.

A autorização da ANAC foi dada na passada sexta-feira e permitirá fretar os oito ATR 52 que pertenciam à Azul, a transportadora aérea do Brasil liderada por David Neeleman – um dos accionistas da Atlantic Gateway (dona de 61% da TAP). Estes equipamentos vão ser integrados na portuguesa White e serão depois alugados pela companhia de aviação de bandeira, incluindo as tripulações. Serão todos usados para a nova operação da TAP Express, a marca que substituiu a Portugália, embora este dossier ainda inclua a compra de outros nove aviões à Azul, os Embraer 190. Estas aeronaves vão substituir gradualmente a actual frota da Portugália, que carece de renovação.

Contactada, a TAP confirmou a informação. “O contrato com a White para utilização dos ATR ultrapassa o valor estipulado pela ANAC, carecendo de validação desta entidade, o que aconteceu”, explicou fonte oficial da empresa. Como o PÚBLICO noticiou na semana passada, os bloqueios impostos à gestão estão espelhados numa listagem com cerca 20 alíneas, de entre as quais está a proibição de assumir compromissos acima de um milhão de euros sem o aval do supervisor. Também estão vedados os aumentos salariais ou as alterações aos contratos de trabalho, por exemplo.

A autorização que ocorreu na sexta-feira é fundamental para que a TAP consiga cumprir com o anúncio feito em Janeiro sobre a reprogramação da operação no aeroporto Francisco Sá Carneiro, o que inclui o lançamento de uma ponte aérea, com voos de hora a hora, entre Lisboa e Porto. No entanto, a luz verde dada pela ANAC para o fretamento dos ATR não conclui o processo de autorizações. Estes novos aviões terão de ser todos inspeccionados e certificados para poderem voar em território europeu. É impossível que esse passo seja dado até domingo, mas nada impede a transportadora aérea de usar os 16 aviões que já tem ao seu dispor.

120 milhões condicionados
A autorização dada relativamente ao fretamento dos ATR seguiu-se a outras decisões que a ANAC tem tomado quanto confrontada com novos contratos e compromissos que a TAP pretende assumir. Desde que estas restrições foram impostas, o supervisor da aviação já deliberou, por exemplo, sobre o lançamento das novas rotas nos Estados Unidos e Marrocos e sobre o empréstimo obrigacionista de 120 milhões de euros, que já terá sido materializado, em parte. Mas relativamente a esta operação, as condições inicialmente estudadas pela TAP não avançaram.

Ao que o PÚBLICO apurou, o regulador não aceitou uma proposta que ia no sentido de dar como garantia do financiamento o programa Victoria, a plataforma de fidelização de clientes da transportadora aérea. Houve diálogo com a ANAC no sentido de transferir o programa para uma nova empresa, a dar como garantia dos 120 milhões. Mas a proposta não saiu do papel. A própria TAP só terá encarado esta alternativa como uma hipótese em estudo, por considerar que essa autonomização poderá ajudar a um desenvolvimento maior e mais célere do Victoria. Por parte do supervisor, mais do que o valor do activo o que estava em causa era a sensibilidade dos dados dos clientes.

Os bloqueios à gestão foram impostos a 19 de Fevereiro, porque o regulador entende que existem indícios de desconformidade da estrutura accionista e modelo de gestão da empresa com a regulamentação comunitária, que impede que as companhias de aviação sejam controladas por investidores de fora da Europa. O empresário português Humberto Pedrosa é o accionista maioritário da Atlantic Gateway, mas David Neeleman tem direitos a acções especiais e a vetar um conjunto de decisões importantes. A própria constituição do conselho directivo causou dúvidas e a grande fatia do financiamento chega através do empresário norte-americano (o empréstimo obrigacionista em curso será suportado pela Azul, que por sua vez é financiada pelo grupo chinês HNA).

Neste momento, só há dois caminhos: ou a Atlantic Gateway altera os seus estatutos e dá provas de que a operação da TAP é comandada por um investidor europeu, ou o novo acordo de venda a que o Governo chegou com os privados avança. E, mesmo que se materialize num contrato – algo que está por acontecer desde o início de Fevereiro – é necessário perceber se irá dissipar todas as preocupações da ANAC, visto que a Atlantic Gateway ainda terá mais direitos económicos e a gestão será totalmente privada.

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