Congresso espanhol rejeita em definitivo governo liderado por Pedro Sánchez

Secretário-geral do PSOE torna-se o primeiro líder político a falhar a investidura como presidente do Governo. Negociações prosseguem, mas a repetição das eleições legislativas parece inevitável.

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REUTERS/Juan Medina

Pela primeira vez na história da democracia constitucional espanhola, os deputados inviabilizaram a investidura de um candidato à presidência do Governo, manifestando numa nova votação a sua rejeição do acordo de coligação firmado entre o PSOE e o Cidadãos e declarando a sua "não confiança" num futuro executivo encabeçado pelo líder socialista Pedro Sánchez.

Na segunda volta, em que bastava uma maioria simples, repetiu-se o resultado da primeira. O secretário-geral do PSOE voltou a somar os votos a favor dos 40 deputados do Cidadãos aos 90 da bancada socialista, e a oposição em bloco do Partido Popular (PP), do Podemos e das formações de esquerda e nacionalistas: 219 "nãos" à moção de confiança na investidura de Sánchez.

Nas 48 horas que intermediaram os dois votos, não houve nenhum avanço negocial, apesar das aberturas do PSOE ao Podemos, com a divulgação de um pacote de 140 medidas que fazem parte da plataforma das diferentes formações de esquerda e poderiam ser acrescentadas ao pacto de governo PSOE-Cidadãos. "São medidas que reúnem o apoio de mais de 200 deputados", frisou o porta-voz do PSOE no Senado, Óscar López.

Mas de nada valeu. Apesar dos esforços de Sánchez, e dos pedidos do líder dos Cidadãos, Albert Rivera, para que "sumisse", o conservador Mariano Rajoy sobreviveu ao processo de investidura do líder do PSOE como presidente do Governo em funções.

Segundo a Constituição, abre-se agora um novo período de consultas dos líderes políticos com o rei, das quais pode sair uma alternativa para a constituição de um novo Governo ou então a confirmação de que na actual configuração, nenhuma solução goza de apoio parlamentar – o Congresso é então dissolvido e novas eleições legislativas são convocadas, previsivelmente para 26 de Junho.

Enquanto isso, Mariano Rajoy mantém-se no cargo: a sua expectativa de uma "grande coligação" é uma miragem, pelo que ao chefe do Governo resta aguardar que os espanhóis desfaçam o impasse político num novo escrutínio, e desta feita lhe concedam a maioria absoluta que lhe recusaram a 20 de Dezembro.

Os analistas políticos avisam, porém, que as condições se agravaram significativamente para o líder do PP. O desgaste provocado pelos escândalos de corrupção que envolvem o partido, aliado à postura obstrucionista e à retórica pesada e hostil empregada por Rajoy na última semana, poderão prejudicá-lo nas suas aspirações – as primeiras projecções da empresa JM&A para o jornal Público de Espanha apontam para uma perda de mais um milhão de votos no PP, e menos 11 mandatos do que actualmente.

Pelo contrário, a mesma projecção estima um crescimento do Podemos, que em número total de votos poderia empatar com o PSOE, embora no número de deputados continuasse atrás dos socialistas. Ou seja, confirma-se que a formação esquerdista de Pablo Iglesias tinha um incentivo eleitoral para recusar a aliança proposta por Sánchez para garantir um "governo progressista e de mudança" – que o Podemos encarou como "mais do mesmo", por causa da presença do Cidadãos (de centro-direita).

Apesar disso, a nega de Iglesias ao PSOE terá consequências políticas para além do horizonte legislativo, uma vez que o confronto abriu fendas nos governos regionais e municipais que assentam numa coligação entre os dois partidos. Foi pelo menos essa a interpretação das declarações do secretário de organização dos socialistas, César Luena, que se referiu a um novo "nível muito alto de exigência" sobre os membros do Podemos que assumiram cargos locais com o apoio do PSOE.

A estratégia de Iglesias também provocou a "deserção" de Carlos Jiménez Villarejo, ex-eurodeputado do Podemos e que rompeu com o partido por considerar que o "não" de Iglesias a Sánchez não só inviabilizou um Governo de esquerda como permitiu a manutenção de Mariano Rajoy e do PP no poder. "O que eu desejava era pôr Rajoy na rua e seguir outro tipo de políticas, e não voltar a ter eleições para continuar tudo como agora", disse ao El País.

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