Pedro Sánchez chumba na primeira votação de investidura

Líder socialista não obteve confiança dos legisladores para assumir a presidência do Governo.

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Pedro Sánchez só teve 130 votos a favor Andrea Comas/Reuters

Um dia depois de defender no Congresso a sua investidura como presidente do Governo de Espanha, o secretário-geral do PSOE, Pedro Sánchez, ouviu os restantes líderes partidários, um após o outro, dizer que não à sua proposta de alianças e entendimentos para a composição de um executivo de mudança no país. Como se esperava, a candidatura de Sánchez saiu derrotada da primeira votação parlamentar, com os votos contra dos conservadores do Partido Popular, dos esquerdistas do Podemos e a oposição dos nacionalistas da Catalunha e do País Basco.

Da direita à esquerda, o plano de governo apresentado pelo socialista e o próprio Pedro Sánchez foram atacados, menosprezados, ridicularizados e descritos – um e outro –  como um “bluff”, uma “farsa”, uma “ameaça”, um “miserável”. Não, não, não, repetiam os deputados chamados a manifestar o seu apoio à investidura: contados os 350 votos, havia 130 a favor, 219 contra e uma abstenção.

A excepção na unanimidade anti-PSOE foi, naturalmente, Albert Rivera, o único que negociou o seu apoio, e da sua bancada centrista, à investidura do socialista. O jovem dirigente do Cidadãos elogiou o acordo firmado com Pedro Sánchez, que integra os pontos fundamentais da sua agenda política, e defendeu a linha de mudanças e de reformas que representa um corte com as orientações do passado.

Porém, o mais importante na intervenção de Rivera não foi o que disse sobre o eventual novo Governo que prometeu apoiar, mas sobre o anterior e que ainda se mantém em funções, depois de ter dito não ao rei, ao diálogo e às reformas. As críticas contundentes de Rivera tinham um único destinatário que ele logo identificou: Mariano Rajoy. O ataque foi pessoal – e feroz. “Suma-se”, reclamou. “O senhor não tem credibilidade para liderar esta nova etapa política”, considerou.

Denunciando a atitude soberba dos conservadores depois das eleições de Dezembro, recordou que o PP não dispõe do apoio de ninguém para se manter no poder. “Os senhores tiveram maioria? Não! Então tratem de ser mais humildes e deixem de falar com essa arrogância e superioridade”, aconselhou.

Rivera, que vira a sua “coragem e valentia” elogiadas na véspera pelo líder do PSOE, acabou por pedir o mesmo aos deputados conservadores, que têm a oportunidade – e, alegou, a responsabilidade – de decretar o fim da vida política de Rajoy. “Se não cortarem o mal pela raiz e fizerem uma limpeza, os espanhóis vão pensar que não vos interessa a luta contra a corrupção”, notou. Sánchez bateu na mesma tecla, acusando o líder do PP de ser o “tampão que impede a renovação e a regeneração” do partido.

O líder do Cidadãos não foi o primeiro a pessoalizar a discussão política – aliás, Rivera limitou-se a seguir a deixa de Mariano Rajoy e de Pablo Iglesias, que se revelaram incapazes de disfarçar a tensão e a animosidade, ou de conter a exaltação: mais do que incisivo, o debate desta quarta-feira foi agressivo. “O ambiente era de bronca”, resumiu o El País. “Um espectáculo político e parlamentar como nunca se tinha visto no Congresso de Deputados”, concordava o El Mundo.

Rajoy começou por recorrer à ironia fina para atacar Pedro Sánchez, mas rapidamente passou a um registo mais triturador, sem necessidade de leituras nas entrelinhas. O pacto do PSOE com o Cidadãos foi desvalorizado numa penada como irrelevante, incoerente e “sem o menor sentido de ridículo”. As propostas de governo, prosseguiu Rajoy, são nada menos do que terríveis: “Não é exagerado afirmar que estamos perante um programa ruinoso para a economia, dissolvente para a confiança e catastrófico para o emprego.”

“O senhor perdeu este tempo todo a distribuir promessas e esperanças, mas com as mãos vazias”, observou Rajoy. “Não foi leal para com os espanhóis; escondeu-lhes a verdade, (…) em nome da sua promoção pessoal”, prosseguiu, rematando que ele, pelo menos, não tinha enganado nem o rei, nem o Congresso, nem o conjunto dos eleitores.

Pelo seu lado, o líder do Podemos, Pablo Iglesias, fez jus à sua reputação de radical e rebelde do sistema político, referindo-se ao PP como totalitário, ao Cidadãos como franquista e ao PSOE como uma espécie de confraria de oligarcas. No duelo com Sánchez, assumiu a ofensiva, com golpe atrás de golpe. “Eu não atraiçoo a minha gente”, afirmou, dizendo que foi o pacto do PSOE com o Cidadãos que impediu um “governo das esquerdas” e o fim das políticas do PP – um “exercício de transformismo”, denunciou.

“Podem criticar-me por não respeitar a etiqueta e o protocolo, mas não por não ter sido claro desde o princípio”, disse Iglesias, que repetiu as críticas ao modelo do bipartidarismo, a recusa de uma grande coligação, e as acusações de uma submissão aos “poderes económicos e mediáticos”. “A verdadeira mudança é voltar aos princípios”, frisou.

Apesar do carácter dramático do seu discurso, a estreia de Iglesias no Congresso será recordada pelo carinho do seu cumprimento, com um abraço e um beijo na boca, ao independentista catalão Xavier Domènech, no final do seu discurso (“el beso” tornou-se um dos tópicos mais mencionados do dia no Twitter).

Na resposta, Pedro Sánchez tentou atirar para Rajoy e para o Podemos o ónus do impasse político e da inviabilização de uma solução governativa e a responsabilidade pela convocação de novas eleições. “Faltar ao respeito dos espanhóis é bloquear o relógio da democracia”, sustentou.

A votação de hoje deitou por terra o acordo entre o PSOE e o Cidadãos; na sexta-feira, a segunda volta acabará com a aspiração de Pedro Sánchez de ser investido como presidente do Governo. Com o terreno minado para novos pactos e acordos, os espanhóis serão chamados outra vez às urnas a 26 de Junho.

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