Dual ou universal – eis a questão?

Só lamento que o ensino não regular seja (des)considerado por muitos agentes educativos.

No dia 8 de janeiro (mesmo dia em que foi dado a conhecer às escolas o Novo modelo de avaliação externa do Ensino Básico), foi aprovada a Resolução da Assembleia da República n.º 17/2016 intitulada “Abertura de um processo de debate com vista à definição de objetivos para uma real e profunda reforma curricular”, recomendando o início de “um processo de reflexão e debate democrático amplo e alargado a toda a comunidade educativa”. Fosse o objetivo desta recomendação a política educativa no seu todo, mereceria esta ação do nosso Parlamento nota máxima, com direito a louvor público. Sendo tão restritiva, atribuir-lhe-ei nota positiva, pois para além de servir de alavanca para o artigo que escrevo, é uma recomendação importante quer em termos substantivos (reforma curricular), quer em termos adjetivos (processo de reflexão e debate democrático amplo e alargado).

Os sucessivos governos, ora falando em metas versus objetivos, ora falando em conhecimentos e capacidades versus aprendizagens, caem na tentação de mudarem o cenário, muitas vezes ligeiramente, insistindo no texto do seu argumento já muito estafado e quantas vezes desinteressante para quem aprende, mas também para quem ensina. Se juntarmos a exasperante dispersão curricular, sobretudo ao nível do ensino básico, podemos dizer que os atores principais (alunos e professores) têm sido uns heróis.

Por isso, é importante que nos entendamos nesta matéria (quiçá um primeiro passo para o pacto que todos, exceto os políticos, queremos na Educação), sem esquecer também as alterações que se impõem no modo como se ensina, a necessitar em alguns casos de profunda reforma.

Contudo, e quando o debate proposto for realizado, é necessário estendê-lo à dicotomia que separa as forças partidárias de esquerda e de direita, ou seja, a preferência pelo ensino dual desde tenra idade ou a universalização do currículo até ao 9.º ano.

Este problema seria transitório, e até quase irrelevante, se os nossos políticos (estes que agora nos comandam, mas também os anteriores) apostassem decisivamente e “sem paninhos quentes” no ciclo de ensino que todos sabem ser “predestinador" do sucesso educativo dos alunos: o 1.º Ciclo. Esta aposta teria de ser consubstanciada em, pelo menos, duas medidas fundamentais: redução do número de alunos por turma (sobretudo no 1.º e 2.º anos de escolaridade, o ensino deverá ser o mais personalizado possível) e afetação às escolas de mais horas de apoio para ajudar a ultrapassar as primeiras dificuldades sentidas pelos alunos nos conteúdos programáticos respetivos. Na verdade, a implementação destas medidas seria um verdadeiro investimento na Educação, com efeitos muito positivos a breve prazo pois, em média, reprovam 150.000 alunos por ano, e cada uma destas reprovações custa a todos nós cerca de 4.000 euros… Aluno bem preparado no 1.º Ciclo é aluno que ajudará no combate ao insucesso e abandono escolares.

Não sendo assim, o problema tenta ser resolvido a jusante, muitas vezes sem o sucesso que medidas reativas trazem, pois a frustração, o atraso, o absentismo, a desmotivação dos alunos, aliados ao timing extemporâneo da implementação de putativas soluções deitam por terra o aparente interesse (tardio…) dos governantes para com esta franja de população estudantil. Alguns falam em ilusão, outros em logro… prefiro dizer que se trata de falta de visão e planeamento estratégico.

As soluções com que pretendem combater o insucesso - que dizem…- escolar, apontam com cambiantes diversas para caminhos muito idênticos, embora queiram fazer parecer, diferentes.

Nuno Crato homologou para o presente ano letivo 848 turmas do ensino básico e 215 do secundário dos cursos vocacionais, sendo que cerca de ¼ das turmas pertencem a escolas privadas. Esta aposta do ME do XIX governo constitucional parece ter os dias contados…

O atual ministro pretende terminar com o ensino dual defendendo a universalização do currículo até ao 9.º ano. Sem exceções? Estou em crer que abdicando do nome de cursos vocacionais, Tiago Rodrigues não prescindirá de modalidades do ensino não regular, seja cursos de educação e formação, plano integrado de educação e formação, percursos curriculares alternativos, 9.º ano + 1… Mas será assim?

Só lamento que o ensino não regular seja (des)considerado por muitos agentes educativos, como uma alternativa de recurso, sem perspetivas de futuro... empurrando para ele os alunos que não obtiveram sucesso no ensino dito regular. Trata-se de um ensino nem sempre muito bem tratado pelos nossos políticos que, todos os anos, tardam em dotar estas turmas dos recursos humanos que a lei exige ou do financiamento previsto, comprometendo o seu sucesso e daqueles que o frequentam.

Professor/Director

 

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