Um, dois, três, quatro… muitos minutos de jazz

Neste domingo fez 50 anos, esta semana celebra-os com cinco concertos. É o programa mais antigo da rádio portuguesa, Cinco Minutos de Jazz.

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Jerry González desenhado por Tiago Albuquerque para o cartaz do concerto do Hot DR

A primeira edição foi “para o ar”, é assim que se diz na rádio, a 21 de Fevereiro de 1966, faz neste domingo exactamente 50 anos. Cinco Minutos de Jazz, um programa de José Duarte, não só faz anos como quer celebrá-los publicamente com concertos. De jazz, claro, e no Hot Clube de Portugal, na Praça da Alegria, em Lisboa. Convidados especiais: Jerry González e Steve Potts.

A ideia inicial, que só não se concretiza nestes dias devido a um impedimento de última hora, era trazer Lou Donaldson, o saxofonista norte-americano autor do tema que José Duarte escolheu para genérico do programa e que assim se tornou familiar aos seus ouvintes, Lou’s blues. Mas Lou, hoje com 89 anos (nasceu em Badin, na Carolina do Norte, a 1 de Novembro de 1926), teve um problema de saúde nas vésperas da partida e o médico desaconselhou-o de viajar. O encontro fica, por isso, adiado, mas não anulado, garantem os organizadores. Haverá concerto, mais tarde.

A substituir Lou Donaldson estará o trompetista e percussionista nova-iorquino Jerry González, de ascendência porto-riquenha, tido como um dos pioneiros do jazz latino e hoje radicado em Madrid. Jerry, que conta entre as suas influências Miles Davis (nos sopros) e Mongo Santamaria (nas congas), tocou com músicos como Dizzy Gillespie, Clifford Thornton, McCoy Tyner, Tony Williams, Archie Shepp, Joe Chambers ou Kenny Dorham. No Hot, esta segunda-feira, às 22h30 (repete na quarta, dia 24, à mesma hora), tocará com quatro músicos portugueses: Filipe Melo (piano), Bruno Santos (guitarra), Carlos Barretto (contrabaixo) e André Sousa Machado (bateria).

Os outros três concertos têm como figura central o saxofonista norte-americano Steve Potts, que integrou a formação de Steve Lacy quando este actuou em Portugal, em quinteto, em Fevereiro de 1972, dando origem ao primeiro disco de jazz aqui gravado ao vivo (Estilhaços). José Duarte foi o organizador deste concerto (assim como o de Frank Wright, em 1973) e essa é uma das justificações para o convite. Steve Potts, sax-alto e ocasionalmente soprano (tocou regularmente com Steve Lacy, que morreu em 2004), estará no Hot nos dias 25, 26 e 27 de Fevereiro (22h30), e tocará em quarteto com três músicos portugueses de relevo, nos meios do jazz e não só: João Paulo Esteves da Silva (piano), Carlos Barretto (contrabaixo) e José Salgueiro (bateria). A estes concertos, no Hot, há a acrescentar mais um, no Teatro Gil Vicente de Coimbra, dia 23, onde Steve Potts tocará com o quarteto de Ricardo Toscano (sax alto), com Mário Barreiros na bateria.

Cinco Minutos de Jazz, programa curto de vida longa, fez durante meio século o papel de despertar muita gente para o jazz, para uma voz, um instrumento, uma música. Primeiro na Rádio Renascença, onde se manteve quase uma década, depois na Rádio Comercial, de 1984 a 1993 e finalmente na Antena Um (também na Dois, por curto período) desde 1993 até aos nossos dias. O seu autor, José Duarte, nascido em Lisboa a 23 de Junho de 1938, tinha 27 anos quando o programa nasceu e hoje tem 77 e um vasto currículo como divulgador e amante do jazz, que envolve programas de rádio e televisão, livros, artigos na imprensa, concertos e festivais, conferências e até um curso de jazz na Universidade de Aveiro, à qual doou o seu espólio.

No seu primeiro livro, João na Terra do Jaze (editado em 1981, por A Regra do Jogo), José Duarte reproduziu a dada altura (p. 153) o conteúdo de um postal enviado ao então director da Rádio Renascença, já o programa ia no quinto aniversário, por um ouvinte irado: “Não colabore com os idiotas propagandistas do Jazz-Batuque, pois além de ser um género de Música bárbara e subversiva de pretos americanos, é também um género de Música-Batuque, anti-Portuguesa, fora da índole e do sentir do nosso Povo, pois somos um Povo Latino.” O postal datava de Novembro de 1972, exactamente um ano depois do I Festival de Jazz de Cascais, com Miles Davis, Dizzy, Monk, Phil Woods e Dexter Gordon num mesmo palco em terras portuguesas. O postal caiu no esquecimento, mas o jazz, esse, persiste. A cinco minutos por dia ou a muitas horas por ano.

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