Acessos à praia do Malhão só através de passadiços e escadas em madeira

Para travar a degradação ambiental de uma das mais frequentadas praias do litoral alentejano, a construção de parques de estacionamento e passadiços tenta pôr fim às caminhadas pelas dunas.

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Nuno Alexandre Mendes

A partir da próxima época balnear, quem pretender frequentar a praia do Malhão, a cinco quilómetros para Norte de Vila Nova de Milfontes, estará confrontado com novas restrições impostas ao usufruto do espaço. Os percursos pedonais que até aqui se faziam a esmo pelas dunas terão, obrigatoriamente, de ser efectuados por passadiços de madeira, os únicos acessos à praia que passam a estar disponíveis.

O testemunho prestado ao PÚBLICO por Anabela Gamito, presidente da Junta de Freguesia de Milfontes, é elucidativo do estado de degradação ambiental e paisagístico a que se tinha chegado numa das praias mais frequentadas no litoral alentejano: “Era tudo pisado pela circulação das pessoas e dos carros que até na arriba estacionavam.” O resultado está à vista. A vegetação natural foi sendo destruída ao longo dos anos pelo rodado das viaturas e a erosão nas arribas e dunas tornaram a praia do Malhão vulnerável às escorrências das águas das chuvas.

A alternativa mais visível ao anárquico comportamento dos banhistas auto motorizados foi instalada junto à duna primária. Numa área com dois hectares de área, foram construídos dois parques com capacidade para receber mais de 600 carros. A Sociedade Polis justifica a obra alegando que é “inequívoca a insuficiência de lugares de estacionamento para a procura durante os meses da época balnear.”

A solução tem suscitado comentários críticos de quem visita, ou frequenta, a zona balnear por se tratar de uma área ambientalmente sensível. Luísa Brissos Gonçalves, que mora em Setúbal e se desloca com frequência a Vila Nova de Milfontes, mesmo na época baixa, confessou ao PÚBLICO o seu desagrado por ser autorizada a concentração de tantos carros junto ao cordão dunar. Acredita que a solução “não vai dar certo” explicando que o estacionamento é um convite à entrada de mais viaturas na charneca que antecede a praia do Malhão.

Também Ricardo Inácio que se apresenta como observador da natureza, recolhendo abundantes planos fotográficos em cada caminhada que faz junto ao litoral vindo de uma unidade de turismo rural próxima de Porto Covo, se interroga quanto ao elevado número de carros que vão ficar junto à praia. “Gostaria de saber se o número de estacionamentos não ultrapassa a capacidade de carga prevista no Plano de Ordenamento da Orla Costeira (POOC)”. Mesmo assim. espera que a intervenção efectuada “consiga disciplinar o comportamento das pessoas”, observa.

Contudo, a Sociedade Polis diz que o número de utentes estimado para o areal depois desta intervenção foi “calculado com base nos critérios constantes do POOC”. Mas acrescenta que, “em acordo com as entidades envolvidas na gestão do território, foi possível aumentar o número de lugares de estacionamento” para responder ao “crescimento da procura”.

Enquanto se espera que as áreas de estacionamento automóvel terminem com a imagem de viaturas dispersas pela charneca, arriba e dunas, a circulação pedonal só será permitida através de passadiços em madeira que serpenteiam entre o parque de campismo do Sitava e a praia e sobre a arriba. Os acessos ao areal também só serão feitos através de escadas e passadiços em madeira. Os banhistas dispõem ainda de miradouros sobranceiros ao areal e de um percurso de interpretação com cinco quilómetros por trás das dunas, pontuado por várias locais de descanso com bancos e plataformas. Na obra da praia do Malhão “foram instalados 1276 metros de passadiços em madeira e 194 metros de escadas”, precisou André Matoso, presidente da Polis Litoral Sudoeste, criando um intrincado de estruturas visível do ar, como está patente num vídeo da Zupa Sky disponível no Youtube.

Para travar a erosão, foi feita a cobertura das áreas mais degradadas com vegetação natural e instalados sistemas de drenagem e de encaminhamento das águas pluviais para zonas de retenção construídas de pedra e madeira evitando, desta forma, que as chuvas continuem a escavar barrancos nas arribas.

Também os parques de estacionamento foram pensados para permitir a infiltração de águas, reduzindo o escorrimento superficial e permitindo que as pessoas circulem nas viaturas naquele pavimento sem provocarem pó. As autocaravanas de grande dimensão não têm lugar nos novos parqueamentos. 

A recuperação das áreas naturais degradadas na praia do Malhão e a instalação de percursos pedonais através da construção de vedações, passadiços e zonas de estadia custou quase 1,1 milhões de euros, adiantou ao PÚBLICO André Matoso.

Este responsável lamenta os actos de vandalismo que ocorreram nos parques de estacionamento da praia do Malhão “quando a empreitada ficou finalizada”. Viaturas todo o terreno aproveitaram o novo piso para fazer gincanas que danificaram os alvéolos de plástico instalados por debaixo do piso em gravilha para facilitar a infiltração das águas pluviais. O pavimento está preparado para suportar viaturas que circulem a 30 quilómetros por hora, mas não suporta velocidades de 70 ou 80 quilómetros por hora.  

“Ainda não foi possível identificar os autores dos estragos” nem o custo das reparações e dos roubos de sinais de trânsito, adianta André Matoso, frisando que a ocorrência foi oportunamente comunicada às autoridades policiais. A prova de fogo à capacidade de preservar os espaços que foram ou estão a ser recuperados em 16 zonas balneares, entre São Torpes (Sines) e o Burgau (Vila do Bispo), será feita na próxima época estival.

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