Morreu Andrzej Zulawski, o cineasta de O Importante É Amar

O realizador, que sofria de cancro, tinha estreado em 2015 novo filme: Cosmos.

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© Eric Robert/VIP Production/Corbis
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O Importante É Amar, um dos mais lancinantes papéis de Romy Schneider
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Isabelle Adjani em Possessão
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Valérie Kaprisky, A Mulher Pública

O realizador e escritor polaco Andrzej Zulawski, autor de O Importante É Amar (1975), morreu na noite de terça para quarta-feira, aos 75 anos, anunciou a Associação dos Cineastas Polacos, citada pelo diário francês Le Monde.

Nascido em 1940 na então cidade polaca de Lwów – a actual Lviv, na Ucrânia –, Zulawski sofria de cancro e o seu filho mais velho, o também realizador Xawery Zulawski, vinha colocando mensagens na sua página de Facebook explicando que o pai estava hospitalizado em estado terminal.

Andrzej Zulawski estudou cinema em França no final dos anos 50 e, regressado à Polónia, tornou-se assistente de Andrzej Wajda, o realizador de Cinzas e Diamantes (1958). Estreou-se na realização em 1971, com Trzecia czesc nocy (The Third Part of the Night) e no ano seguinte viu o seu segundo filme, Diabel (The Devil) ser proibido pelas autoridades comunistas.

Exilou-se então em França, onde realizou, em 1975, aquela que é considerada a sua obra-prima, O Importante É Amar, com Romy Schneider (um dos seus mais lancinantes papéis), Fabio Testi e Jacques Dutronc. História de um triângulo amoroso, uma mulher (Romy), o seu marido (Dutronc) e o amante fotógrafo (Testi), é a história de uma actriz no ponto mais baixo da sua carreira, em deriva para o porno, e de um amor desesperadamente salvífico.

Foi o primeiro filme francês de Zulawski e o seu encontro com uma actriz que estava no seu zénite, Schneider, cinco anos depois de A Piscina (Jacques Deray), quatro depois de As Coisas da Vida (Claude Sautet). Receberia, aliás, o César de melhor intérprete feminina por esse filme.

O intenso Zulawski tinha um partis pris em relação a Romy, considerando-a demasiado "burguesa". Mas a verdade é que a encontrou num momento da sua carreira em que estava disposta a, como se diz, "partir a cara". O Importante É Amar passou a ser uma espécie de "prova do delito" de Romy, da sua disponibilidade para a exposição, para o sofrimento, o que marcaria a sua carreira e reputação até ao fim, quando a "vida" e o "cinema" passaram a confundir-se de forma trágica no ecrã no rosto da actriz.

Depois do sucesso de O Importante é Amar Zulawski prossegue na via do excesso e da histerização das emoções, avançando pelo grotesco dentro, mas com mais ruído e tiques, e menos vertiginoso do que aparatoso – nisso residindo a coerência de "um artista muito original, às vezes controverso mas sempre fiel a si mesmo", palavras do presidente da associação de cineastas polacos, Jacek Bromski. Essa exuberância exacerbada caiu no goto de vários actores e actrizes, que a ele se entregaram para conseguirem alargar os seus registos. E assim, na primeira metade dos anos 80, Zulawski foi dando que falar de si, e dos seus actores, com Possessão (1981, Isabelle Adjani), A Mulher Pública (1984, Francis Huster e Valérie Kaprisky), ou L’Amour Braque (1985), livremente adaptado de O Idiota, de Dostoievski, filme protagonizado por Sophie Marceau, com quem se casara em 1984, e de quem teve um filho, Vincent, nascido em 1995 (o casal separar-se-ia em 2001).

Ainda voltou à Polónia em 1977 para realizar Na srebrnym globie (On the Silver Globe). A produção do filme foi interrompida pelas autoridades polacas em 1978, parte dele perdeu-se, e Zulawski só o completaria em 1988, usando a narração em voz off para colmatar as cenas desaparecidas.

Definitivamente radicado em França, realizou vários outros filmes com Sophie Marceau, como As Minhas Noites São mais Belas do Que os Vossos Dias (1989), ou A Fidelidade (2000).

Após um longo silêncio de 15 anos, em que se dedicou à literatura e em que assumiu que possivelmente o cinema acabara – escreveu em 2004: “Fui o último aluno destes dinossauros que admirei, Bergman, Fellini, Kurosawa, Welles, Stroheim, Peckinpah... O cinema que queria fazer não existe mais, a voz extinguiu-se. A inteligência abandonou o argumento ou a realização para se refugiar na tecnologia. Para mim, acabou, não é uma tragédia” –, apareceu em 2015 com novo filme, Cosmos, baseado no romance homónimo do escritor polaco Witold Gombrowicz, filme produzido por Paulo Branco.

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