“Crimes de guerra” contra hospitais na Síria fizeram “pelo menos 50 mortos”

Médicos Sem Fronteiras dizem que 17 estruturas de saúde foram bombardeadas nas últimas seis semanas, numa “política de terra queimada”.

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Tanque turco atira contra a Síria AFP/BULENT KILIC

Ataques aéreos contra quatro hospitais em zonas controladas por grupos de oposição na Síria fizeram “pelo menos 50 mortos”, diz Farhan Haq, porta-voz das Nações Unidas em Nova Iorque. Para o secretário-geral da organização, Ban Ki-moon, trata-se de uma “óbvia violação das leis internacionais”.

Os ataques, na segunda-feira, atingiram instalações usadas como maternidades e unidades pediátricas – não se sabe quantas vítimas eram crianças. Dois dos hospitais eram apoiados pela Unicef. “Para além das considerações diplomáticas e das obrigações à luz da lei humanitária, recordemos que estas vítimas são crianças”, afirmou num comunicado o director da Unicef, Anthony Lake.

O ministro dos Negócios Estrangeiros francês, Jean-Marc Ayrault, diz que os bombardeamentos “constituem crimes de guerra”, os mesmos termos usados pelo Governo da Turquia.

Um hospital gerido pelos Médicos Sem Fronteiras (MSF) em Maarat al-Numan, na província de Idlib, ficou reduzido a escombros. Mego Terzian, presidente dos MSF franceses fala num “ataque deliberado” e aponta a responsabilidade “ou ao Governo ou à Rússia”, cuja aviação apoia o regime de Bashar al-Assad desde o fim de Setembro.

O embaixador da Síria em Moscovo, Riad Haddad, acusou os Estados Unidos dos raides. “Não temos nenhuma razão para atacar em Idlib, o ISIL [uma das siglas usadas para referir o Daesh, autodesignado Estado Islâmico] não está activo ali”, respondeu o porta-voz do Pentágono, Jeff Davis.

“Cinco hospitais apoiados pelos MSF foram bombardeados desde o início de 2016 […]. Ao todo, 17 estruturas de saúde foram bombardeadas na Síria em seis semanas. É a terceira vez que a equipa do hospital atacado esta segunda-feira em Maarat al-Numan é visada desde o início da guerra”, afirmou Mego Terzian, da Organização Não Governamental (ONG), numa entrevista ao jornal Le Monde.

Terzian não tem dúvidas de que este hospital, que a ONG ajudou a reconstruir em Dezembro, foi visado “pela coligação do Governo de Damasco” porque “eles consideram que tratava populações ou combatentes que lhes são hostis”. Segundo Terzian, “com o início da intervenção russa os bombardeamentos intensificaram-se, eles fazem a mesma política de destruição de Grozni, na Tchetchénia: uma política de bombardeamentos massivos sem discriminação; é uma política de terra queimada”.

O responsável dos MSF diz que o regime e a Rússia “sabem muito bem que são hospitais e é inadmissível que os ataquem”. Hoje, afirma Terzian, “para a coligação do Governo sírio, trabalhar ou fazer operações de ajuda, nomeadamente médica, numa zona controlada pela oposição, é um acto criminoso; eles consideram todo o pessoal que trabalha numa zona da oposição como um terrorista, mesmo os MSF, eles vêem-nos como uma organização terrorista”.

“Que o regime de Assad e os seus apoiantes continuem com estes ataques… levanta dúvidas sobre a vontade ou a capacidade da Rússia para ajudar a pôr fim à brutalidade do regime de Assad contra a sua própria população”, diz o Departamento de Estado.

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Segundo um acordo assinado na sexta-feira pelos 17 membros do Grupo Internacional de Apoio à Síria (que incluiu os EUA e a Rússia), uma “cessação nacional das hostilidades” deveria entrar em vigor até ao fim desta semana, ao mesmo tempo que a ajuda humanitária começaria a chegar às zonas onde é mais urgente.

Entretanto, para além dos continuados ataques aéreos nas regiões de Alepo e Idlib, de onde o regime quer expulsar a oposição, abriu-se uma nova frente de combate, com a artilharia da Turquia a atacar posições recentemente conquistadas por milícias curdas junto à fronteira. Apesar dos três dias de ataques turcos, os combatentes das YPG (Unidades de Defesa do Povo) conseguiram capturar a cidade de Tal Rifaat a rebeldes islamistas, disse esta terça-feira a ONG ligada à oposição Observatório Sírios dos Direitos Humanos.

Os Estados Unidos consideram as YPG um importante aliado no combate aos jihadistas, mas Ancara diz que são uma organização terrorista por causa dos seus laços ao PKK turco (Partido dos Trabalhadores do Curdistão) e quer impedi-las de conquistar mais território junto à fronteira (os curdos já controlam a maioria da fronteira), aproveitando o caos provocado pela ofensiva em Alepo.

Depois de Tal Rifaat, o próximo passo lógico para os curdos seria tentaram tomar Azaz, uma cidade estratégica quase na fronteira. O primeiro-ministro turco, Ahmet Davutoglu, prometeu “a mais dura reacção” se as YPG tentarem chegar a Azaz.

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