Rui Moreira acusa TAP de considerar "deficitários" voos sempre cheios

Na “guerra aberta” que está instalada entre as forças vivas da região, com o presidente da Câmara do Porto a liderar a contestação, e a gestão agora privada da companhia aérea, o autarca entendeu divulgar números que nunca foram tornados públicos pela companhia

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Daniel Rocha

Por entender que há “interesse público”, e com o objectivo de desmontar os argumentos veiculados pela companhia aérea de que as ligações efectuadas entre o Porto e as cidades europeias de Milão, Roma, Bruxelas e Barcelona são deficitárias, e daí ter decidido interrompê-las a partir de Março, a Câmara do Porto substituiu-se à TAP, e divulgou as taxas médias de ocupação desses voos para demonstrar que estes estiveram quase sempre cheios.

Segundo a autarquia, que referiu ter conseguido os dados junto de elementos da TAP, as taxas de ocupação estiveram sempre acima dos 80%, muitas vezes perto dos 100%. Em 2015, e nos voos de ligação entre o Porto e aquelas cidades, foram transportados perto de 190 mil passageiros durante o ano de 2015, em 1867 voos de chegada e partida do aeroporto Francisco Sá Carneiro.  

A “guerra” entre as forças vivas da região, com o presidente da Câmara do Porto à cabeça, e as decisões de gestão da companhia aérea recentemente privatizada continuam a subir de tom. O PÚBLICO  contactou a TAP, mas a companhia aérea entendeu não reagir – não desmentindo, por isso, os números que foram desvendados no portal do município.

“Só a ligação directa entre o Porto e Bruxelas transportou, em 2015, mais de 53 mil passageiros, em 350 voos e as duas ligações a Milão (manhã e tarde) transportaram outros tantos, em 622 voos, embora em aeronaves mais pequenas. Na ligação a Roma, a TAP transportou mais de 40 mil passageiros, em 240 voos, e a ligação a Barcelona mais de 42 mil, em 655 voos”, divulga a Câmara do Porto.  A empresa usou nestas ligações aparelhos da Portugália, dos modelos Embraer E145 (lotação de 49 passageiros), Fokker (100 passageiros de lotação), e alega que viajaram quase sempre cheios. E que sempre que usou aparelhos de maior dimensão, da TAP, como o Airbus A319 (132 passageiros) ou A320 (162 passageiros), os voos foram também cheios “tendo registado uma ocupação de 100%”, acrescenta. 

De acordo com os dados divulgados por Rui Moreira, as taxas de ocupação com saída do Porto para Bruxelas tiveram uma taxa média de ocupação de 90%, Roma atingiu os 89%, os voos de Milão mereceram taxas de 88% de manhã e 95% à tarde e o destino Barcelona viu aviões ocupados a 91% de manhã e 98%  à tarde. Já os vos para o Porto proveniente daqueles mesmos destinos tiveram taxas de ocupação um pouco mais baixas: Bruxelas 77%,  Milão 87% (manhã) e 86% (tarde), Roma (91%) e Barcelona 92% (manhã).

Ligações deficitárias?

Com estes números, o presidente da Câmara do Porto entende que fica em causa a explicação dada pela TAP quando anunciou a suspensão de ligações internacionais — e a criação de outras a partir de Lisboa e do Porto. Por exemplo, suspendeu as ligações para Barcelona, Milão, Roma e Bruxelas a partir do Porto, mas anunciou uma nova ligação entre Lisboa e Vigo. Para as várias entidades da região que se tem pronunciado sobre o assunto, estas decisões não são económicas, mas sim estratégicas: servem para perseguir o objectivo de alimentar o hub da TAP, instalado em Lisboa.

Há, porém, outros factores que determinam se uma linha aérea é ou não deficitária para além dos chamados load factor — por exemplo, o facto de o preço dos bilhetes ter um sistema de fixação muito pouco linear. Tal como não é nas companhias low cost, que também já encerraram linhas deficitárias a partir do Porto. Por exemplo, a ligação para Marraquexe efectuada pela Ryanair não durou mais do que um calendário IATA, mesmo depois de ter beneficiado de apoios ao nível da estratégia pública de fomento da acessibilidade aos aeroportos portugueses, protagonizada pelo Turismo de Portugal. Esses apoios servem para instalar bases nos aeroportos, ou abir novas rotas, e dele já beneficiaram tanto a TAP como as companhias low cost. Fonte do Turismo de Portugal contabilizou ao PÚBLICO que esses pacotes de incentivos totalizaram os seis milhões de euros nos últimos quatro anos. 

O presidente da Câmara do Porto tem insistido em pronunciar-se sobre a gestão económica e estratégica de uma empresa agora privada (é o consórcio Gateway Atlantic, dos empresários Humberto Pedrosa e David Neelman quem detém 61% do capital) porque o actual governo de Antonio Costa insiste na intenção de reverter a privatização.

Depois de na passada segunda-feira à noite, na Assembleia Municipal do Porto, o assunto ter estado em debate, e ter sido votada uma moção contra o anunciado cancelamento daquelas rotas - o presidente da Câmara sugeriu até que, concretizada a reversão da privatização, os gestores da TAP deviam ser demitidos - , também ontem à noite o presidente da Associação Comercial do Porto (ACP), Nuno Botelho, divulgou ter enviado uma carta ao Primeiro-Ministro, na qual insta António Costa a assumir o compromisso de manter o serviço público da TAP caso prossiga a intenção de reverter a privatização da transportadora, processo este fechado pelo anterior executivo. 

 

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