Batam palmas ao novo rei

O segundo disco de Anderson Paak é um assombro.

Foto
A Anderson Park não falta o swag das ruas, mas a sua garganta não consegue disfarçar o classicismo que a funda

E o que parecia tornou-se real. Desde o disco de estreia, e em particular ao longo do último ano, Anderson Paak foi deixando promessas de um talento admirável, promessas traduzidas sob a forma de faixas avulsas em que se distinguiam a sua voz, mais próxima da soul que do rap, e arranjos preciosos. Particularmente impressionante foi a sua aparição em Compton, de Dr Dre, em que sem esforço roubava o show. A Paak não falta o swag das ruas, mas a sua garganta não consegue disfarçar o classicismo que a funda. Malibu, o segundo álbum, é a improvável confirmação de um talento absurdo, escorado na tradição da soul americana, um talento que não precisa de violência gráfica, pornografia, referências gratuitas a drogas nem de asas abertas à pavão para ser admirado.

É um disco de hip-hop, claro, se admitirmos que o melhor hip-hop há muito se soltou da matriz, mas um disco de hip-hop em que o imenso arco-íris musical joga para a voz de Paak. E é um disco de hip-hop no sentido em que olha para a herança negra, de forma estupenda logo na primeira faixa, The bird: “My uncle had to pay the cost (..) my mother caught the gambling bug (...) my papa was behind them bars (...) all we ever needed was love”. Esta narração surge por cima de uma malha funky com balanço tépido, coros, metais e um piano de jazz de engate. Esta presença do jazz encontra-se por todo o Malibu: Heart don’t stand a chance tem teclas vintage, palmas, baixo sincopado, tudo muito lounge, Room in here precisa apenas de um belo beat e um pianinho para ascender à categoria de impecável. O piano traz o jazz, os metais o funk, os coros a soul. E o baixo de Come down é extraordinário. Estilisticamente isto torna Malibu num disco trans-género, inclassificável. Am I wrong (com Schoolboy Q) é uma esmagadora faixa disco, com grande linha de baixo, que, aos três minutos, quando entram os metais, devém cançãozorra. Beats imaginativos, muita classe nos arranjos, um leve tom de nostalgia, uma voz que podia ser de crooner, palavras bem medidas.

É um tremendo disco de hip-hop, ancorado no século XXI sem esquecer o que está para trás, um disco de agora, deste momento, dos nossos problemas, das nossas alegrias. Onde vamos quando não queremos estar aqui no real? Vamos a Malibu, Malibu é excelente.

Sugerir correcção
Ler 1 comentários