Vem aí o homem das apps e dos sete ofícios!

Estamos em crer que regressaremos ao “homem dos sete ofícios” que o capitalismo industrial tinha desconstruído para construir o profissional especializado do capitalismo industrial.

Face ao novo ecossistema da era digital e à emergência da (i)conomia, pode legitimamente perguntar-se quem será o homem do “tempo novo”, o homem das redes e dos écrans, da economia quaternária e da sociedade colaborativa e voluntária? Para nós será o homem das “apps”, o homem novo dos sete ofícios.

Vejamos o cenário mais provável, em especial nos países do chamado mundo ocidental. Em primeiro lugar, a economia pública reduzirá a despesa pública para poder reduzir os impostos. Pelo meio reduzirá o emprego público, substituindo funcionários públicos por prestadores de serviços em outsourcing. Em segundo lugar, a economia social e solidária passará por uma forte racionalização na medida em que depende bastante dos subsídios públicos. Pelo meio reduzirá o emprego social e muitas das suas funções serão externalizadas para as comunidades locais da Sociedade Colaborativa ou Sociedade“CO”. Em terceiro lugar, a economia capitalista, devido à automatização e à concorrência, reduzirá ainda mais o emprego convencional e externalizará muitas tarefas que passarão a ser oferecidas pela economia on-demand para onde se transferirão muitos trabalhadores em regime de freelance.

Neste contexto em constante adaptação, a Sociedade “CO” será, em primeira instância, uma espécie de “banco de urgência”, em segundo lugar, uma enorme placa giratória para as economias em trânsito e, por último, e mais importante, a grande casa comum para a maioria dos cidadãos “em trânsito”.

Acresce que nesta “Sociedade Co” circularão, para além da moeda oficial, várias moedas locais e criativas e, portanto, o nosso “cidadão multi-aplicações” (multi-apps) acumulará rendimentos, monetarizados e não-monetarizados, com diversas proveniências: um emprego em part-time num serviço público e/ou numa empresa privada, uma prestação de serviço em regime de freelance numa empresa on-demand, umas horas num banco do tempo local em troca de um voucher e, finalmente, uma “inscrição” numa startup colaborativa de uma parte dos seus recursos ociosos (idle resources) em troca de uma receita eventual.

De onde se retira que, devido à quebra estrutural do emprego, estamos condenados a uma sociedade de regimes laborais muito diversos, uns em part-time, outros em regime de freelance, outros ainda em regime contributivo e colaborativo, sob muitos formatos, condições e reputações, se quisermos, uma sociedade onde o individuo “se produz a si próprio” numa espécie de corporate individualisme.

Por isso, estamos em crer que regressaremos ao “homem dos sete ofícios” que o capitalismo industrial tinha desconstruído para construir o profissional especializado do capitalismo industrial. E porquê o “homem dos sete ofícios” na era da internet?

Em primeiro lugar, por que a auto-formação, oferecida em Opensourcing estará muito próxima do custo marginal zero. Em segundo lugar, por que a escassez de empregos obrigará a repartir os horários de trabalho e a oferecer um leque mais diversificado de oportunidades. Em terceiro lugar, porque todo o mercado de trabalho se tornará muito mais volátil e adaptativo. Em quarto lugar, porque se tornará imprescindível a complementaridade de rendimentos, monetarizados ou não. Em quinto lugar, por que as actividades da economia colaborativa e voluntária permitirão ensaiar novas experiências, saberes e ocupações. Quer dizer, através da economia colaborativa as diferentes comunidades de utilizadores e fornecedores organizarão novos formatos de prestação de serviços com suporte em plataformas tecnológicas cujas aplicações informáticas serão instaladas nos telefones móveis dos jovens e menos jovens que desejam entrar no “mercado de trabalho”. É aqui que entra “o homem dos sete ofícios”. De acordo com as suas capacidades e experiências ele irá “inscrever-se em diferentes aplicações”, geridas muito provavelmente por uma start-up tecnológica recém-constituída, em condições muito variáveis de horário, pagamento, prestação e qualidade de serviço, que a sua “putativa reputação” lhe permitirá oferecer. Poderão ser sete ofícios, mas dificilmente serão sete profissões. Entretanto, enquanto aguarda por uma chamada, poderá continuar, em sua casa, a formação permanente num MOOC (massive open online course) a custo zero. É o maravilhoso mundo novo que chega, sobretudo por via das gerações Y e Z (entre os 12 e os 35 anos)!

Professor catedrático na Universidade do Algarve

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