A Barbie é mais curvilínea, mais alta ou mais baixa

Três novos tipos de corpo para a boneca mais famosa do mundo – é a maior mudança corporal da boneca em 57 anos. Da “construção pura” do ícone de beleza à tentativa de diversidade e escolha.

Fotogaleria
DR
Fotogaleria
DR
Fotogaleria
DR
Fotogaleria
A Barbie original, lançada em 1959 DR
Fotogaleria
DR
Fotogaleria
DR
Fotogaleria
DR

Pernas longas, cintura de vespa, pés em pontas, peito pronunciado e longo cabelo loiro – a Barbie nasceu assim em 1959 e tornou-se a boneca mais famosa do mundo. A sua reputação é, no entanto, controversa. Ao longo de 57 anos foi alvo de críticas ao irrealismo do seu corpo e o molde da boneca original da Mattel mudou, mas pouco. Esta quinta-feira, a Barbie ganhou três novos tipos de corpo (alto, pequeno e curvilíneo) na sua linha Fashionistas para “reflectir melhor o mundo que as meninas vêem à sua volta”.

No total, são 33 bonecas novas com quatro tipos de corpo, 30 cores de cabelo, 24 penteados, 22 tons de olhos, 14 estruturas faciais e sete tons de pele na linha Fashionistas (em Portugal estarão à venda a partir do final de Março). Terão uma linha de roupa própria e tamanhos de sapatos específicos para os diferentes corpos. A boneca mais diferente é a curvilínea (curvy) – tem ancas largas e uma barriga ligeiramente saliente.

“O mundo em que vivemos mudou”, reconhece Sara Marçal, responsável de marketing da Mattel Portugal, numa entrevista por email. “De modo a continuar relevante, é necessária evolução, mudança e reinvenção contínuas”, admite, e por isso lançam três novos tipos de corpo num “novo capítulo para a marca” que permite aumentar “o leque de escolhas” para as crianças – o público-alvo são as meninas, mas os rapazes também convivem com as Barbies e há adultos coleccionadores.

O PÚBLICO questionou a Mattel sobre se a expansão da linha é uma resposta a críticas dos pais ao ideal de “corpo perfeito” que a boneca parece propalar ou a quebras nas vendas, mas a marca referiu apenas que em Portugal, onde está há 30 anos, já houve “anos melhores e outros piores”. Em 2015, as vendas da marca no país cresceram 22,7% em valor total em relação a 2014. À Time, Evelyn Mazzocco, directora geral global da marca Barbie, admitiu que a criação das novas bonecas da linha começou há dois anos também em reacção a críticas à boneca nas redes sociais e a emails de ódio dirigidos à Mattel. A criadora da boneca, Ruth Handler, defendia na sua autobiografia que ao contrário do que a acusavam as feministas, a boneca “representa o facto de a mulher ter escolhas”.

As novas bonecas surgem numa altura em que há maior variedade de brinquedos e também constante questionamento sobre o impacto dos produtos de massas nas questões identitárias e de diversidade. “Há um preconceito” amplamente debatido sobre a boneca, atesta a professora e investigadora Sara Pereira – “o corpo ideal, a boneca loira, um protótipo de perfeição”. “Uma construção pura”, diz a docente da Universidade do Minho.

Desde que nasceu, a Barbie já teve cerca de 180 profissões mas o seu corpo sofreu poucas alterações. Em 1998, o molde foi ligeiramente alterado para alargar a sua cintura (17 anos depois da primeira Barbie negra, em 1981). E a ciência tem mostrado que as suas medidas, transportadas para um ser humano, resultariam numa mulher deformada – em 2009, a Universidade Central do Hospital de Helsínquia, na Finlândia, indicou que lhe faltariam entre 17 e 22% de gordura corporal para que fosse uma mulher saudável e com menstruação. Em 2013, o Rehabs.com, um site sobre comportamentos adictivos, elaborou infografias que mostram que, se fosse real, a Barbie seria incapaz de levantar a cabeça demasiado grande, não conseguiria andar e a sua cintura deixaria espaço apenas para metade do fígado e uns centímetros de intestino.

As novas bonecas da linha – que Sara Pereira espera que não sejam também elas fonte de estereótipos –, têm então corpos curvilíneos, mais altos e mais baixos, com tons de pele variados. “A criança quando é mais pequena não levanta essas questões” sobre o aspecto físico – “acima de tudo é um brinquedo de que gosta, e de que se habitua a gostar pela própria máquina de marketing que a faz afeiçoar-se à boneca”, analisa Sara Pereira. O impacto que as bonecas têm nas crianças “é uma análise mais adulta”, diz a docente, que frisa a importância do papel da família no seu enquadramento e da existência de “diversidade de brinquedos que possam contrariar esses estereótipos”.

As vendas mundiais da Barbie desceram 20% entre 2012 e 2014 e continuaram a cair no último ano, segundo a Time. “Houve uma sensação de que a Barbie não era tão autêntica como poderia ser”, confirma Mazzocco. Em 2014, a Lego ultrapassou a Mattel, marca que desde 2011 atinge um volume de vendas superior a mil milhões de dólares, como maior fabricante de brinquedos do mundo.

Este makeover virá a tempo? “Pode vir já tarde em termos da imagem da boneca, mas no que toca ao que é hoje a evolução social e do entendimento do consumidor, não sei se poderia ter acontecido antes”, diz Sara Pereira, que trabalha temas ligados à infância, sobre a circulação da informação e o papel das redes sociais.

Ameaçada há uma década pelas Bratz, depois pelas Monster High e pelas princesas Disney (todas eram produzidas pela Mattel, até estas últimas irem para a concorrente Hasbro), agora é o filme Frozen – O Reino do Gelo que faz mossa no mundo cor-de-rosa de Barbie – Elsa, a nova heroína da Disney engrossa as perdas de 500 milhões de euros em receitas da Mattel para a Hasbro, contabiliza a Time. Tempo de mudança em que “o próprio valor simbólico da criança é muito maior na sociedade”, diz Sara Pereira, com mais produtos e campanhas a ela destinados. 

Sugerir correcção
Ler 1 comentários