Câmara impressionista

Mais perto da música de câmara do que do jazz, Ches Smith concebe o seu álbum de estreia na ECM sob a forma de um enigma musical sombrio.

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O trio de Ches Smith apresenta-se dia 16 no Pequeno Auditório da Culturgest - a não perder DR

O baterista norte-americano Ches Smith tornou-se bem conhecido ao longo dos últimos anos pelas suas múltiplas colaborações, não apenas com artistas de topo na área do jazz, como Tim Berne, Mary Halvorson, Wadada Leo Smith, Marc Ribot ou John Zorn, mas também com projectos híbridos de rock experimental alternativo (Secret Chiefs 3, Mr. Bungle, Xiu Xiu) ou ainda com algumas figuras icónicas da história da música como Terry Riley ou Iggy Pop. Uma fascinante amálgama de influências que levou agora Manfred Eicher a convidá-lo para integrar o todo poderoso catálogo da Germânica ECM. 

A expectativa não poderia ser maior, pela recepção entusiástica (de crítica e público) aos seus últimos álbuns com o projecto These Arches, e sobretudo pelos nomes convocados para o acompanhar neste registo - Craig Taborn (piano) e Matt Maneri (viola), dois dos mais fascinantes e criativos improvisadores da actualidade. Ao ouvirmos o álbum, o primeiro impacto é de surpresa, alguma estranheza até. A música de The Bell, tema título que abre o disco, desenvolve-se lentamente, muito lentamente. Notas suspensas, tocadas pelos três instrumentos, dão lugar a uma melodia trémula pela viola de Maneri. O ambiente é de gravidade, suspensão e mistério. A tensão, bem característica de uma música tocada por instrumentistas deste calibre, está lá, mas não é de jazz que se trata. É antes uma música de câmara híbrida, narcótica e vagamente sensual, que se recusa a deixar catalogar. Três mestres improvisadores, unidos por uma química e empatia pouco usuais, jogam com aquela que seria a nossa percepção de uma música de câmara, e povoam o espaço de infinitos detalhes e texturas sonoras, contrariando a estática sugerida pelo ambiente inicial. Ao segundo tema, Barely Intervallic, estamos já submersos num universo sonoro dissonante que parece convocar as energias espectrais do lado mais negro da terra, tal como sugerido um pouco mais à frente, no igualmente grave e sombrio I’ll See You on The Dark Side of The Earth, este último um tema fascinante onde são integrados fraseados e elementos rítmicos oriundos do  jazz e do rock, como se escutássemos por momentos uns Bad Plus ou uns EST em ácido. 

Reunindo três improvisadores de excepção e apontado por muitos como um dos projectos ao vivo com mais impacto e intensidade do momento, o trio de Ches Smith apresenta-se amanhã, dia 16, no Pequeno Auditório da Culturgest. A não perder.

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