A coragem é preguiça

A coragem é uma desobediência gratuita e deliciosa: mostra a enorme preguiça que todos temos de obedecer.

Faulkner escrevia quando estava bêbado e uma das melhores foi dizer que os ursos tinham tanto medo dos cobardes como dos heróis.

É mentira, claro. Todos os animais têm mais medo dos heróis. Por isso é que os gatinhos se põem espessos e gigantes quando são confrontados por um lobo. E não só isso: saltitam de ladecos, como se estivessem a semear sementes que se recusam a entrar na terra, para fazerem de loucos varridos. Funciona quase sempre.

A coragem é o segredo dos cobardes. Ser cobarde é ter medo e ser inteligente. Quem é que quer correr o risco de se magoar? Mas, por outro lado, quem procura fazer medo, só por ser maior e mais forte, é quase de certeza estúpido como as bestas que existiam antes de haver cérebros.

A coragem não é uma força: é uma jogada imprevisível. A coragem é um acto de crítica e de desilusão: "Desculpa lá, bem sei que te esforçaste muito, mas, por muito que te esforçasses, tenho de confessar-te que não houve um único momento em que tive medo de ti..."

A coragem é passar uma certidão sincera de ineficácia perante quem nos quis fazer medo. Fazer-nos medo é a mesma coisa que procurar exercer o poder: é assustar-nos e ameaçar-nos ao ponto de nos fazer alterar o nosso comportamento.

A coragem é uma desobediência gratuita e deliciosa: mostra a enorme preguiça que todos temos de obedecer.

A cobardia é uma palavra boa que os brutos e estúpidos, assustados pela inteligência e pela sensatez, fizeram tudo para tornar má.

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