Plano Estratégico de Transportes deixa de fora electrificação da linha do Algarve

Electrificação da linha poupava 400 mil euros por ano à CP. Operação já esteve prevista e com verba afecta, mas última versão “optimizada” do plano pela Infraestruturas de Portugal deixou-a cair. Autarcas reclamam.

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A Linha do Algarve mede 141 quilómetros, dos quais apenas o troço central de 40 quilómetros (Faro-Tunes) está electrificado Paulo Ricca (arquivo)

A electrificação dos troços Vila Real de Santo António-Faro e Tunes-Lagos, na linha do Algarve, permitiria à CP poupar 394.148 euros por ano, se as velhas automotoras diesel fossem substituídas por material circulante eléctrico. O PÚBLICO chegou a este resultado tendo em conta que uma UTE (Unidade Tripla Eléctrica) tem um custo de 38 cêntimos por quilómetro percorrido. As UTE são as automotoras que a CP tem para fazer o serviço regional no Algarve.

De acordo com os horários da CP, os seus comboios percorrem mensalmente, entre Lagos e Vila Real de Sto. António, 86.436 quilómetros em serviço regional. Este é feito com automotoras UDD (Unidades Duplas Diesel), que consomem 76 cêntimos por quilómetro percorrido (o dobro das automotoras eléctricas): o serviço custa à CP 65.691 euros por mês.

Mas se fosse assegurado por material eléctrico, custaria apenas 32.846 euros, o que significa que a CP pouparia por ano 394.148 euros.

A esta economia de custos, haveria ainda que acrescentar o que a empresa ganharia em aumento de receita por passar a ter um serviço com maior velocidade, fiabilidade e comodidade. Por outro lado, ao uniformizar a circulação em toda a linha com material eléctrico, a CP poderia criar comboios directos para Lisboa e para o Porto a partir de qualquer estação algarvia.

Nada impediria que o Alfa Pendular fosse a Olhão, Tavira ou mesmo até Vila Real. E tecnicamente seria mais fácil ter comboios directos de Lagos e Portimão para Lisboa (sem o transbordo em Tunes). A isto há ainda que acrescentar os impactos externos à própria empresa, como a redução do tráfego rodoviário na região, a menor probabilidade de acidentes e a redução de emissão de CO2.

A modernização da linha do Algarve chegou a estar inscrita no PETI (Plano Estratégico de Transportes e Investimentos) com uma verba de 55 milhões de euros a gastar até 2020. O objectivo era electrificar a linha e construir inclusive um ramal de Faro ao aeroporto. Mas a última versão do PETI, que foi “optimizado” pela Infraestruturas de Portugal (empresa que substituiu a Refer e a Estradas de Portugal), já não contempla qualquer investimento naquele corredor.

A linha do Algarve mede 141 quilómetros, dos quais um troço central de 40 quilómetros (Faro-Tunes) já está electrificado. Dependentes do diesel ficaram as duas pontas: Faro-Vila Real de Santo António (57 quilómetros) e Tunes-Lagos (44 quilómetros). A sua electrificação, sem considerar uma linha para o aeroporto, custaria 10,5 milhões de euros.

É por isso que o presidente da CP, Manuel Queiró, considera prioritária a electrificação da linha mais a sul do país. No início deste mês, em declarações ao PÚBLICO, o gestor considerou que a decisão da Infraestruturas de Portugal “é um jogo que vamos ter que jogar para ver como fica”.

A presidente da câmara de Portimão, Isilda Gomes (PS), alinha na reivindicação, para recuperar os 55 milhões de euros de investimento antes previsto. “Os algarvios, certamente, farão sentir junto de quem de direito o seu descontentamento”, afirma. A autarca, dirigente nacional do PS, considera que a electrificação da linha do Algarve não traz apenas vantagens económicas. “É decisiva para que haja uma verdadeira política de transportes públicos e mobilidade na região”.

No mesmo sentido o presidente da Câmara de Faro, Rogério Bacalhau, PSD, expressa um lamento. “Quando se fala em investimentos prioritários, já estamos habituados a que deixem cair o Algarve - só existe nos meses de Julho e Agosto”.

A construção do ramal da via-férrea da cidade ao aeroporto — que recebe mais de 6 milhões de passageiros por ano — chegou a ser equacionada antes da realização do Campeonato Europeu de Futebol (Euro 2004), mas não passou da intenção, num quadro em que se discutiam ideias para o futuro da região. Da parte da CP houve manifestações de interesse, mas a empresa então responsável pela infra-estrutura (Refer) não acompanhou essa vontade. 

Uma política de mobilidade, assente quase exclusivamente no transporte individual, diz Isilda Gomes, conduz aos “constrangimentos que são conhecidos na Estrada Nacional (EN 125) e aos impactos ambientais que tal situação acarreta”. Por seu lado, Rogério Bacalhau acrescenta que tentou minimizar a falta da ligação de comboio ao aeroporto, abrindo, em 2012, um concurso público para que esse percurso fosse servido de autocarro, mas acha que o problema tem de ser encarado a nível regional. “O Algarve necessita de um bom serviço de transporte ferroviário”, enfatiza.

A dispersão geográfica e a falta de articulação entre os diversos meios de transporte na ligação aos 16 concelhos fazem da região um “arquipélago” urbanístico. O presidente da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA), Elidérico Viegas, sublinha que o aeroporto de Faro é um dos poucos do mundo que não tem uma ligação ferroviária.

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