Costa vai surpreender

António Costa ainda nos vai surpreender muitas vezes.

Não precisamos de recuar a um passado distante, onde teve bons desempenhos em diversas pastas ministeriais. Nem necessitamos de recordar a surpresa da sua boa gestão na Câmara de Lisboa, em que decisões emblemáticas transformaram a cidade numa capital atlântica da Europa, visitada por um número crescente de turistas e onde os portugueses começam a gostar de viver.

Lembro a vitória sobre Seguro. Onde a direita e alguns socialistas descontentes vêem deslealdade, eu vejo a surpresa de um corajoso desafio democrático. Um líder de um partido tem, por definição, o seu mandato sempre em causa. A decisão de concorrer à liderança é uma manifestação de saúde da democracia partidária, desde que as regras sejam (como foram) definidas à partida. Costa teve uma vitória clara. Não consigo descortinar o alegado mau carácter do vencedor incontestado.

Onde infelizmente Costa não surpreendeu foi na campanha para as legislativas. A sua estratégia, demasiado contida, não trouxe o voto de muitos descontentes. Na altura, António Costa não parece ter percebido que são as emoções que conduzem à vitória, muito mais do que programas económicos delineados por especialistas. Assim, as vítimas da coligação de direita preferiram, em muitos casos, dar o seu voto a quem protagonizava a revolta; e muitos outros quiseram votar no que já conheciam.

No entanto, Costa depressa compreendeu como precisava de surpreender mais uma vez. E assim, logo na noite das eleições, surpreendeu ao não subscrever a tese de uma demissão anunciada. E continuou a surpresa com os acordos à esquerda, suficientes para viabilizar um governo do PS. Quando toda a direita criticava a presença do Bloco, PCP e Verdes no Governo, o imprevisto foi apresentar um governo de socialistas e independentes e matar esse fantasma. A capacidade de negociação de Costa e da sua equipa, demonstrada tantas vezes na Câmara de Lisboa, teve agora uma comprovação decisiva.

A última e grande surpresa foi a da constituição do Governo. Embora possa parecer excessivo em números (sobretudo em relação aos secretários de Estado), o executivo é de indiscutível qualidade. Nos sectores fundamentais, tem gente muito competente, como analistas insuspeitos têm referido. Nas pastas económicas, é evidente a capacidade técnica. Tiago Brandão Rodrigues terá de resistir à pressão dos sindicatos, mas está em posição de nos trazer a cultura da escola britânica, onde se premeia o mérito mas não se esquece o permanente combate ao insucesso escolar, sobretudo no 1.º ciclo. Adalberto Campos Fernandes é um defensor experiente do Serviço Nacional de Saúde, capaz de finalmente reformar os cuidados primários, tornar os hospitais mais independentes da burocracia e mobilizar de novo os profissionais. Manuel Heitor garante, para a Ciência, a recuperação de um rumo desbaratado nos últimos quatro anos, ao mesmo tempo que dedicará atenção aos problemas das universidades. Os ministros mais “políticos” asseguram a coesão do Governo para resistir às críticas que não faltarão ou para garantir êxito nas necessárias negociações.

Pela minha parte, ficarei contente com o que constituirá surpresa para muitos, mas que para mim será só confirmação: a equipa de António Costa vai governar bem em diversas áreas e, sempre consciente das dificuldades, trará melhores dias para o país. Para já, renovou a esperança, o que já é muito.     

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