Argentina vira à direita com Macrí, que quer suspender Venezuela do Mercosul

O novo Presidente tem uma agenda cheia em termos económicos, mas quer também realinhar o seu país na cena internacional. Vai pedir ajuda ao Brasil.

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Macri celebra a vitória com a mulher, Juliana Awada, e umas das filhas, Antonia Ivan Alvarado/Reuters
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Maurício Macri num momento da campanha JUAN MABROMATA/AFP
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Mauricio Macri venceu com 51,5% dos votos Ivan Alvarado/Reuters
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Festejos nas ruas de Buenos Aires JUAN MABROMATA/AFP
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Macri e a sua vice-presidente eleita, Gabriela Michetti EMILIANO LASALVIA/AFP
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Daniel Scioli confortado pela mulher, Karina Rabolini Marcos Brindicci/Reuters

A Argentina virou à direita e elegeu um novo Presidente: Maurício Macri, de 56 anos, que fundou um partido há pouco mais de dez anos e que foi eleito com a promessa de fazer mudanças. As primeiras reviravoltas podem ser já na cimeira do Mercosul, a 21 de Dezembro, quando Macri solicitar que se aplique a cláusula democrática para suspender a Venezuela, “devido aos abusos na perseguição aos opositores e à liberdade de expressão”, afirmou o Presidente-eleito argentino na primeira conferência de imprensa após serem conhecidos os resultados eleitorais.

Macri tomará posse a 10 de Dezembro, substituindo no cargo Cristina Kirchner, depois de ter derrotado, à segunda volta, por 51,4% contra 48,6%  Daniel Scioli, o candidato da continuidade kirchnerista. Será o momento do ponto final de 12 anos de kirchnerismo, uma derivação do peronismo – embora no Congresso Cristina Kirchner continue a ter maioria, e seja a aliança de Macri que está em desvantagem. Por isso, espera-se que o Presidente procure o apoio dos deputados leais ao centrista Sergio Massa, que ficou em terceiro lugar na primeira volta das presidenciais, em Outubro.

É também provável que comece a pôr rapidamente em prática algumas reformas, durante o período de graça inicial, dizem analistas. “Isto é uma grande mudança para a política argentina”, afirmou à Reuters Juan Cruz Dias, responsável pelo grupo Cefeidas. “Durante muito tempo a oposição, controlada pelo Partido Radical, que não tem tido sucesso, afirmou que era impossível governar tendo os peronistas na oposição. Macri tem uma grande oportunidade de demonstrar que eles estavam errados.”

O compromisso com a oposição venezuelana ficou demonstrado por Maurício Macri na noite das eleições – a seu lado esteve Lilian Tintori, a mulher de Leopoldo Lopéz, o opositor condenado a 13 anos de prisão. Tudo dependerá do que aconteça nas eleições venezuelanas de 6 de Dezembro e da reacção do Presidente Nicolas Maduro – que já disse que não aceitará uma derrota e que está preparado para assumir o poder militarmente.

Macri está convencido de que conseguirá o apoio de outros países da zona de comércio livre da Américas do Sul (Mercosul), que inclui Brasil, Paraguai e Uruguai, além da Argentina e da Venezuela, e ainda os países associados Bolívia, Chile. Colômbia, Equador e Peru. O apoio do Brasil seria fundamental, por isso o novo Presidente eleito argentino pensa ir a Brasília até antes de tomar posse, para tentar convencer Dilma Rousseff a suspender Caracas – algo que já aconteceu com o Paraguai, por causa do golpe de Estado parlamentar que afastou o Presidente Fernando Lugo.

Tempos agitados
Os próximos tempos na Casa Rosada (a sede da presidência argentina) prometem ser bem agitados. Mauricio Macri prometeu que a Argentina que vai liderar “não vai ser fruto de um iluminado que tem todas as soluções”, porque “isso não existe”. Uma afirmação contrária ao espírito do homem providencial do peronismo, mas ao mesmo tempo a oferta de uma via de diálogo aos kirchneristas, num país dividido em termos de opções políticas. O cerne do discurso de vitória foi a vontade de “unir todos os argentinos”, relata o jornal espanhol El País.

Macri, até agora presidente da câmara de Buenos Aires, não é peronista nem vem da tradição do Partido Radical – embora esta formação se tenha juntado à sua aliança eleitoral este ano – o que, salienta o diário espanhol, é uma novidade em relação aos últimos 70 anos. É o terceiro Presidente não-peronista desde o fim da ditadura militar, em 1983 – mas os outros dois, Fernando de La Rua e Raul Alfonsin, ambos do Partido Radical, não conseguiram chegar ao fim dos seus mandatos, por causa de profundas crises económicas.

Macri defende políticas liberais e define-se como “desenvolvimentista”. Espera-se que mantenha algum proteccionismo económico e que seja cauteloso nas reformas, para não ter choques frontais com os sindicatos.

O objectivo, difícil, é reformar a economia sem prejudicar os mais pobres. Pelo menos é o que ele tem prometido: “Temos dito, desde a Tierra del Fuego no Sul até Jujuy no Norte que temos de construir uma Argentina com pobreza zero, e é o que vamos conseguir, juntos”, afirmou aos seus apoiantes, no domingo à noite.

Prometeu desmantelar os controlos de capitais criados pela sua predecessora para conquistar a confiança dos investidores estrangeiros e deixar entrar no país as divisas estrangeiras de que a Argentina está tão necessitada, e eliminar as taxas sobre as exportações de milho e trigo, e gradualmente reduzir as tarifas sobre a soja, impostas por Kirchner, que entrou em conflito com os agricultores. Mas uma consequência possível das suas reformas pode ser uma grande desvalorização da moeda – o cataclismo com que os kirchernismo metiam medo aos eleitores.

Outras promessas – que exigem um cumprimento urgente – incluem a restauração da independência do banco central e dos tribunais, a luta contra a corrupção e reformar profundamente os serviços nacionais de estatística, em quem ninguém confia.

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