Smartwatches crescem em Portugal, mas mercado ainda é de nicho

Vendas em Portugal deverão crescer quase cinco vezes este ano, mas o valor está muito longe do dos telemóveis. Os relógios inteligentes ainda precisam de tempo.

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Marcas de telemóveis e tablets estão também a apostar nos relógios inteligentes EDGAR SU/REUTERS

Para Bruno Santos, 31 anos, um relógio inteligente significou deixar de atender alguns telefonemas sem saber quem estava a ligar. “Como sou motard, apesar de ter um auricular de alta-voz, tinha de atender telefonemas às cegas”, explica.

Agora, basta rodar o pulso para ver de quem é a chamada. É, como o próprio reconhece, uma razão “muito específica” para se comprar um aparelho deste género, cujas vendas ainda são pequenas, mas que as marcas têm feito grandes esforços para promover.

Há relógios inteligentes — ou, mais frequentemente, smartwatches — para vários gostos e muitos preços. Alguns, mais básicos, são de marcas menos conhecidas, como são os casos da Pebble e da MyKronoz, esta uma empresa Suíça, a terra por excelência dos relógios.

Vários outros são de empresas de renome, que nos últimos anos têm feito dinheiro a vender telemóveis e tablets, e que querem introduzir mais um ecrã — desta feita, bem pequeno — no quotidiano dos consumidores.

Muitos destes relógios podem ser emparelhados com um telemóvel. Torna-se possível receber notificações — de chamadas, SMS, emails, redes sociais — e até atender telefonemas ou enviar respostas simples. Alguns incluem funcionalidades como a meteorologia e aplicações de desporto e saúde.

Os modelos mais sofisticados — como é o caso do Apple Watch e dos relógios com o sistema Android Wear — permitem instalar aplicações. Isto significa que as funcionalidades não são limitadas àquilo que o fabricante determina, mas podem crescer à medida que surjam novas aplicações, o que foi um factor crucial no sucesso dos smartphones.

Estes pequenos computadores de pulso têm uma aura futurista e estão também a ser comercializados como acessórios de moda. Tipicamente, os preços oscilam entre as muitas dezenas e as várias centenas de euros. Mas o apelo para os consumidores ainda é relativamente limitado.

No ano passado, foram vendidos em Portugal 7800 smartwatches, de acordo com números dados ao PÚBLICO pela analista IDC, que define este produto como relógios onde podem ser instaladas aplicações (se forem somados os relógios mais básicos e as pulseiras desportivas, o número dos chamados wearables sobe para 34 mil unidades ao longo de 2014).

Este ano, o mercado português deverá crescer quase cinco vezes, para um total de 36 mil smartwatches vendidos. É uma subida inferior à média europeia, onde as vendas deverão aumentar sete vezes até Dezembro, atingindo 10,5 milhões de unidades.

Os números são muito inferiores aos de telemóveis ou mesmo tablets. O analista da IDC Francisco Jerónimo defende que é preciso tempo para uma nova categoria de produto atingir grandes volumes de venda. E dá como exemplo a história do iPhone, cujo primeiro modelo surgiu em 2007: “Temos de dar tempo. Quando lançou o iPhone, a Apple também demorou anos a vender milhões de telemóveis por trimestre”.

Francisco Jerónimo nota ainda que estes produtos estão a chegar numa altura em que o mercado de smartphones já está maduro e o crescimento de vendas não é explosivo como há uns anos: “Quando o negócio dos smartphones chega a um ponto em que o crescimento vai ser à custa da diminuição das margens, os fabricantes começam à procura de alternativas para compensar essa queda. Estão a procura de aumentar as receitas, nem que seja de forma marginal”.

Do lado dos fabricantes, parece haver optimismo. “É difícil prever quando é que este mercado vai explodir, mas algum dia irá acontecer”, afirma Nuno Parreira, responsável pelos produtos móveis na Samsung Portugal.

A empresa lançou recentemente um novo modelo de relógio — o Gear S2 — e montou um vistoso espaço de demonstração em frente à Gare do Oriente, uma zona movimentada de Lisboa. A marca pretende também usar os relógios para impulsionar a venda dos seus smartphones e vai vender pacotes com os dois aparelhos. “Neste momento, o wearable ainda é companhia do smartphone”, diz Parreira.

Na mesma linha, o responsável da Huawei em Portugal,  Pedro Ferreira, afima que a comercialização de relógios “pode eventualmente ajudar as vendas do smartphone”, uma vez que, “por norma os consumidores gostam de ter produtos que são conectáveis e que sejam da mesma marca”.

Miguel Figueiredo, 39 anos, gestor de projectos de informática, encaixa neste perfil. Começou por ter um relógio Android, mas vendeu-o e comprou um Apple Watch para o poder emparelhar com o iPhone que já tinha. “A escolha do modelo foi determinada pelo telemóvel”, diz. E reconhece que esta não foi uma compra ditada pela necessidade. “Não é uma necessidade. É mais uma [questão de] utilidade”.

Pedro Ferreira diz que os resultados em Portugal têm sido “muito animadores” para a marca chinesa, tanto nos relógios como nas pulseiras desportivas, mas admite que não se trata de um segmento com grande dimensão: “O nosso mercado ainda é muito pequeno para conseguirmos comparar com outros mercados, mas podemos dizer que os portugueses são early adaptores”.

Os relógios inteligentes têm apostado em vários tipos de consumidores. Há o segmento dos entusiastas da tecnologia e o dos praticantes de desporto, entre os quais as aplicações que medem distâncias percorridas, passos dados, ritmo cardíaco e outros parâmetros têm ganho adeptos. E, tal como os relógios tradicionais, estes novos dispositivos são também um acessório de moda.

Muitas marcas, atentas aos gostos dos utilizadores, optaram por formas redondas nos seus modelos mais recentes, permitindo também que os utilizadores tenham um ecrã com ponteiros e números que simulam um relógio tradicional. A Apple tem modelos que custam vários milhares de euros e fez este ano uma parceria com a marca de luxo Hermès.

As empresas estão também com um olho posto na Internet das Coisas, um conceito em que todo o tipo de aparelhos e estruturas (de lâmpadas a janelas, de carros a frigoríficos) estão ligados em rede, sendo capazes de comunicar uns com os outros e de terem alguma inteligência artificial. Neste mundo, um relógio surge como um potencial dispositivo de comando, mais conveniente que um telemóvel ou tablet. E há ainda os usos profissionais: por exemplo, para quem está a operar uma máquina com ambas as mãos, a informação no relógio — ou em óculos, como os que o Google desenvolveu — é mais simples de consultar do que num computador ou tablet.

“Este vai ser um mercado de vários nichos”, observa Francisco Jerónimo, da IDC. “Há o desporto, a vertente empresarial… Já vemos marcas de roupa a lançar produtos conectados”.

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