Jamie Vardy, o goleador que veio do nada

O avançado do Leicester City, actualmente o melhor marcador da Premier League, jogava na quinta divisão há três temporadas.

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Jamie Vardy Alex Morton/Reuters

Fazer um turno de 12 horas na fábrica e jogar futebol à noite com uma pulseira electrónica. Rejeição precoce e vontade de desistir. Segunda oportunidade, redenção e glória. Podia ser matéria para uma canção de Bruce Springsteen, a remeter para um início de vida cinzento, numa rotina proletária sem futuro, mas que se transforma numa história de perseverança e final feliz. Esta é a história de Jamie Vardy, o avançado do Leicester City que há três anos jogava na quinta divisão de Inglaterra e que é, actualmente, o melhor marcador da Premier League e já com quatro internacionalizações pela selecção inglesa.

Histórias como a de Jamie Vardy são cada vez mais raras numa altura em que o talento precoce, pelo desenvolvimento do “scouting”, dificilmente passa despercebido. Como tantos rapazes, Vardy tinha um sonho, mas, aos 16 anos, deixou de o ter quando o seu clube do coração, o Sheffield Wednesday, o dispensou aos 16 anos por ser demasiado baixo. “Foi um momento difícil e deixei de jogar durante uns tempos porque pensava que nunca iria ser profissional”, conta o avançado. Na altura, calcula Vardy, teria cerca de 1,40m de altura, mas, um mês depois de ter sido dispensado, teve um surto de crescimento. “De repente, cresci cerca de 20 centímetros.”

Vardy continuou a estudar e foi trabalhar para uma fábrica de próteses de fibra de carbono. Não demorou muito até voltar a jogar futebol, numa equipa de amigos, e, pouco depois, foi parar às reservas do Stocksbridge Park Steels, uma equipa amadora de Sheffield do oitavo escalão. E aqui Vardy começou a marcar golos. E a ganhar dinheiro com o futebol. Trinta libras por semana foi o seu primeiro ordenado como futebolista para complementar o ordenado que ganhava a trabalhar 12 horas por dia na fábrica de próteses.

Durante seis meses, teve uma dificuldade suplementar. Usou uma pulseira electrónica no tornozelo por se ter envolvido num confronto num pub, conta o futebolista, a defender um amigo com deficiência auditiva. Tinha de cumprir um horário de recolher obrigatório, o que fazia com que, por vezes não pudesse treinar, e, nos jogos fora de casa, tinha de sair ao intervalo para cumprir o horário. Com todas estas limitações, Vardy conseguiu destacar-se e, em 2010, deu o salto para o Halifax, da Northern Premier League (sétima divisão), subindo para a Conference North (quinta divisão) no ano seguinte, para representar o Fleetwood Town.

Vardy ia subindo degraus e a sua eficiência goleadora mantinha-se. Uma época no Town foi o suficiente para chamar a atenção do Leicester City, da segunda divisão inglesa, que pagou por ele um milhão de libras, verba recorde para um jogador amador. Duas épocas depois, os seus golos foram instrumentais para a promoção da equipa da Midlands à Premier League.

O seu primeiro ano entre os grandes do futebol inglês foi relativamente discreto, mas suficiente para lhe valer uma chamada à selecção inglesa. É na segunda época de Premier Leagu que Vardy está a fazer história, já com 12 golos marcados, a alimentarem a excelente carreira do Leicester de Claudio Ranieri, terceiro classificado apenas com menos um ponto que os dois primeiros, Manchester City e Arsenal. Se marcar na próxima jornada frente ao Manchester United, será o décimo jogo consecutivo de Vardy a fazer golos, o que igualaria o recorde estabelecido por Ruud van Nistelrooy em em 2002-03.

Aos 28 anos, 12 depois de ter sido rejeitado pelo Wednesday, Vardy continua a não ser um avançado muito alto (1,78m de altura), mas faz da sua rapidez e capacidade de trabalho as suas grandes armas. Talvez não chegue para ser um avançado de referência numa grande equipa europeia – os tablóides ingleses já o puseram na lista de desejos do Real Madrid – mas é muito provável que seja um dos eleitos de Roy Hodgson para o Euro 2016. Jamie Vardy, o “working class hero”, nasceu para correr, como canta Bruce Springsteen num dos seus maiores êxitos. “Born to run”.

* Planisférico é uma rubrica semanal sobre histórias de futebol e campeonatos periféricos

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