Hambúrgueres vegetarianos sim, mas com sangue!

Quando todos pensávamos que as possibilidades no âmbito das fake meals estavam esgotadas (ou perto disso), eis que surge uma nova realidade promissora

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Impossible Foods/ DR

A expressão ‘fake meal’ – ou ‘refeição falsa’ – é utilizada entre vegetarianos para designar um produto de origem vegetal que procura ter a textura e sabor da carne. Das singelas alheiras vegetarianas que encontramos nos hipermercados ao Quorn, há um vasto mundo de paladares “falsos” por descobrir.

Quando todos pensávamos que as possibilidades no âmbito das fake meals estavam esgotadas (ou perto disso), eis que surge uma nova realidade promissora. A Impossible Foods criou um hambúrguer vegetariano com nada mais, nada menos do que sangue. Como assim? Calma, gentil leitor, veja este vídeo e todas as dúvidas ficarão esclarecidas. Não se trata de sangue animal, mas sim de um líquido sintetizado a partir de Hemo encontrado em raízes de plantas.

Entre os vegetarianos com motivações éticas ou ambientais existem duas posições relativamente às fake meals. Por um lado, há aqueles que não compreendem, acham esquisito querer comer coisas destas e, quando instigados, insistirão “se queres comer carne, come!”. Por outro lado, há aqueles consideram as fake meals apenas uma forma de enriquecer as suas opções de degustação e que estão ansiosos por provar um destes hambúrgueres ensanguentados. Incluindo-me (orgulhosamente) no segundo grupo, pretendo mostrar que a posição dos “vegipuritanos” está errada. Em prol da coerência, como de seguida argumentarei, eles devem mudar de postura e comer todas as fake meals que puderem.

Curiosamente (ou não), o público-alvo da Impossible Foods não são os vegetarianos, mas sim, como indicam no seu site, os “meat-lovers” (“amantes-de-carne”). Na pequena reportagem do Wall Street Journal, aliás, Patrick Brown (Director Geral da empresa) assume que o estímulo ao consumo de produtos alternativos tem como objectivo contribuir para a redução da emissão de gazes poluentes por parte da indústria da carne.

Ora, a argumentação por detrás do vegetarianismo é, na maioria dos casos, a seguinte: Quanto menos pessoas consumirem produtos de origem animal, menos clientes terá a indústria da carne e, por conseguinte, a sua produção tenderá a ser menor. Menor produção, por seu turno, significa (a) menos animais em sofrimento ou (b) menos poluição (a escolha depende do tipo de motivação). Quanto menos carne for consumida, portanto, melhores as consequências. Logo, é um dever moral não consumir carne e, a fortiori, incentivar a adopção de uma dieta vegetariana.

Considere-se agora um argumento paralelo. Quanto mais pessoas consumirem produtos de origem vegetal semelhantes à carne, mais clientes terão as empresas que os produzem. Essas empresas produzirão mais e, com maior capital financeiro, poderão aumentar a sua rede de distribuição e chegar a mais clientes. Consequentemente, serão cada vez mais os consumidores de carne a ter acesso fácil a uma alternativa sustentável que não diminui o seu prazer. Escolhendo-a, eles estarão a contribuir para (a) evitar o sofrimento de animais ou (b) reduzir o impacto ambiental da indústria da carne. Logo, e eis o ponto-chave, é um dever moral consumir fake meals.

A assimetria não é perfeita e ambos os argumentos estão simplificados. Contudo, não parece coerente aceitar o primeiro e rejeitar o segundo. Os vegetarianos que aqui estão sob fogo têm de, pelo menos, reconhecer que ao comer fake meals a minha acção é boa, e guardar para si os juízos puritanos infundados.

Venham pois os hambúrgueres vegetarianos! Que tenham tanto “sangue” quanto possível e que sejam tão saborosos quanto prometem ser!

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