A próxima jogada de António Costa?

O que levou estes partidos a subscreverem estes entendimentos com o PS deve-se à fragilidade do PS e ao facto de que cada força política acredita que vai ganhar com isso, ou não vai perder.

É um PS profundamente fragilizado, com a sua elite histórica em silêncio sepulcral, que acaba de assumir uma responsabilidade para qual não tem capacidade de resposta. Mas isso importa?

O líder do PS disse ao país que rejeitava o Governo do PSD-CDS porque tinha um programa alternativo de governo com um apoio maioritário parlamentar para quatro anos.

Como eu pensava, não se construiu nenhum acordo substantivo e durável. Apenas se estabeleceram as cedências do PS para obter um apoio mínimo do BE, PCP e PEV para se dar posse a um governo minoritário do PS, até que o PS possa reatar os entendimentos mínimos com o PSD e CDS para enfrentar Bruxelas.

Mas era expectável mais? Para mim isso era impossível, porque a única coisa que mudou realmente no quadro político interno é ao nível do PS, hoje talvez mais fragilizado ainda do que depois da era Sócrates. Isso, sim, é que pode alterar o quadro político no país, e não uma qualquer mudança ao nível dos partidos à sua esquerda, o que muitos socialistas parecem não entender.

A primeira conclusão desta realidade é que, ao contrário dos discursos complacentes, não vai haver legislatura de quatro anos. Porquê?!

Ora, porque nenhum dos quatro partidos tem essa intenção!

O que levou estes partidos a subscreverem estes entendimentos com o PS deve-se à fragilidade do PS e ao facto de que cada força política acredita que vai ganhar com isso, ou não vai perder. No entanto, com as agendas políticas de cada um, e os compromissos internacionais de Portugal, não é possível ganharem todos ao longo duma legislatura que já se sabe ser difícil.

Em boa verdade, o PCP preferiria não ter sequer assinado nada, mas foi pressionado pela subida do BE, que constitui o seu pesadelo actual, pior do que o PS!

Aqui chegados, a questão que se deve colocar é a seguinte: se quem mais cedeu politicamente foram António Costa e o PS, o que tem o líder do PS preparado para não ser apanhado pelo BE e PCP? Ele é ambicioso, mas não é tolo!

Naquele grupo todos sabem que ninguém pode confiar em ninguém e que não podem ganhar todos numa legislatura que dure quatro anos. Logo, o que agir primeiro, de uma forma aparentemente credível, será o vencedor!

Para António Costa há apenas um cenário que verdadeiramente lhe interessa em termos de futuro. Voltar a disputar as eleições e ganhá-las com maioria absoluta. Mas para isso tem de preparar o palco e os portugueses. Se o conseguir, entra para a história como um político de grande estatura e pode sonhar com a Presidência da República dentro de dez anos.

Qual é a jogada mais previsível do líder do PS? Há muitos cenários possíveis, mas há aqueles que se coadunam mais com a natureza do actual líder do PS.

O Orçamento para 2016 não provocará ondas. Mas alguma coisa irá acontecer na discussão do Orçamento de 2017, ou, o mais tardar, no de 2018, porque não será possível escapar a Bruxelas… e aos défices acordados para os próximos anos! Vai ser necessário cortar vários milhares de milhões de euros de despesas e/ou aumentar os impostos. E num ou noutro caso as tensões entre os quatro parceiros de esquerda vão subir. Essa possibilidade está praticamente inscrita nos acordos e verbalizada em comentários vários.

Quando se chegar a esse momento, o primeiro-ministro fingir-se-á agastado com os seus parceiros, e, numa jogada há muito pensada, voltar-se-á, in extremis, para o PSD e o CDS em busca de apoio, que obviamente espera que lhe seja negado. O líder do PS não deixa de repetir que conta com a responsabilidade do PSD e CDS passada a presente crispação, mas precisa justamente dessa recusa, que, sendo censurável, não deixará de ser compreensível.

E monta-se assim o palco para a derradeira jogada do líder do PS.

Diante do BE, do PCP mais o PEV, três parceiros intransigentes na partilha de alguns dos custos da mitigação da austeridade, e diante do PSD e CDS, que se fecham, quando está em causa o interesse nacional face a exigências externas, o primeiro-ministro pede a demissão e eleições antecipadas, dizendo ao país que não encontra no BE, no PCP e no PEV a solidariedade que lhes ofereceu o PS para combater a austeridade, que eles apenas quiseram o PS para medidas populares e que afinal nada mudaram em relação ao seu passado. Depois criticará a irresponsabilidade do PSD e CDS, que se revelam incapazes de superar a derrota parlamentar de 2015, colocando o seu azedume acima do interesse nacional.

Neste quadro, resta-lhe pedir aos portugueses que ajudem o PS a não depender de outras forças políticas para prosseguir a sua luta contra a austeridade, que naturalmente exige compromissos sérios tanto no plano interno como externo.

O líder do PS parte então para novas eleições, não como consequência duma moção de censura traiçoeira, mas por sua iniciativa e decisão, esperando que o país se solidarize com ele.

Acrescentará ainda uma chantagem: ou os portugueses dão uma maioria absoluta ao PS para prosseguir no combate sustentado e responsável à austeridade, ou então não assumirá novamente um governo minoritário.

E como que por ironia do destino pode até acontecer que aquele que chegou a primeiro-ministro na condição de derrotado venha a deixar o mesmo cargo como vencedor, sem maioria absoluta, mas já com o almejado título de ex-primeiro-ministro, suficiente para lhe reabrir o futuro na política e nos negócios!

Economista, militante do PS

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