1379 anos para recolocar refugiados

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Nos últimos dez meses, 580 mil refugiados chegaram à Grécia vindos da Turquia. Só em Outubro foram 218 mil, um recorde. Vemos as imagens todos os dias. Dos que chegam vivos a rir, dos que chegam vivos a chorar, dos que chegam mortos. Alguns morrem a 20 metros da praia.

No domingo passado morreram quatro bebés e duas crianças. Na segunda morreram dez adultos. Na terça morreram três crianças e dois homens. Só esta semana morreram 90 refugiados no mar Mediterrâneo.

Agora — haja rigor —, a Grécia tem menos 30 refugiados para cuidar. O plano europeu de 780 milhões de euros para esta crise humanitária foi “inaugurado” na Grécia esta quinta-feira. Seis famílias apanharam um avião de Atenas para o Luxemburgo. São sírios e iraquianos. Foram os primeiros de meio milhão espalhados pela Grécia. Alguns deles estão nesta fotografia, que escolhemos como “imagem da semana”.

Estávamos há tanto tempo à espera que a operação de recolocação de refugiados começasse no país que tem estado na linha da frente desta crise, que a partida dos primeiros 30 teve honras de Estado.

O primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, o presidente do Parlamento Europeu, Martin Schulz, e o ministro dos Negócios Estrangeiros luxemburguês, Jean Asselborn, foram todos ao aeroporto. Tiraram selfies e trocaram abraços.

A Europa, apesar de tudo rica e poderosa e com uma população de 700 milhões de pessoas, está a conseguir finalmente passar do papel à prática. O compromisso é recolocar 160 mil pessoas “em evidente necessidade de protecção internacional”. A maior parte vem de três países em guerra: Síria, Iraque e Eritreia. Segundo a ONU, dos 741 mil refugiados que chegaram à Grécia e a Itália, mais do que um em cada dois são sírios.

A Grécia comprometeu-se em dar asilo temporário a 50 mil (Portugal apenas 4574). Faltam 530 mil, aos quais se deve subtrair, claro, 30. Dos 200 mil que estão em Itália, foram recolocados 86 — na Suécia. Esse é para já o balanço da implementação do plano europeu: 86+30. Podia ser pior. Tsipras diz que isto “é uma gota no oceano, mas que a gota vai tornar-se um rio”.

É bom que assim seja. A manter-se este ritmo de ineficiência, iríamos precisar de 1379 anos para recolocar os 160 mil refugiados que a União Europeia se comprometeu a apoiar. E não resisto: se pensarmos nos 741 mil refugiados que estão na Grécia e em Itália à espera de algum futuro, seriam necessários 6388 anos. O tempo suficiente para os deuses da nossa era serem dados como extintos e novos deuses dados como criados.

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O comissário europeu Dimitris Avramopoulos, o primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, o presidente do PE, Martin Schulz, e o ministro luxemburguês dos Negócios Estrangeiros, Jean Asselborn, com o grupo de refugiados iraquianos no aeroporto de Atenas ANDREA BONETTI/AFP
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