Sakharov, um prémio contra os ditadores

Na defesa dos direitos humanos, a única fronteira são os ditadores. É o que mostra o Prémio Sakharov.

Depois de o Prémio Sakharov ter distinguido, em anos consecutivos, acções em prol dos direitos das crianças e das mulheres, centra-se este ano na liberdade de expressão e de pensamento, que está a sua génese. E a escolha foi certeira. Porque o blogger Raif Badawi, o premiado deste ano, ainda se encontra preso por ousar exprimir no seu blogue opiniões sobre a opressão religiosa no seu país, a Arábia Saudita. Criticou a “mentalidade árabe da ditadura e da segurança” e ridicularizou os que recusam tudo o que é ocidental, acusando-os de “inabilidade para lidar com a vida”. Quase lhe custou a vida: acusaram-no de apostasia, punível com a morte. Anulado o processo, não escapou a outra sentença, severa e brutal: mil chicotadas, uma multa de 266 mil dólares, dez anos de prisão e mais dez sem poder sair do país. As primeiras 50 chicotadas foram-lhe aplicadas em público, no meio de uma praça de Jiddah, no dia 9 de Janeiro deste ano. As restantes, sabe-se agora, poderão ser retomadas em breve, já que o Supremo Tribunal de Justiça saudita confirmou em Junho a sentença, ignorando apelos e protestos à escala mundial. Com a atribuição do Prémio Sakharov a Raif Badawi, o Parlamento Europeu quer não apenas defender um homem que “defendeu corajosamente as suas ideias”, e de forma pacífica, como também apontar um dedo acusador à bárbara “justiça” de um país onde continuam a ser chicoteadas, amputadas e executadas pessoas em público. Como pode um país ser aliado na luta contra os degoladores do EI, se ele próprio faz degolar prisioneiros, em nome de uma “justiça” também bárbara e cruel? É isto que o Prémio Sakharov vem sublinhar. A Arábia Saudita dirá que é uma ingerência nos “seus” assuntos, tal como o regime angolano fez no caso Luaty Beirão. Pois estas “ingerências”, pacíficas, são uma obrigação mundial. Na defesa dos direitos humanos, a única fronteira são os ditadores.

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