Cuba como Agnès Varda a viu

As quatro mil fotografias que a cineasta belga fez em 1962, documentando a revolução cubana ainda no seu esplendor, vão ser mostradas pela primeira vez no Centro Georges Pompidou.

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“Levei uma Leica, rolos e um tripé porque tinha este projecto a germinar. Achei os cubanos pessoas incríveis e a forma do seu socialismo feliz e espantosa. Em Cuba podia sentir-me cubana, não me era preciso compreender primeiro. E ri-me imenso. O folclore, o ritmo de vida, o calor… Voltei com quatro mil fotografias.”

Foi este acervo de quatro mil imagens, recolhido pela cineasta belga Agnès Varda na viagem que realizou a Cuba no final de 1962, pouco tempo passado sobre a revolução liderada por Fidel Castro, que o Centro Georges Pompidou recentemente adquiriu. E é com ele que o museu parisiense está agora a organizar a exposição Varda/Cuba, que vai ser inaugurada a 11 de Novembro na sua Galeria da Fotografia – para ser visitada até 1 de Fevereiro.

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“O folclore, o ritmo de vida, o calor. Voltei com quatro mil fotografias”, disse a cineasta acerca da viagem que fez à Cuba pós-revolucionária — o acervo completo chega agora ao Pompidou

Numa entrevista aos Cahiers du Cinéma em 1965 – citada num catálogo editado pela Cinemateca Portuguesa quando, em Junho de 1993, esta lhe dedicou a retrospectiva e a exposição Os filmes e as fotografias –, Agnès Varda fala da felicidade que sentiu ao viver esses tempos pós-revolucionários. E também do documentário que realizou a partir da sua viagem, a que chamou Salut les Cubains (1963) – numa referência a uma célebre canção de Gilbert Bécaud e a um programa de variedades da rádio francesa do final da década de 50.

O filme é uma montagem de perto de 30 minutos realizada quase exclusivamente com essas fotografias com que Varda (que partilha a narração off com Michel Piccoli) regista o seu olhar sobre a revolução cubana – recorde-se que, por esses anos, muitos outros artistas e intelectuais franceses (e belgas) foram (vi)ver de perto a Revolução, entre os quais  Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir, Marguerite Duras e Chris Marker (que, de resto, colabora no documentário), Henri Cartier-Bresson e Michel Leiris…

Salut les Cubains, estreado em 1964, haveria de conquistar uma medalha de bronze no Festival de Cinema Documental de Veneza desse ano. O filme vai voltar a ser agora exibido no centro da exposição do Centro Pompidou, que dará a ver uma selecção ampliada das fotografias feitas por Agnès Varda nesses anos em que o regime de Fidel Castro ainda vivia em estado de graça. E mostrará também que, mesmo se riu “imenso” e se sentiu “cubana”, a documentarista não deixou de registar com o seu olhar alguma distanciação, e mesmo uma certa “crítica face aos impasses e às contradições do regime”, nota o comunicado da exposição do Centro Pompidou, citando como exemplo a imagem extraordinária de Fidel Castro fotografado como uma espécie de “anjo” enquadrado sobre umas asas de… pedra.

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