“Não é um rebuçado, é uma questão de justiça”

Família Baptista tem quatro filhos e vai poupar 120 euros no IMI Familiar. “As pessoas fazem contas a tudo”, diz a mãe Augusta

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A família Carapeto Rocha vai ter um desconto de 20% no IMI Paulo Pimenta

Para o ano, o IMI de 352 euros da família Carapeto Rocha, que vive em Santa Maria da Feira, terá um desconto de 20% e ficará mais barato 70 euros. “Não é um incentivo à natalidade, é uma ajuda”, comenta Susana Rocha. “Não é um rebuçado, é uma questão de justiça”, acrescenta. Susana e Vítor têm três filhos. Tiago de 21 anos que estuda engenharia informática, Luísa de 18 anos que está no curso de design e Leonor de 10 que frequenta o 5.º ano. Quando a família estica tudo se adapta. A casa, os hábitos, as despesas. Um carro maior, mais um frigorífico, transformar o escritório num quarto, aderir à electricidade bi-horária, poupar na rega do jardim, usufruir das vantagens de pertencer à Associação Portuguesa de Famílias Numerosas. As máquinas são usadas com rigor, os banhos mais controlados.

O orçamento familiar tem de ser gerido com rigor quando só o pai, técnico de equipamento dentário, trabalha. Susana Rocha, que foi assistente dentária e que agora é mãe a tempo inteiro, acredita que o incentivo à natalidade passa por mudar mentalidades, a começar nos locais de trabalho. “Mais medidas para apoiar as mães, como o trabalho a tempo parcial. Uma mãe que trabalha e que tem um, dois, três ou mais filhos tem uma carga de stress em cima que não é brincadeira.” “É comum dizer-se que os miúdos criam-se, mas não é bem assim. A nossa sociedade depende da maneira como são educados, do tempo que os pais têm com os filhos em casa. Se chegam a casa com 30 mil coisas para fazer nem conseguem olhar para a carinha deles”.

A família Baptista, que há cerca de sete anos mudou-se de Lisboa para Esmoriz, Ovar, também analisa todas as parcelas das despesas. Augusta e Pedro têm quatro filhos: Bárbara de 21 anos que estuda psicologia; Vasco de 18, jogador da selecção de rugby, que estuda desporto; Frederico de 13 anos que está no 8.º ano; e Salvador de quatro anos que está na creche. Os quase 600 euros de IMI que pagam pela moradia de dois andares, com quartos para todos e jardim, emagrecerá 120 euros. Augusta está satisfeita. “Em Lisboa, morávamos numa casa com quatro assoalhadas, na altura éramos cinco e pagávamos o mesmo IMI que os vizinhos que eram dois e viviam numa casa igual. Não era justo, dividíamos o mesmo espaço por cinco pessoas”, recorda.

“Qualquer benefício para as famílias é muito bom”. O IMI Familiar, na sua opinião, poderá ajudar a aumentar a natalidade. “As pessoas fazem contas a tudo”. Augusta fala com conhecimento de causa. Mãe a tempo inteiro, depois de ter sido secretária de administração de uma multinacional de cosmética capilar, sabe onde estão os produtos mais baratos, faz compras à lista, está atenta às promoções, trata da costura e da decoração da casa, reaproveita móveis, compra tecidos para fazer mantas, cortinas, é a cabeleireira lá de casa. Uma vez por mês, o casal senta-se, sem filhos por perto, para fazer contas. O salário do marido, que trabalha na área financeira, tem de chegar para tudo. E chega. Os filhos mais velhos têm bolsa para os estudos, os livros do Frederico vieram da prima, as roupas circulam por irmãos, primos, amigos. Investiram em painéis fotovoltaicos e, por isso, não recebem factura da luz. E nos seguros dos carros, a pestana está sempre aberta para ver quais os melhores preços no mercado. “Sou muito prática, se há descontos para quem tem mais filhos é preciso aproveitá-los”. Essa atenção, em seu entender, devia estender-se às consultas de saúde, à compra de manuais e material escolar, ao IRS para quem tem mais de três filhos.  

Ovar aderiu ao IMI Familiar com descontos de 10, 15 e 20% para famílias com um, dois, três ou mais filhos respectivamente. São abrangidas cerca de 12 mil famílias, num concelho com 55 mil habitantes, e a câmara local abdica de 376 mil euros por ano. A autarquia dá ainda um apoio de 75 euros anuais a famílias com três ou mais filhos e suporta os custos com os manuais escolares do 1º ciclo as todas as crianças do concelho. Nas tarifas de água, há descontos para várias composições de agregados até sete elementos. Salvador Malheiro, presidente da Câmara de Ovar, não hesitou em avançar com os descontos máximos. O conforto financeiro permite que o faça, mas não é só por isso. “Somos sensíveis às dificuldades das pessoas num período complicado na vida de todos”, refere, lembrando que a medida se enquadra “no novo paradigma do poder autárquico” mais centrado em projectos imateriais.

No concelho da Feira, o IMI Familiar abrange cerca de 12.500 famílias, num município com 140 mil habitantes, e representa uma diminuição da receita municipal que ronda os 200 mil euros anuais. Emídio Sousa, presidente da câmara, olha para a baixa taxa da natalidade como um dos maiores problemas do país. A partir deste mês, e na renegociação do contrato com a concessionária dos serviços de água e saneamento, os agregados com cinco ou mais pessoas podem pagar menos na factura de água.  

Para o autarca social-democrata, o poder central volta a sobrecarregar as autarquias. “O Governo tem abusado dos benefícios fiscais das autarquias. Os ‘brilharetes” que tem feito na redução da despesa são à custa das receitas de impostos dos municípios”. O IMI Familiar é um exemplo. Na sua opinião, os incentivos à natalidade deviam ser feitos através dos impostos sobre o trabalho, no IRS, ou na participação do IVA.

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