Ruy Belo: uma poesia que gostava de ir ao cinema

Sessão especial no Monumental, em Lisboa, celebra o profundo impacto do cinema na obra do poeta de Esplendor na Relva.

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TERESA BELO

É uma das cenas mais comovedoras da história do cinema. A jovem Deanie Loomis (Natalie Wood), que começa a perceber que os tempos em que nada parecia poder ameaçar o seu intenso, inocente e correspondido amor por Bud (Warren Beatty) já passaram e não irão voltar, é obrigada pela professora a ler alto, na aula, o excerto dum célebre poema de William Wordsworth em que se diz que apesar de nada poder trazer de volta “a hora do esplendor na relva, da glória na flor”, não devemos chorá-lo, mas antes ir buscar forças ao que ficou (irremediavelmente) para trás. Deanie não aguenta e sai disparada da sala, batendo com a porta, num choro convulsivo.

O filme é, claro, Esplendor na Relva (1961), de Elia Kazan, que exerceu sobre Ruy Belo, escreve João Bénard da Costa, “uma paixão tão devastadora” como a que no filme uniu os dois adolescentes. Em Homem de Palavra(s), de 1969, o livro de Ruy Belo mais notoriamente marcado pelo cinema, o poeta dedica à personagem interpretada por Natalie Wood um notável soneto, que abre com esta quadra: “eu sei que deanie loomis não existe/ mas entre as mais essa mulher caminha/ e a sua evolução segue uma linha/ que à imaginação pura resiste”. E um pouco adiante este arrepiante parêntesis: “(e aquele que no auge a não olhar/ que saiba que passou e que jamais// lhe será dado ver o que ela era)”.

O cinema teve um impacto profundo na obra de Ruy Belo, que não se resumia apenas aos poemas em que expressamente evoca filmes e actores, como Humphrey Bogart, Na morte de Marilyn, No way out (título original de Falsa Acusação, de Mankiewicz) ou Vício de matar, escrito a pretexto do filme de Arthur Penn sobre Billy The Kid. É esta relação do poeta com a sétima arte que serve de mote à sessão especial Ruy Belo. ‘Talvez um dia eu entre no cinema’ que o Medeia Monumental apresenta esta segunda-feira em Lisboa, a partir das 21h. A sessão abre com uma leitura de poemas de Ruy Belo pelo actor Pedro Lamares, seguindo-se uma intervenção do ensaísta António M. Feijó sobre A Deanie Loomis de Ruy Belo e a exibição de um breve filme familiar de Luís Filipe Lindley Cintra, rodado em Vila do Conde com Ruy Belo e Teresa Belo: O lugar onde o coração se esconde. Depois do intervalo, a noite fecha com a projecção do filme Esplendor na Relva

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