Papa não quer deixar combate às alterações climáticas para as gerações futuras

Recebido por Obama, Francisco deixou claro o apoio à política ambiental do Presidente. Depois foi aclamado nas ruas de Washington. E pediu aos bispos que os “crimes” de pedofilia “não se repitam nunca mais”

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Encontro de Obama com Francisco decorreu num ambiente de cumplicidade JIM WATSON/AFP

Obama gostou de ouvir e estará grato pelo apoio de peso ao seu plano de combate às alterações climáticas, que tem a oposição dos sectores republicanos mais conservadores. O Papa Francisco defendeu esta quarta-feira a necessidade de uma luta comum contra um problema que, disse, “não pode ser deixado para as gerações futuras”. Mais tarde, num encontro com bispos, pediu que os “crimes” de pedofilia que abalaram a Igreja Católica dos EUA “não se repitam nunca mais”.

Vivemos um “momento crítico da nossa história”, declarou Francisco, referindo-se ao problema ambiental, na cerimónia de boas vindas com que, pomposamente, foi recebido nos jardins da Casa Branca.

A posição do Papa, que está em visita aos Estados Unidos, em nada surpreendeu. Na sua encíclica Laudato Si', que citou, apela a uma revolução energética, que permita a reconversão das energias fósseis em energias renováveis. Mas a forma directa como falou do assunto, dirigindo-se a Obama, não deixou dúvidas sobre de que lado está numa matéria que separa o Presidente dos republicanos.

“Senhor Presidente, considero encorajador que esteja a promover uma iniciativa para a redução da poluição atmosférica. Aceitando essa urgência, também me parece claro que as alterações climáticas são um problema que não pode ser deixado para as gerações futuras.”

No discurso de boas-vindas, numa cerimónia para a qual foram convidadas mais de 10 mil pessoas, Obama – que na terça-feira foi receber o visitante à base aérea de Andrews – não escondeu a admiração que tem pelo primeiro Papa oriundo do continente americano. “Penso que a excitação à volta da sua visita deve ser atribuída não apenas ao seu papel de Papa mas também as suas qualidades únicas enquanto pessoa.”

“Como filho de uma família de imigrantes, estou feliz por ser recebido neste país, que foi em grande parte construído por famílias de imigrantes”, respondeu Francisco, o terceiro Papa a visitar a Casa Branca, depois de Jimmy Carter ter recebido João Paulo II, em 1979, e de George W. Bush ter aberto as portas a Bento XVI, em 2008.

Quanto ao dossier ambiental, o Presidente disse que Francisco “nos lembra que temos uma obrigação sagrada de proteger o nosso planeta”. “Apoiamos o seu apelo aos dirigentes para que apoiem as comunidades mais vulneráveis face às alterações climáticas e a unir-se para preservar o nosso mundo para as gerações futuras”, disse.

Num ambiente de cumplicidade, Obama agradeceu o “apoio precioso” do líder católico na reaproximação entre os Estados Unidos e Cuba e homenageou a sua “mensagem de “esperança”, que é “fonte de inspiração para tantas pessoas no mundo”.  Manifestou também gratidão pelo apelo do Papa às nações para “resistirem às sirenes da guerra e a resolverem os diferendos por via diplomática”

No seu discurso, o Papa reclamou um modelo de “desenvolvimento duradouro e integral” que exige que – de “modo sério e responsável” – sejam tomados em conta os “milhões de pessoas que vivem num sistema que os marginaliza”. Depois da cerimónia de boas-vindas, Obama e Francisco reuniram-se na Sala Oval – no segundo encontro pessoal entre ambos, depois de terem conversado em 2014 no Vaticano. Ao deixar a Casa Branca, no Papamóvel, foi saudado por milhares de pessoas nas ruas de Washington.

Mais tarde reuniu-se com os bispos dos Estados Unidos, na Catedral de São Mateus, e presidiu a uma missa de canonização do beato Junipero Serra, no Santuário Nacional da Imaculada Conceição, também em Washington. Foi no encontro com os bispos que, numa breve passagem de um longo discurso, falou da pedofilia e da necessidade de trabalhar para que “esses crimes não se repitam nunca mais”.

Esta quinta-feira, num dos momentos mais aguardados de uma viagem rotulada de “política” – desde logo porque Francisco visita dois países que viveram de costas voltadas durante mais de meio século – o Papa discursa no Congresso dos Estados Unidos, dominado pelos republicanos, de quem depende o levantamento do embargo a Cuba, instituído em 1961.

Mas o líder católico não deverá tocar, pelo menos directamente, no assunto. Na terça-feira, a bordo do avião que o levou de Santiago de Cuba para Washighton disse, segundo o site da Santa Sé, que o assunto “faz parte das negociações entre os dois países” e manifestou o desejo de que “se chegue a um bom resultado”.

Lembrou que “os Papas anteriores falaram, e não só deste caso mas também de outros casos” de embargo” – condenando-os – e em, resposta a uma jornalista, disse que no discurso que fará aos congressistas não deverá falar nesse “ponto concreto”. “ Se bem recordo, mas não quero errar – não é mencionado, quase de certeza que não.”

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