Ministério Público acusa ex-vice-cônsul de burla e lavagem de dinheiro

Companheira do antigo funcionário do Ministério dos Negócios Estrangeiros também foi acusada por branqueamento de capitais. Procuradora pede arresto de bens do casal.

Foto
Julgamento do caso deverá decorrer no Campus da Justiça de Lisboa. Rui Gaudêncio

Em Setembro de 2011, o Ministério Público brasileiro acusou o ex-vice-cônsul Adelino Vera-Cruz Pinto de burlar em cerca de um milhão de euros a arquidiocese de Porto Alegre, no Brasil. Desta vez, anunciou esta quinta-feira a Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa (PGDL), a acusação é do Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa. Adelino Pinto foi acusado, em meados de Agosto, de dois crimes de falsificação, um de burla e um de branqueamento de capitais. O julgamento, em tribunal colectivo, deverá decorrer no Campus da Justiça, em Lisboa,

E nesta última acusação não está sozinho. O Ministério Público (MP) português também imputa responsabilidade à companheira dos últimos 16 anos, Maria da Anunciação Figueiredo, que acusa do crime de branqueamento de capitais, por ter ajudado a esconder o dinheiro da burla, cuja proveniência conheceria. 

Segundo a acusação a que o PÚBLICO teve acesso, o ex-vice-cônsul aproveitou-se do cargo e da credibilidade daí resultante para enganar os representantes da Arquidiocese de Porto Alegre, no Brasil, de modo a obter a entrega de 962.649 euros.

O montante, que equivale a 2,5 milhões de reais, foi entregue pela arquidiocese ao então vice-cônsul para servir de caução de um donativo de quase quatro milhões de euros que seria atribuído por uma suposta organização não-governamental (ONG) belga, que teria relações com o Governo português e iria patrocinar a maior parte da verba necessária para recuperar duas igrejas de origem portuguesa naquela região brasileira.

“Uma vez em poder da quantia pretendida o arguido apropriou-se dela ilicitamente, sendo que jamais foi efectuado o prometido restauro das igrejas”, adianta uma nota da PGDL. “Para dar maior credibilidade ao seu projecto, deu entrevistas a jornais onde falou do interesse do Estado português em financiar o restauro de igrejas de origem portuguesa”, lê-se na acusação. O MP realça que Adelino Vera-Cruz Pinto chegou mesmo a discursar numa cerimónia religiosa, onde anunciou a existência de uma verba para apoiar o restauro de igrejas em Porto Alegre.

Para evitar que o “plano” que arquitectou fosse conhecido solicitou que o pedido formal para a obtenção dos subsídios fosse entregue na portaria do consulado, numa altura em que os serviços estavam fechados, evitando desta forma que o “pedido entrasse oficialmente e fosse tramitado formalmente”. “O arguido sempre dissuadiu o padre Inácio Ledur de contactar directamente as autoridades portuguesas, designadamente o embaixador de Portugal no Brasil”, lê-se na acusação. Por isso, quando foi surpreendido, num almoço em Porto Alegre, pela presença da embaixatriz e de elementos da arquidiocese, improvisou. Recomendou ao padre que “não falasse do projecto à embaixatriz, porque aquela representante do Estado Português, em concreto, professava a religião pentecostal, sendo por isso hostil à Igreja Católica”, diz o MP.

Uma comitiva da arquidiocese, que incluiu o bispo, chegou a deslocar-se a Portugal em Dezembro de 2010, tendo sido recebidos numa sala da Basílica da Estrela, em Lisboa, por uma mulher. “Esta senhora que, para não ser facilmente reconhecida, tinha então colocada uma peruca e usava óculos escuros, apresentou-se-lhes como sendo a responsável por uma organização não-governamental belga, ligada ao restauro das igrejas”, relata a acusação.

A encenação deu frutos e entre Dezembro de 2010 e Janeiro de 2011, Adelino Pinto recebeu numa sua conta no Brasil (serviria apenas para contornar o facto da arquidiocese não poder fazer transferências para o estrangeiro) os 2,5 milhões de reais, a maior parte dos quais foram depois transferidos para uma conta sua em Portugal. O dinheiro foi depois usado para liquidar dois empréstimos bancários que serviram para compra duas casas, um carro e fazer várias aplicações financeiras. O MP pediu o arresto desses bens de outros para garantir o pagamento dos 962 mil euros, que deverão ser dados como perdidos a favor do Estado.

O PÚBLICO tentou, sem sucesso, contactar Adelino Vera-Cruz Pinto. 

Sugerir correcção
Comentar