A crise da economia brasileira

A recessão será profunda e longa, cobrando pesado preço sobre empregos e poder de compra.

A economia brasileira atravessa crise sem precedentes em sua história recente. O ineditismo se dá não pela magnitude da recessão ou da inflação, mas por a situação não decorrer de qualquer causa aguda, como uma crise internacional ou um fato interno excepcional. É, sim, resultado de um acúmulo de más políticas internas, que minaram a confiabilidade do governo.

Agora o país se vê diante de um impasse fiscal, enquanto vê – e sente – os indicadores de produção e emprego desabarem. As baixas popularidade e credibilidade do governo, apesar de recém-reeleito, deixam o país sem a liderança necessária para superar este momento difícil.

Recordemos alguns episódios dos últimos 35 anos. No início da década de 1980, a queda acumulada do PIB de 1981 a 1983 foi de 6% e a inflação (medida pelo deflator do PIB) estava em 100% ao ano, na esteira do segundo choque do petróleo e da crise da dívida dos países latino-americanos, desencadeada pela forte elevação dos juros nos Estados Unidos. Em 1990, o PIB caiu 4,3%, desta vez por causa do confisco pelo governo brasileiro de quase toda a poupança financeira do país, na tentativa desesperada de conter a inflação, que atingira 1.300% no ano anterior e chegaria a 2.600% naquele ano. A crise asiática de 1997 e a crise russa de 1998 atingiram a economia brasileira em cheio, levando ao crescimento quase nulo do PIB em 1998 e forçando o abandono da política de câmbio semi-fixo, o que provocou forte desvalorização do real em 1999. No início da década de 2000, houve a crise na Argentina em 2001, a vitória do Partido dos Trabalhadores (PT) pela primeira vez nas eleições presidenciais em 2002 − provocando temor quanto aos rumos da política econômica −, a forte desvalorização do real que isso causou, a decorrente perda de poder de compra dos salários e o ajuste fiscal e monetário que se fizeram necessários. Em 2003, o PIB cresceu apenas 1,2% e a inflação atingiu 14% (um valor alto para os padrões de estabilidade obtidos com o Plano Real, em 1994).

Após este longo período marcado por sucessivas crises, nas quais o ingrediente principal era uma crise externa ou um fator interno agudos, a bonança externa e o crescimento da China ajudaram o Brasil a ter vários anos de crescimento – de 2004 a 2011, o PIB cresceu à média anual de 4,4%. Mas esse prêmio de loteria não foi bem aproveitado. Em vez de melhorar educação, saúde e segurança públicas, a infraestrutura econômica e fazer um ajuste fiscal de longo prazo, o país gastou tudo em consumo, aproveitando o presente, mas descuidando do futuro.

Tudo foi bem enquanto o governo Lula manteve o tripé macroeconômico herdado de Fernando Henrique Cardoso – metas de inflação, câmbio flutuante e disciplina fiscal −, prosseguiu com reformas econômicas e os ventos da economia internacional foram favoráveis. Mas as circunstâncias mudaram e a reação do governo foi sempre na direção de piorar a qualidade da política econômica. Foi aí que começou a história da crise atual, auto-infligida. Depois do escândalo do Mensalão, como ficou conhecido o esquema de compra de votos no Congresso que levou líderes importantes do PT para a cadeia, o governo abandonou as reformas econômicas. A crise iniciada com as hipotecas nos Estados Unidos foi o pretexto para o governo abandonar o tripé macroeconômico, que mantinha sem convicção, e adotar a política batizada de Nova Matriz Econômica - um nome pomposo para o que significava, resumidamente, maior intervenção do governo na economia, numa tentativa mal feita de imitar o que seria um “modelo asiático”. Para piorar a situação, o governo soltou as rédeas da política fiscal para reeleger Dilma Rousseff em 2014.

A economia já havia entrado em recessão em 2014, mas esta não atingira com força, ainda, o mercado de trabalho, e isso parece ter sido suficiente para, junto com os programas compensatórios de transferência de renda, permitir a Dilma uma vitória apertada. Mas em 2015, já com a presidente reeleita, a crise agravou-se, o desemprego aumentou, o desacerto das políticas ficou evidente e a população e a imprensa constataram que as promessas de campanha eram inviáveis. A opinião pública virou-se rápida e majoritariamente contra a presidente, seu partido e seu mentor, Lula. A confiança de empresários e consumidores despencou.

Todos os indicadores de nível de atividade, inclusive os de emprego, vêm piorando terrivelmente. Espera-se queda do PIB de cerca de 2,5% em 2015 e de 0,5% em 2016. A recessão será profunda e longa, cobrando pesado preço sobre empregos e poder de compra (pois, apesar da recessão, a inflação ao consumidor acumulada em 2015 e 2016 deve superar 15%).

A recente perda de grau de investimento pelo país, que já era aguardada pela maioria dos analistas, veio apenas “coroar” este processo.

Economista

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