12 de Setembro de 1990: o dia em que findou a guerra

A União Europeia, como concebida na sua fundação, também funcionará com uma Alemanha poderosa?

Completam-se, hoje, 25 anos da assinatura em 1990 do ‘Acordo Final em relação à Alemanha’. Com a assinatura em Moscovo, deste tratado entre os aliados da II Guerra e os dois Estados alemães, foram reconhecidas formalmente as fronteiras da Alemanha unificada e estabelecida a retirada das tropas do Exército Vermelho e de todas as restantes forças estrangeiras do território alemão.

Muitos historiadores consideram o dia 12 de Setembro de 1990, como a data em que realmente findou a II Guerra Mundial na Europa, relegando a rendição alemã, em 8 de Maio de 1945, apenas como a data em que cessaram os combates.

Um quarto de século depois, já temos alguma distância para se revisitar duas questões que ainda hoje são objecto de debate entre historiadores, politólogos ou diplomatas.

A primeira, é a de saber por que razão a União Soviética se deixou, ‘levar nesta onda’? A segunda questão é a de saber se a Alemanha, uma vez unificada, poderia voltar a cometer os erros em que incorreu em 1914 e 1939, com os resultados que ficaram à vista.

No que respeita à União Soviética, é controversa a razão pela qual Mikhail Gorbatchov aceitou tão rapidamente a unificação alemã. Ao invés no passado, em anteriores tentativas nesse sentido, conta-se que o General De Gaulle, um insuspeito anticomunista, dizia gostar tanto da Alemanha, que até achava que devia haver duas…

O que se tem por certo é que no princípio das negociações, a posição russa era no sentido de trocar a unificação, pela saída da Alemanha Ocidental da NATO. E tudo indicava, que o governo de Kohl estaria disposto a abandonar a NATO, para recuperar o território da RDA. Teríamos hoje um mapa europeu bem diferente. Porque não foi então assim?

Como refere Tony Judt (Pós Guerra), Gorbatchov não possuía meios para prever o desenrolar dos acontecimentos e tinha a seu próprio país, em acelerada desagregação. E na verdade, não se vê como sobreviveria a RDA sem muro…

E assim, rapidamente Gorbatchov foi deixando cair as suas condições essenciais. No final, aceitou a integração da Alemanha unificada na NATO, contra a promessa dos americanos, de que as tropas da aliança nunca se deslocariam a mais de 300 Km da fronteira polaca. Uma mentira, claro, que os russos convenientemente acreditaram, ou fingiram acreditar.

O dinheiro, como sempre, também falou. Do governo alemão de Bona, a União Soviética recebeu compensações financeiras na ordem dos 75.000 milhões de dólares.

A segunda questão que ficou em aberto, em 1990, foi a de imaginar como a Alemanha unificada se comportaria no quadro europeu. Mas este exercício teve de ficar relegado para o Séc. XXI. Durante a década de 90, a Alemanha apenas se pôde preocupar consigo própria. O estado de grande desigualdade existente entre a RDA e a Republica Federal, só nos primeiros três anos da integração, obrigou o governo a gastar mais de 1.200 mil milhões de euros, para dotar o território da RDA de algumas infra estruturas básicas habituais no lado ocidental.

Neste período, o governo alemão – para não aumentar impostos - acumulou défices orçamentais avultados. Os mesmos défices, que agora tão pungentemente critica nos Estados do sul. Como se os outros países europeus pudessem crescer e convergir, de um modo que nem a organização e recursos da Alemanha Ocidental bastou, para desenvolver a parte ‘pobre’ do seu território. Ou seja sem endividamento…

E chegamos ao seculo XXI e à moeda única, ou seja à concretização da exigência francesa para a unificação. Na perspectiva francesa, a Alemanha tinha de dar algo em troca e porque não a perca do marco, tão amado pela sua população? Esta ‘grande ideia’ gaulesa acabou afinal por se revelar um sucesso, para quem desejava que não o fosse: a própria Alemanha.

Gunther Grass, um escritor alemão lúcido, sempre entendeu que a história recente da Alemanha consiste numa tendência para aumentar e se expandir, seguida de tentativas desesperadas para a conter, por parte do resto do continente.

E como relembrou o americano George Friedman em declarações ao Expresso, “a Europa é um espaço onde coabitam mais de 50 Estados- Nação, com muito más memórias uns dos outros”.

O dia 12 de Setembro de 1990 foi, sem dúvida, o dia em que começou um novo desafio para a Europa e a pergunta é simples, a resposta é que talvez não: A União Europeia, como concebida na sua fundação, também funcionará com uma Alemanha poderosa ou só sobreviveu durante todos estes anos, com o ‘anão político’ que era a amputada República Federal da Alemanha?

Jurista

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