EUA preocupados com movimentações russas na Síria para apoiar Assad

Governos pressionados pela crise de refugiados para ultrapassar impasse relativo à resposta à guerra na Síria. Reino Unido, França e Austrália poderem acções militares contra o Estado Islâmico.

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Assad já não controla grande parte do território da Síria Abdalrhman Ismail/Reuters

Ao mesmo tempo que aliados como o primeiro-ministro britânico, David Cameron, o seu congénere australiano, Tony Abbot, e o Presidente de França, François Hollande, sentem a pressão para intensificar os esforços para travar o avanço dos jihadistas do Estado Islâmico, e discutem a possibilidade de bombardeamentos na Síria, o secretário de Estado norte-americano, John Kerry, alerta para os riscos de uma escalada militar naquele país, devastado pela guerra há mais de quatro anos.

Num telefonema com o seu homólogo russo, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, na madrugada de domingo, John Kerry manifestou a sua preocupação com as notícias que davam conta da intenção de Moscovo em reforçar a sua presença militar na Síria, aparentemente em defesa da autoridade do Presidente Bashar al-Assad, cada vez mais reduzida ao reduto da capital, Damasco.

No resto do país, as forças radicais do Estado Islâmico e outros grupos terroristas combatem as forças do regime mas também os rebeldes anti-Assad – um quadro de terror e devastação que já forçou mais de quatro milhões de sírios a fugir do país. Na opinião do governante norte-americano, uma nova escalada militar vai inevitavelmente conduzir a “mais morte de inocentes, novos fluxos de refugiados e a um possível confronto entre as diversas forças que constituem a coligação que combate o Estado Islâmico dentro do país ”, disse ao ministro russo.

Apesar das garantias da Rússia, os Estados Unidos observaram uma série de manobras que “sugerem o reforço iminente da operação” militar: a instalação de uma torre de controlo aérea e de casernas com capacidade para mais de mil soldados numa base próxima da cidade portuária de Latakia, bem como a requisição de licenças para operar uma série de voos militares em vários países vizinhos.

A cadeia Russia Today referiu-se às notícias veiculadas por vários jornais ocidentais como “paranóia”. Uma fonte do Pentágono citada pela Reuters dizia que, por enquanto, não havia certezas quanto ao objectivo das movimentações russas – os sinais de que Moscovo pretende rever os termos da sua intervenção na Síria, que já inclui o equipamento, armamento e treino do Exército de Assad, são ainda “inconclusivos”, notou.

No entanto, o episódio é revelador das divisões entre os dois blocos – EUA e Rússia – no que diz respeito à resposta à crise política e de segurança na Síria, e que para muitos analistas é uma das principais razões pelo impasse que alimenta o caos no país. No cerne da discórdia está o Presidente Bashar al-Assad, um aliado da Rússia e do Irão, que estarão apostados na sobrevivência do seu regime. Mas enquanto Moscovo reafirma a legitimidade do seu Governo que já só controla um quinto do território do país, Washington e os restante aliados (incluindo a Turquia e a Arábia Saudita) vêem Assad como parte do problema e encaram a sua permanência no poder como “contraproducente”.

A acelerada transformação da Síria num Estado falhado voltou a captar as atenções mundiais por causa do drama de milhares de refugiados dispostos a arriscar a vida em busca de santuário no território europeu.

No Reino Unido, intensificam-se os apelos à acção militar na Síria, tanto para erradicar a ameaça do Estado islâmico, como para estabelecer “enclaves” seguros para onde a população possa escapar da guerra. No domingo, o antigo arcebispo de Cantuária , George Carey, juntou a sua voz à de vários elementos da bancada conservadora e até do chanceler George Osborne, no apelo a um “reforço dos esforços diplomáticos e militares” do Governo britânico para atacar a crise síria. “Enviar ajuda para os campos de refugiados no Médio Oriente não chega; para mim não há dúvida: serão precisos ataques aéreos”, escreveu no Sunday Telegraph.

Os jornais ingleses especulam que o Governo conservador poderá voltar a pedir autorização ao parlamento para encetar ataques aéreos na Síria - em declarações na Turquia, à margem da reunião do G20, o responsável das Finanças, George Osborne, não pôs de parte essa hipótese. “Há que atacar o problema directamente na fonte”, considerou.

Também na Austrália, o primeiro-ministro, Tony Abbot, se referiu à necessidade de ir mais além do apoio financeiro e da abertura de fronteiras para lidar com o êxodo de refugiados da Síria. “A resposta humanitária é importante, mas também é importante que haja uma forte resposta de segurança”, declarou Abbot, cujo Governo deverá decidir esta semana a inclusão do Exército australiano na força internacional de combate ao Estado Islâmico na Síria (tal como o Reino Unido, o país já participa na missão militar em curso no Iraque).

E de acordo com o Le Monde, a França também poderá avançar nesse sentido. Na sexta-feira, o Presidente François Hollande terá ouvido a opinião de um grupo restrito de especialistas militares sobre a situação na Síria, e de acordo com a imprensa francesa, poderá decidir alargar o âmbito da participação da Força Aérea gaulesa nas operações militares na Síria, nomeadamente em missões de reconhecimento.

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