O que não se diz é (mesmo) o mais importante

Há outros partidos “com vocação parlamentar ou executiva” e que dão a devida importância à cultura.

No primeiro dia de Setembro, no jornal PÚBLICO, António Pinto Ribeiro (APR) propôs-se analisar os “programas dos partidos políticos com vocação parlamentar ou executiva” no que diz respeito à área da cultura.

Até aqui, nada a opor. Dando igualmente nós uma importância fundamental à área da cultura, nada de mais natural que um jornal de referência como o PÚBLICO promova essa análise.

Lendo o artigo, porém, de duas páginas, não podemos deixar de expressar uma objecção de fundo: APR anuncia, logo no primeiro parágrafo, que vai falar dos “programas dos partidos políticos com vocação parlamentar ou executiva”, e depois fala apenas – para além dos partidos que tiveram representação parlamentar na última legislatura – do Partido Livre.

APR pode até considerar-se no direito de definir, qual auto-proclamado demiurgo da nossa democracia, quais são os partidos “com vocação parlamentar ou executiva”, mas já consideramos bizarro – passe o eufemismo – que o jornal PÚBLICO tenha essa pretensão, apesar da ostensiva sobre-representação de pessoas do Partido Livre nas suas páginas.

Dito isto, esclareço que nada tenho de pessoal contra o Partido Livre: como leitor diário do jornal PÚBLICO, aprecio, em geral, os textos de Rui Tavares – apesar de muitas vezes não concordar com ele; e tenho até, nos meus círculos, elogiado o Partido Livre pela sua “praxis”, no qual tenho inclusive amigos, como o André Barata, meu colega de Licenciatura de Filosofia na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, que, por feliz coincidência, reencontrei no dia em que ambos entregámos as respectivas candidaturas no Tribunal de Lisboa.

Não podemos, porém, deixar de denunciar a análise inteiramente enviesada da parte da APR. Há outros partidos “com vocação parlamentar ou executiva” e que dão a devida importância à cultura. Não falando em nome de todos, falamos pelo menos aqui em nome do “Nós, Cidadãos!”, em cujo programa político-eleitoral, que coordenámos, encontramos as seguintes propostas, que APR, de forma injustificável, ostensivamente ignorou:

— Reforçar o orçamento para esta área e recriar o Ministério da Cultura, em estreita convergência com outros – nomeadamente: o da Educação e Ensino Superior, o dos Negócios Estrangeiros e mesmo com o da Economia, dado todo o potencial económico desta área.

— Privilegiar a relação com os restantes países e regiões do amplo espaço de língua portuguesa, procurando promover uma comum cultura lusófona – necessariamente plural e polifónica.

— Apostar na defesa do nosso património. Para tal, dever-se-á, sem complexos, recorrer a apoios privados, sob a forma de patrocínio e/ou mecenato, sendo certo que, sobretudo nesta área, o Estado terá que ter sempre o papel primacial, desde logo na seriação das mais acertadas prioridades.

— Promover através das diversas artes (nomeadamente, do cinema e do teatro) uma maior consciência histórico-cultural entre todos os portugueses, particularmente deficitária entre os mais jovens.

— A Rádio Televisão Portuguesa deverá passar a ser tutelada pelo Ministério da Cultura, de modo a que o “Serviço Público de Televisão” passe a ser realmente cumprido. Nesta área, os canais da RTP África e da RTP Internacional devem não só ser mantidos como reforçados.

— O papel do Instituto Camões deve ser igualmente reforçado, em articulação com o Instituto Internacional de Língua Portuguesa, em prol da difusão da Língua Portuguesa à escala global. No âmbito do Instituto Internacional de Língua Portuguesa, defendemos um melhoramento concertado do Acordo Ortográfico e recusamos qualquer iniciativa unilateral que ponha em causa essa concertação.

— Através da CPLP: Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, devem ser implementadas políticas de reforço do ensino da nossa língua, nalguns países ainda muito deficitária, bem como as trocas de produtos culturais no espaço lusófono, ainda muito condicionadas por excessivas barreiras alfandegárias.

— Considerar a formação cultural como essencial para a formação integral dos cidadãos, com reflexo nos diversos programas escolares, recuperando assim o conceito de Escola Cultural.

Vice-Presidente do Nós, Cidadãos!, Presidente do MIL: Movimento Internacional Lusófono

 

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